A Rússia vai fazer exercícios em massa de suas forças nucleares em meio a crescentes tensões com o Ocidente por causa da crise na fronteira do país com a Ucrânia.
Com as tensões já em seu nível mais alto desde a Guerra Fria, os militares russos anunciaram que o presidente Vladimir Putin vai monitorar um exercício abrangente das forças nucleares do país no sábado, que envolverá vários lançamentos de mísseis – um lembrete do poder nuclear do país em meio ao confronto com o Ocidente.
O Ministério da Defesa da Rússia disse que o exercício militar vai incluir vários lançamentos práticos de mísseis balísticos intercontinentais e mísseis de cruzeiro. A força aérea, unidades do distrito militar do sul, bem como as frotas do Norte e do Mar Negro estariam envolvidas nos exercícios nucleares.
O anúncio dos treinamentos militares segue o aviso do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, na quinta-feira 17, de que a Rússia poderia invadir a Ucrânia dentro de dias usando algum pretexto de ataques na região separatista de Donetsk e Luhanks. Os temores ocidentais se concentram em cerca de 150 mil soldados russos – incluindo cerca de 60% das forças terrestres da Rússia – concentradas perto das fronteiras da Ucrânia.
O Kremlin insiste que não tem planos de invasão. Mas Moscou exigiu que os EUA e seus aliados mantenham a Ucrânia e outras nações ex-soviéticas fora da aliança militar da Otan, não coloquem armas na Ucrânia e retirem as forças da Otan da Europa Oriental.
Washington e seus aliados rejeitaram sem rodeios as exigências russas, e Moscou ameaçou tomar “medidas técnico-militares” não especificadas se o Ocidente continuasse a resistir.
O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse que a Rússia está sendo transparente sobre os exercícios de sábado, notificou todos os canais apropriados e que eles “não devem causar preocupação a ninguém”, informou a agência de notícias TASS. Ele disse que o papel de Putin é essencial e que o presidente provavelmente participará do treinamento em uma base militar.
A Rússia realiza enormes exercícios de suas forças nucleares estratégicas anualmente, mas as manobras planejadas para sábado envolvem a Frota do Mar Negro, o que é incomum. A frota é baseada na Península da Crimeia, que a Rússia anexou da Ucrânia em 2014.
“De acordo com os russos, isso não é uma escalada, é algo que o país está realizando anualmente”, informou a Al Jazeera, reportando de Moscou. “Normalmente, esses exercícios são realizados em outubro, mas foram movidos no passado.”
Pretexto para invasão
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, vai conversar com outros líderes ocidentais nesta sexta-feira, sobre a crise na Ucrânia, enquanto os esforços diplomáticos das últimas horas se intensificaram para impedir um ataque russo à Ucrânia.
A Otan e Biden alertaram na quinta-feira que a ameaça de uma invasão russa da Ucrânia é "muito alta" e disseram acreditar que os russos estão armando pretextos para invadir a Ucrânia por meio de ataques de separatistas em pontos da fronteira leste do país. Em meio ao agravamento das tensões na fronteira, a Rússia expulsou o vice-embaixador dos Estados Unidos em Moscou.
O número dois da diplomacia americana, Bart Gorman, estava na Rússia há cerca de três anos em uma viagem diplomática, disse um funcionário do Departamento de Estado que falou ao jornal The New York Times sob condição de anonimato. O fechamento deste canal diplomático ocorreu um dia após militares ucranianos e separatistas pró-Rússia trocarem acusações de ataques - e Rússia e Otan discordarem sobre a veracidade de denúncias sobre atrocidades que teriam ocorrido.
Na Casa Branca, Biden falou a repórteres que “uma operação de bandeira falsa” estava em andamento e que Moscou a usaria para justificar uma invasão. Ele disse que há todas as indicações que temos de que eles estão preparados para entrar na Ucrânia e não havia planos para ele fazer uma ligação com o presidente russo, Vladimir Putin.
Momento perigoso
Em uma reunião cercada de expectativa e tensão, Blinken afirmou a representantes do Conselho de Segurança da ONU na quinta-feira que a Rússia pode utilizar pretextos falsos, incluindo supostos atentados terroristas ou ataques com armas químicas, para justificar uma invasão da Ucrânia.
Blinken afirmou que compartilharia informações detalhadas com o mundo, na tentativa de influenciar a Rússia a abandonar a ideia de uma escalada militar, e descreveu possíveis cenários do que autoridades americanas têm chamado de "iminente" invasão. "Primeiro, a Rússia planeja fabricar um pretexto para o ataque. Esse poderia ser um evento violento, pelo qual a Rússia culpará a Ucrânia ou uma acusação ultrajante que a Rússia vai levantar contra o governo ucraniano", disse Blinken, acrescentando que os EUA não possuem informação exata sobre qual acusação exatamente seria utilizada por Moscou.
"Poderia ser um atentado terrorista falso em território russo. A invenção da descoberta de uma cova coletiva. Um ataque a drone contra civis ou um falso - ou mesmo um verdadeiro - ataque com armas químicas", completou.
A subida de tom do principal diplomata americano ocorre em um momento de acirramento entre Washington e Moscou. O agravamento da crise interna ucraniana fez soar o alerta da Casa Branca e do comando da Otan para o possível "ataque fabricado" de Moscou.
No Conselho de Segurança, Bliken afirmou que informações americanas indicam "claramente" que tropas de solo, aviões e navios de guerra russo devem iniciar um ataque nos próximos dias, sempre sobre a justificativa de defender etnias de origem russa no território da Ucrânia. "A Rússia pode descrever este evento [o pretexto fabricado] como uma limpeza étnica, ou um genocídio, zombando de um conceito que nós nesta Câmara tratamos com seriedade", disse Blinken, que ainda descreveu qual poderia ser a dinâmica russa.
"O governo (russo) fará proclamações declarando que a Rússia deve responder para defender os cidadãos russos ou russos étnicos na Ucrânia. Em seguida, o ataque está planejado para começar. Mísseis e bombas russos serão lançados sobre a Ucrânia. As comunicações serão bloqueadas. Ataques cibernéticos fecharão as principais instituições ucranianas. Depois disso, tanques e soldados russos avançarão em alvos-chave que já foram identificados e mapeados em planos detalhados. Acreditamos que esses alvos incluem a capital da Ucrânia, Kiev, uma cidade de 2,8 milhões de pessoas."
A declaração repercutiu mal na delegação russa no Conselho da ONU, que prontamente respondeu o secretário americano. O vice-chanceler russo, Serguei Vershinin afirmou que os cenários militares criados pelos EUA são "lamentáveis" e "perigosos", e reiterou a narrativa apresentada pelo Kremlin de que as tropas russas que cercavam a Ucrânia estão voltando para suas bases após a conclusão de exercícios militares. Apesar da escalada de tensões, Blinken propôs mais uma tentativa de resolução pela via diplomática, convidando o chanceler russo, Serguei Lavrov, para mais uma rodada de negociações na próxima semana, em solo europeu. Os EUA também propuseram novas reuniões do Conselho Otan-Rússia e do conselho permanente da Organização para Segurança e Cooperação na Europa (OSCE).
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