Candidato do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), à sua sucessão, o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) conseguiu emplacar um aliado na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Sem histórico de atuação na área, o ex-deputado estadual Arnaldo Silva Júnior (DEM-MG), que trabalha no gabinete de Pacheco, foi indicado na sexta-feira passada pelo presidente Jair Bolsonaro para ocupar uma vaga de diretor na autarquia. Líder do DEM na Casa, Pacheco tem sido apresentado pelo padrinho político como nome “independente” na disputa, numa tentativa de atrair o apoio tanto de governistas quanto da oposição. A indicação para a agência, no entanto, demonstra alinhamento do senador com o Palácio do Planalto.
A senadora Kátia Abreu (PP-TO) escancarou o desconforto com a indicação de Silva Júnior para a ANTT e disse que isso representava o "fim do republicanismo no Senado Federal". Mesmo assim, o nome de Silva Júnior foi aprovado por 11 votos a 2 na Comissão de Infraestrutura do Senado e deve passar pelo crivo do plenário do Senado ainda nesta semana.
"O senhor Arnaldo deve ser uma pessoa boa, embora experiência na área não tenha nenhuma", disse a senadora. "Isso nunca foi posto, um assessor do gabinete do senador, uma indicação explícita e reconhecida para todo o Brasil. Não foi isso que Bolsonaro prometeu quando se candidatou", acrescentou.
As escolhas para as agências reguladoras são uma prerrogativa do presidente, mas os nomes precisam ser aprovados pelo Senado. Criadas a partir de 1997 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, as agências funcionam como órgãos de Estado, mas atuam de forma independente do governo. No caso da ANTT, os diretores são responsáveis por analisar desde as taxas de pedágio em rodovias, regras para transportes de passageiros ao tabelamento do frete no País, motivo de paralisações de caminhoneiros nos últimos anos.
Alcolumbre lançou o nome de Pacheco após ser impedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de tentar a reeleição. Sua intenção é barrar o retorno do MDB ao comando do Senado. A sigla presidiu a Casa de maneira ininterrupta de 2001 até o ano passado, quando o senador do DEM foi eleito ao derrotar o senador Renan Calheiros (MDB-AL).
O Palácio do Planalto já deu sinais de que poderia apoiar um nome do partido, que tem a maior bancada, com 13 senadores, mas a preferência é por encampar o candidato escolhido pelo presidente do Senado. Entre os favoritos de Bolsonaro entre os emedebistas estão Eduardo Gomes (MDB-TO) e Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líderes do governo no Congresso e no Senado, respectivamente. O argumento de Alcolumbre em defesa de Pacheco é, justamente, que um nome com o "carimbo" do Palácio do Planalto poderia sofrer resistência de senadores considerados independentes.
Pacheco, por sua vez, já demonstrou em outras ocasiões proximidade com o governo. Em outubro, participou de almoço com Bolsonaro para discutir a liberação de emendas para suas bases eleitorais. Em 2019, foi o próprio Alcolumbre quem contou com o apoio do Palácio do Planalto para se eleger, numa articulação capitaneada pelo então ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, hoje na pasta da Cidadania. Onyx também é filiado ao DEM.
Transporte
A indicação de Silva Júnior para a ANTT ocorreu após uma queda de braço entre o Senado e o Ministério da Infraestrutura na discussão sobre novas regras de transporte rodoviário interestadual. Pacheco é um dos parlamentares que tem atuado contra normas que preveem o aumento da concorrência na área. O pai do senador é sócio de empresas do setor.
Segundo apurou o Estadão/Broadcast Político, a nomeação do advogado fez parte de um arranjo com o ministério, que envolve também uma nova versão do projeto de lei até então combatida pelo ministro Tarcísio de Freitas. O novo relatório deve manter o regime de autorização neste mercado, como defende o governo, mas estipular critérios mais rígidas para a entrada das empresas – uma exigência dos senadores.
O fato de Silva Júnior ser uma indicação política foi minimizado por integrantes do governo. O argumento é de que o ex-deputado estadual, que já atuou como advogado, tem perfil técnico, não destoando dos outros integrantes da agência. "É natural no presidencialismo de coalizão que cheguem, de repente, algumas indicações que passam por um crivo, por uma análise de currículo", afirmou o ministro ontem, em entrevista sobre o balanço de suas ações ao longo do ano.
O indicado para diretor da ANTT foi nomeado no gabinete de Pacheco no início do ano, com salário de R$ 17,9 mil, após não conseguir se reeleger deputado estadual em 2018. Doutor em Direito com especialização em contratação pública, Silva Júnior também tem passagens pela prefeitura de Uberlândia (MG), e na Câmara dos Deputados como assessor da Comissão de Ciência e Tecnologia.
Sobre a indicação, o Ministério da Infraestrutura afirmou que "indicações para qualquer cargo seguem a orientação do governo federal de considerar perfis técnicos e de comprovada capacidade de gestão". Procurado pela reportagem, Pacheco afirmou por meio de assessoria que cabe ao ministério "identificar os nomes aptos à função", e negou que haja acordo envolvendo as indicações para a ANTT. "A indicação de Arnaldo Silva Júnior é uma recomendação do Ministério da Infraestrutura e decorre do seu currículo e da sua qualificação, inclusive no âmbito do direito administrativo", disse, em nota.
Apesar da negativa de Pacheco, o novo teor do projeto foi confirmado à reportagem pelo relator, senador Acir Gurgacz (PDT-RO). "Mantém a autorização, mas com critérios técnicos. A capacidade do ônibus, a qualificação dos motoristas, capacidade de manutenção, que são imprescindíveis para a qualidade e segurança dos usuários", afirmou Gurgacz, cujos familiares são donos do grupo Eucatur, que opera empresas de ônibus interestaduais. As negociações foram antecipadas pelo Estadão/Broadcast Político em reportagem publicada em novembro.
Ver todos os comentários | 0 |