Deputados, principalmente da bancada do Nordeste, têm feito pressão para que o texto do novo marco legal do saneamento básico no País dê uma sobrevida aos contratos fechados sem licitação. A expectativa é que as novas regras - que pretendem destravar a participação de empresas privadas no setor - sejam votadas até o início de dezembro no plenário da Câmara.
Em geral, esses contratos são assinados hoje entre os municípios e as companhias estaduais de saneamento, sem a abertura de processos de licitação para a prestação dos serviços. Na prática, esse modelo de gestão impede a entrada mais forte de grupos privados na disputa.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sinalizou a parlamentares que quer pressa na votação do texto. Como a questão do saneamento está dentro da agenda social lançada por ele na terça-feira, ganha ainda mais apelo para ser deliberado logo, avaliam parlamentares.
Defensores de mudanças no texto em análise na Câmara querem uma espécie de período de transição: que novos contratos sem licitação possam ser fechados durante um determinado prazo, mesmo depois de a nova lei entrar em vigor. Isso também valeria para a renovação dos acordos já em vigor.
O parecer aprovado em comissão especial no fim de outubro, de relatoria do deputado Geninho Zuliani (DEM-SP), não autoriza a assinatura de novos contratos sem concorrência após a sanção do novo marco legal. Mas o relator já fez uma concessão às empresas estaduais de saneamento: deu prazo de um ano para que elas renovem antecipadamente aqueles contratos que estão em vigor. Essa possibilidade foi incluída no relatório de Geninho um dia antes de o texto ser aprovado pela comissão especial.
‘Janela’
O relator entende que é preciso tomar cuidado com o pedido para não abrir uma “janela de oportunidade”, uma vez que a duração de alguns contratos pode chegar a 30 anos. O tempo dessa janela tem recebido diferentes sugestões de deputados. Há quem peça pelo menos seis meses, um ano e até dois anos.
O deputado Fernando Monteiro (PP-PE) afirmou que propôs ao relator que haja um prazo de transição de seis meses para o fechamento de novos contratos e de 30 meses (2,5 anos) para os existentes serem renovados. Ele reclamou do prazo de um ano estipulado pelo relator para os casos de renovação. “A gente não pode acabar com as companhias de saneamento público. Se não der esse prazo, acaba”, disse Monteiro.
Já o deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE) fala em negociação para encontrar “um texto de consenso”. “É preciso tentar ao máximo um diálogo para se chegar a um texto de consenso que possa prestigiar todos os Estados. É importante que a gente possa criar uma transição para tentar atender às demandas dos Estados e municípios”, disse ele.
Defensor do parecer de Geninho, o deputado Evair de Melo (PP-ES) disse que já há votos para aprovar o texto em plenário sem fazer novas concessões. “Um bom acordo no projeto de saneamento pode ter certeza que vai caminhar para uma péssima solução. Eu estou convencido de que temos voto para aprovar já”, disse Melo, que foi presidente da Comissão Especial da Câmara que analisou o projeto.
Segundo ele, em almoço nesta quarta-feira, 20, com a Frente Parlamentar da Química, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que voltará a conversar com Maia para tentar um entendimento para colocar o projeto o mais rápido possível em plenário.
Além da pressão vinda dos próprios deputados, o texto também está na mira da Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe). O presidente da entidade, Marcus Vinícius Fernandes Neves, não descarta ir à Justiça, caso o Congresso Nacional aprove o texto como está hoje.
“É um direito previsto na Constituição. Na hora que qualquer ente, pessoa física ou jurídica, se sentir prejudicado, ele tem o direito de acessar a Justiça para fazer valer os seus direitos”, disse Neves, que também é presidente da Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (Cagepa).
Metas para 2033
A proposta de um novo marco legal do saneamento foi aprovada no dia 30 de outubro pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados. O texto abre espaço para a iniciativa privada atuar com mais força na exploração dos serviços de saneamento (abastecimento de água potável, coleta e tratamento de esgoto, limpeza urbana e redução e reciclagem de lixo). Hoje, a participação é pequena, apenas de 6%.
O texto aprovado na comissão da Câmara dos Deputados prevê que os contratos, mesmo os atuais, precisarão definir metas de universalização que garantam o atendimento de 99% da população com água potável e de 90% da população com coleta e tratamento de esgoto até 31 de dezembro de 2033. Há um prazo estimado de um ano para a adaptação daqueles que não tenham essas metas.
De acordo com dados do IBGE, pouco mais de um terço dos brasileiros vive em domicílios sem coleta de esgoto sanitário. O quadro, que se mantém praticamente inalterado nos últimos anos, é pior nas Regiões Norte e Nordeste. São 74,156 milhões de brasileiros, ou 35,7% da população total, vivendo nessas condições, mostra a Síntese de Indicadores Sociais (SIS), com dados de 2018.
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