Está marcada para a tarde desta quarta-feira (14) uma conversa espinhosa e, espera-se, definitiva. De um lado, Lula. Do outro, José Sarney (PMDB-AP).
Vai à mesa um tema caro aos dois interlocutores: a disputa pela presidência do Senado. Lula quer saber: afinal, Sarney é ou não é candidato?
É a quarta vez que a dupla senta-se à mesa para debater o mesmo assunto. Dois dos encontros anteriores tiveram testemunhas. Noutros dois, Lula e Sarney estavam a sós.
Em todas as oportunidades Sarney declarou que não desejava o posto de presidente do Senado. Lula fez que acreditou, embora sua intuição aconselhasse o contrário.
Convinha ao presidente dar crédito a Sarney. Lula idealizara um cenário conveniente ao governo: a Câmara sob o comando do PMDB e o Senado confiado ao PT.
Porém, os pressentimentos de Lula prevaleceram sobre os seus desejos. O declarado desinteresse de Sarney não era senão uma lorota.
Insuflado por Renan Calheiros (PMDB-AL), Sarney quer porque quer presidir novamente o Senado. O problema é que sonha em ser candidato único, de consenso. Algo improvável.
Lula não foi a única vítima da dissimulação de Sarney. Candidato à reeleição, Garibaldi Alves (PMDB-RN) submetera seu nome à apreciação da bancada.
Garibaldi deixara claro: se Sarney estivesse interessado no cargo, ele esqueceria a recandidatura. Na reunião do PMDB, Sarney soou, de novo, peremptório: não seria candidato.
Ele estava ao lado de Garibaldi (veja a foto lá no alto). Trocou cochichos com o colega. E a pretensão de Garibaldi, a despeito das dúvidas jurídicas que suscita, foi acolhida pela unanimidade da bancada.
Aferrado ao desejo de manter o equilíbrio do consórcio partidário que lhe dá suporte no Congresso, Lula ainda trabalha com a perspectiva de demover Sarney.
Foi o que deixou antever numa reunião realizada nesta terça (13), no Planalto. Um encontro de rotina, com os ministros que integram a coordenação de governo.
Um pedaço da reunião foi monopolizado pela crise econômica. Noutro, tratou-se de política -mais especificamente da urucubaca que convulsiona o Senado.
Lula recordou a última conversa que tivera com Sarney. Lembrou que o senador lhe dissera: não era nem viria a ser candidato à presidência do Senado.
O presidente concluiu: Ficaria muito mal para o Sarney uma mudança de posição a essa altura do campeonato.
A reunião de Lula com Sarney deveria ter ocorrido nesta terça (13). Foi adiada a pedido do senador, que pretextou uma gripe fortíssima.
Lula viu-se compelido a postergar também um jantar que pretendia oferecer à cúpula do PMDB. Para o presidente, a audição de Sarney tem precedência.
Passou-se a difundir, então, a versão de que todas as negociações haviam sido empurradas para a semana que vem. Era conversa fiada.
A pedido de Lula, o secretário particular Gilberto Carvalho já havia reagendado o encontro com Sarney.
A menos que o senador alegue um súbito e improvável recrudescimento da gripe, o diálogo ocorrerá nesta quarta.
Todo o desenrolar do processo sucessório do Senado parece condicionado a essa conversa. Com Sarney, o quadro é um. Sem ele, é outro.
Na dúvida, Renan Calheiros, espécie de lugar-tenente de Sarney, tratou de manter Garibaldi em suspenso.
Em reunião no Senado, Renan disse a Garibaldi que o PMDB continua fechado com ele. Mas deixou entreaberta a porta para uma meia volta.
Disse que Sarney seria candidato caso ficasse evidenciado que a recandidatura de Garibaldi não tem amparo legal.
Decidido a afastar-se do papel de bobo, Garibaldi encerrou o dia ao lado de Tião Viana, o candidato do PT. Em entrevista conjunta, a dupla disse aos repórteres que suas candidaturas são definitivas.
Imagina-se que Sarney, interessado em ser ungido pelo Senado, não vai se embrenhar numa disputa de resultado incerto.
Resta agora aguardar pelo resultado da reunião que o cacique do PMDB terá com Lula.
- Josias de Souza, 46, é colunista da Folha de S.Paulo.
*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1
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