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História de vida e trabalho de um magistrado que honrou a sua toga

Artigo do desembargador Edvaldo Pereira de Moura, que é diretor da ESMEPI e professor da UESPI.

Foto: Marcelo Cardoso/GP1Desembargador Edvaldo Moura
Desembargador Edvaldo Moura

Desembargador Edvaldo Pereira de Moura, vice-presidente do IMB e do COPEDEM, Professor de Penal e Processo Penal da UESPI.

Em anos que já ficaram, em Oeiras, minha terra natal, sonhei com a magistratura. Explicar é impossível, pois coisas há que não se explicam. Numa fase inicial de minha juventude, levado pela curiosidade própria de minha idade e do meu feitio, ousei imitar os adultos e sem maiores motivos, dispus-me a assistir a uma cansativa e movimentada Sessão do Tribunal do Júri de Oeiras, onde um primo de meu genitor estava sendo julgado pela prática de homicídio contra um sedutor que humilhara toda a sua família. Este acontecimento, aliás, redundaria numa das mais brutais tragédias familiares, que se teve notícia por aquelas bandas.

Dizem os epistemólogos que o senso comum é o pai da ciência formal. Muitas coisas podem nos impressionar, sem que para as quais tenhamos a maturidade lógica de entendê-las ou explicá-las. O que primeiro chamoume a atenção de adolescente, foi aquele ato desesperado de um homem modesto, que sempre soubera se conduzir com estremado apuro de prudência e siso moral. Somente mais tarde, vim a entender que os crimes de vingança, tecnicamente conhecidos na história criminal, como vingança privada, refletem, antes de tudo, a ausência do Estado no provimento temporal e espacial da Justiça, gerando revolta e indignação. Outro aspecto grave que me prendeu a atenção estupefacta e intrigada, foi a postura humilhada, vil, impotente de um homem de respeitável idade, honrado pai de família, imobilizado numa cadeira de réu, sem vez nem voz, sob inclementes vergastadas verbais e gestuais do acusador público, perante um juiz desveladamente parcial e emotivo, que conduzia o julgamento sem a necessária preocupação com a realização do justo. Foi ai, que encontrei as respostas perfeitas para algumas indagações mais apuradas, próprias de minha idade: que futuro eu teria como pessoa e que papel iria exercer na sociedade, quando adulto? De repente, como que querendo dar uma resposta àquele quadro dantesco, mas costumeiro no Tribunal do Júri do meu Estado, resolvi: quando eu crescer, irei me formar em Direito para ser juiz e me conduzir totalmente ao contrário desse que acabo de presenciar. A partir daquele dia o meu destino foi traçado, na certeza de que nada me demoveria de tão seguro propósito. Posso dizer, com toda a convicção, que não se pode desdenhar das promessas de um jovem, quando o destino lhe bate a porta, desafiando a sua imaginação. Acredito, piamente, que um grande homem será sempre a obra de um alentado sonho de um menino determinado.


O certo é que, motivado pelo desejo de ser magistrado e à custa de muito esforço pessoal cheguei, por concurso público, à Policia Civil do Piauí, de que me considero um produto espiritual, formando-me em Direito. A ideia de ser magistrado, lentamente, se corporificava. Passo importante, pois, para o atingimento da meta optada, havia sido dado. Como policial, galguei todos os postos de tão espinhosa carreira, de que sai como Delegado de Classe Especial, bastante conhecido, com certo prestígio e indiscutível popularidade.

Em 14 de julho de 1977, após a aprovação em concorrido certame público, investi-me no honroso e ingente cargo de Juiz de Direito da distante e esquecida Parnaguá, no extremo sul do Piauí. Ali começou, ainda com passos trôpegos, a minha peregrinação por ínvias, diversas e desassistidas comarcas piauienses e com as suas peculiaridades, seus costumes e suas tradições. Palmeei todas as entrâncias, degrau por degrau, da primeira à última, sem tergiversar, sem pular por cima, sem voos mais altos.

Em fevereiro de 1982, fui promovido, por merecimento, para a comarca de Jerumenha, a terceira mais antiga do Estado. De Jerumenha, fui promovido, também, por merecimento, para a comarca de Oeiras, sede da primeira capital do Piauí. Três anos depois, igualmente, por merecimento, cheguei à comarca de Picos, onde permaneci por 17 anos e de onde fui removido para a 1ª Vara Criminal de Teresina.

Em minha longa, extenuante, desafiadora, mas prazerosa jornada na Justiça do Piauí, exerci os mais diferentes deveres, atuando, por mais de 40 anos, como sabem os meus coestaduandos, com a lisura, a independência e a coragem moral que nunca me faltaram.

Em setembro de 2002, ascendi ao Tribunal de Justiça do Piauí, trazido pelas mãos insondáveis do destino, quebrando tabu e sem compromisso com o acaso, porque, 26 anos antes, havia iniciado a minha caminhada, rumo ao lugar que me esperava. Foram quase 15.000 dias e noites de trabalho, alegrias, tristezas, dificuldades, privações, provações, derrotas e vitórias, que tanto fortaleceram o meu espírito e a crença em que tudo vale a pena, quando se faz da vida uma busca incessante dos ideais superiores ou, como disse o poeta, “se a alma não é pequena”.

Como desembargador, fui vice-presidente, fui presidente, em duas oportunidades diferentes do Tribunal de Justiça do Piauí, fui corregedor e presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí.

Como presidente do Tribunal de Justiça, inaugurei os seguintes fóruns: o Fórum do Anexo do Juizado Especial Cível e Criminal de Picos - Juiz Virgílio Madeira Martins; o Fórum de Guadalupe – Desembargador Raimundo Barbosa de Carvalho Baptista; o Fórum de Pimenteiras – Desembargador Sátiro Alexandrino Nogueira; o Fórum de Jaicós – Desembargador Fernando Lopes Sobrinho; o Fórum de Francisco Santos – Desembargador José Vidal de Freitas; o Fórum de Simplício Mendes – Desembargador José Carneiro Neto; o Fórum de Campinas do Piauí – Juiz Orlando Martins Pinheiro; o Fórum de Santa Filomena – Tabelião Benvindo Lustosa Nogueira; o Fórum de Parnaguá – Juiz Urbano Pereira de Araújo; o Fórum de Caracol – Juiz José Emiliano Paes Landim Filho; o Fórum de Luzilândia – Desembargador Paulo de Tarso Mello e Freitas; o Fórum de São Gonçalo – Juiz Manoel Soares de Sousa; o Fórum de São Félix do Piauí – Serventuário José Cazé de Moura; o Fórum de Gilbués – Desembargador Fausto Ribamar Oliveira; o Fórum de Monte Alegre – Juiz Joaquim Lopes da Silva; o Fórum de Manoel Elmídio – Juiz Jefferson Carvalho Lopes da Silva; o Fórum de Marcos Parente; o Fórum de Antônio Almeida – Desembargador Francisco Gomes de Araújo; o Fórum do Juizado Especial Cível e Criminal da Zona Leste II, da Universidade Federal do Piauí – Juiz William Palha Dias; o Fórum do Juizado Especial Cível e Criminal da Universidade Estadual do Piauí – Juiz Severino Gomes de Oliveira; o Fórum do Juizado Especial Cível e Criminal da Zona Leste II – Juiz Clóvis Alves Pereira; o Fórum do Juizado Especial da Fazenda Pública de Teresina – Juiz Arimar Castelo Branco; o Fórum Cível e Criminal de Teresina – Desembargador Joaquim de Sousa Neto; o Prédio da Escola Judiciária – Desembargador Lucrécio Dantas Avelino.

Além dos supracitados fóruns, procedi à criação e à instalação da Coordenadoria da Infância e da Juventude de Teresina; melhorei a estrutura operacional de todas as Unidades Judiciárias do Estado, com significativo aumento do número de servidores concursados e com a instalação de modernos equipamentos de informática; adquiri, através de doações, três valiosos imóveis em Picos, Oeiras e Pedro II, para a construção dos seus respectivos fóruns; removi, mediante concurso, 155 servidores do quadro e 2.132 colaboradores efetivos; criei dois cargos de desembargadores, para o Tribunal de Justiça e, ainda, provi três dos cargos existentes.

Aqui está a síntese de uma história de vida e trabalho de um magistrado que continua com o mesmo entusiasmo do dia em que se investiu no honroso cargo de Juiz de Direito da histórica e desassistida Parnaguá.

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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