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Imagem: Divulgação / GP1Clique para ampliarArthur Teixeira Junior(Imagem:Divulgação / GP1)Arthur Teixeira Junior
*Arthur Teixeira Junior


Em minha cidade, cujo nome omitirei para evitar chacotas, dizem que basta um cachorro urinar no poste para faltar energia elétrica. E, faltando energia elétrica, a bomba hidráulica não funciona, e em poucos minutos falta água também. Nesta época chuvosa, passamos mais tempo sem água e luz do que com. A situação é tão grave que, em recente assalto ao único ônibus que atende a cidade, só roubaram a bateria e a água do radiador.

Resolvi reclamar ao prefeito. Êta missão difícil. Não que eu me acanhe, sinta-me constrangido ou incomodado em reclamar com quem quer que seja. O difícil mesmo é encontrar o prefeito em nossa cidade, pois ele não é bobo de morar lá. Mas antes do anoitecer, vi seu carro (que no início do mandado era um Golzinho velho e hoje é uma Hilux zero) passar de fininho por uma rua secundária em direção à Prefeitura. Para lá que eu fui.

Parecia não haver ninguém no prédio, como era de se esperar. A ante sala do gabinete do prefeito estava vazia, mas a luz estava acesa. Entrei. Vindos do gabinete, cuja porta estava fechada, podia-se escutar alguns ruídos, como se pessoas sussurrassem. “Ele está fazendo alguma maracutaia” - imaginei. Uma hora ele vai ter que sair da sala, e estarei aqui para cobrar providências. Acomodo-me em uma poltrona e aguardo.

Foi quando ele surgiu por detrás da mesa, sorrateiro, ostentando aqueles bigodes enormes. Encarou-me com os olhos vermelhos, balançou o nariz e alojou-se debaixo da cadeira. Falo do enorme rato que apareceu na sala, como se do nada. Não parecia se importar muito comigo. Armei-me com uma vassoura que encontrei apoiada, em pé e virada, por detrás da porta. Lembro-me que minha avó usava uma simpatia deste tipo, mas não me lembro a finalidade. Foi quando reparei que havia uma foto dele, com aqueles bigodes enormes, sorrindo, meio de perfil, pregada solenemente na parede. Refiro-me a foto do prefeito.

Ele esgueirou-se por uma fresta, passando ao gabinete. Não titubeei. Abri a porta, e agitando a vassoura sobre a cabeça, dei meu famoso brado de ataque. Ele estava ali, bem na minha frente, com os olhos esbugalhados, ofegante, por cima da secretária, que por sua vez estava por cima do sofá, com os olhos revirados (provavelmente de nojo) e roupas em desalinho. O prefeito e sua secretária. Que papelão. E eu atrás do outro rato.

Ele deu um salto, postou-se sobre as pernas peludas e estendeu-me a mão. O prefeito. Dei-lhe um belo chute, assim que se aproximou, e quando ele cambaleou segurei-o pelas orelhas. O rato. Ouviu-se um grito estridente, como o cacarejar de uma galinha, atributo que não me parecia pertencer a nenhum dos ratos ali presentes. Lembrei-me da secretária. Foi ela.

Quando tentou me abraçar, ele escapou por entre meus dedos. O prefeito e o rato, respectivamente. Tentei segurá-lo pelo rabo, mas ele me agarrou e quase fomos ao chão, enquanto ela escapava pela porta. Agora foi o rato, o prefeito e a secretária, nesta ordem.
Foi quando, mais uma vez, acabou a luz na cidade (ou será quem alguém desligou a energia do prédio?). Por via das dúvidas, corri para casa para guardar um pouco de água para um banho. Na saída, no escuro, ouvi alguns gemidos, um sorrisinho abafado e um esfregar de corpo. Desta feita, não sei em que ordem, mas certamente o rato, o prefeito e a secretária ainda estavam na Prefeitura.

*Arthur Teixeira Junior é articulista e escreve para o GP1

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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