*Deusval Lacerda de Moraes
Licitar é selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública, com a observância do princípio da isonomia. Segundo o jurista Marçal Justen Filho, no livro Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, a vantagem se caracteriza como a adequação e satisfação do interesse coletivo por via da execução do contrato. A maior vantagem se apresenta quando a Administração assume o dever de realizar a contratação menos onerosa e o particular se obriga a realizar a melhor e mais completa prestação, configurando-se, portanto, uma relação custo-benefício. A maior vantagem corresponde à situação de menor custo e maior satisfação para a Administração.
No Piauí, ocorre de não ser seguido o preceito acima e que está prescrito no art. 3º da LL (Lei das Licitações). O chefe da Controladoria Geral da União (CGU) no Piauí, Orlando Vieira, disse que em levantamento recente detectou fraude nas licitações em 93% dos 25 municípios fiscalizados no período de 2008 a 2011. Afirmou na imprensa José Maria de Araújo Costa, vice-presidente da Comissão de Combate à Corrupção e Impunidade da OAB, secção Piauí, que existem casos de direcionamento de licitação pelo uso de artimanhas que terminam eliminando outros concorrentes da disputa. No setor público brasileiro, já se criou alguns artifícios para burlar as licitações – na semana passada foi presa uma quadrilha de fraudadores no Paraná.
A Barragem de Milagres, a ser construída no município de Santa Cruz dos Milagres/PI, por exemplo, o seu custo inicial saltou de R$ 81 milhões para R$ 190 milhões, com sobrevalorização de R$ 109 milhões. E considerando que em obras públicas no Brasil geralmente se recorrem aos 25% de acréscimos previstos na Lei nº 8.666/93 (§1º, alínea d, inciso II, artigo 65), que significaria mais R$ 47,5 milhões, a obra terminaria com custo exorbitante de R$ 237,5 milhões, o que precisaria de nova licitação para adequação da nova proposta dentro dessa nova realidade da construção.
Mas a alegação do Governo do Piauí ao Tribunal de Contas da União (TCU) para continuar com o consórcio vencedor da licitação de 12 anos atrás, foi que o Piauí está em seca e a obra é importante para combater a estiagem no Estado. Acontece que obra desse porte dura mais de três anos de execução e, nesse período, o Centro Técnico Aeroespacial (CTA) não prevê escassez de chuvas no Nordeste. Outro fator relevante é que o Ministério da Integração Nacional aprovou o Termo de Compromisso do Governo do Piauí em 14 de novembro de 2012 e a primeira parcela correspondente a 30% dos recursos só foi liberada em 31 de julho de 2013, portanto oito meses depois, e uma nova licitação só demoraria no máximo dois meses, então, por que não foi realizado um novo procedimento licitatório?
A Barragem de Castelo, que está orçada em R$ 320 milhões, mais os 25% da lei acresceriam R$ 80 milhões, num custo total de R$ 400 milhões, a Associação Piauiense de Combate à Corrupção e a Degradação do Meio Ambiente - ONG Olho Aberto ajuizou Ação Civil Pública contra o Governo do Estado e pediu a impugnação do Edital. Afirmou que o documento possui vícios que comprometem a legalidade do certame, ameaça a livre concorrência e está em desacordo com a Lei de Licitações. A Justiça do Piauí determinou a suspensão da licitação e, na decisão exarada em 16 de julho de 2013, o juiz auxiliar da 1ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública, Rodrigo Alaggio Ribeiro, sustentou que o Edital fere os princípios da Administração e a liminar determinou ainda que sejam retirados do Edital alguns pontos restritivos do certame.
E uma das restrições diz respeito à visita pelo concorrente ao local da obra para melhores esclarecimentos técnicos. A visita é necessária para se conhecer os entraves físicos e estruturais da obra e imprescindíveis na construção da barragem, como acesso, estrada, energia, jazida e outros subsídios para elaborar proposta de engenharia, e cujo Atestado da Visita é obrigatório na juntada da documentação de habilitação do concorrente (inciso II, art. 30 da LL). Mas o tal Edital determinou a visita nos dias 11 e 12 de julho, ou seja, em apenas dois dias, e a entrega da documentação de habilitação e a proposta às 10h do dia 16 de julho, portanto quatro dias depois, e entremeados por um final de semana, o que limita a ampla competitividade. Além da exigência de Atestados de Capacidade Técnica relativos a quantitativos da obra em percentuais superiores aos 50% previstos como razoáveis por decisões do TCU.
Face ao exposto, ver-se-á que o montante a ser investido pelo Governo Federal nas duas barragens poderá girar em R$ 637,5 milhões, o que por si só deveria acarretar total lisura no processo licitatório para escolher construtoras com experiências comprovadas nesse ramo da construção civil e que busquem a conjugação da qualidade e menor onerosidade como vantajosidade para a Administração. E nunca se recorrer a filigranas hermenêuticas para dificultar o escorreito cumprimento dos editais licitatórios sem escamotear o bom entendimento das regras procedimentais como ardil inibidor da concorrência nacional que, assim, pode sair vencedor concorrente que não apresenta as condições técnicas nem know-how exigidos para execução de obras de tão complexa magnitude. Só para lembrar, cita-se o rompimento da Barragem de Algodões.
*Deusval Lacerda de Moraes
Pós-Graduado em Direito
Licitar é selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública, com a observância do princípio da isonomia. Segundo o jurista Marçal Justen Filho, no livro Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, a vantagem se caracteriza como a adequação e satisfação do interesse coletivo por via da execução do contrato. A maior vantagem se apresenta quando a Administração assume o dever de realizar a contratação menos onerosa e o particular se obriga a realizar a melhor e mais completa prestação, configurando-se, portanto, uma relação custo-benefício. A maior vantagem corresponde à situação de menor custo e maior satisfação para a Administração.
No Piauí, ocorre de não ser seguido o preceito acima e que está prescrito no art. 3º da LL (Lei das Licitações). O chefe da Controladoria Geral da União (CGU) no Piauí, Orlando Vieira, disse que em levantamento recente detectou fraude nas licitações em 93% dos 25 municípios fiscalizados no período de 2008 a 2011. Afirmou na imprensa José Maria de Araújo Costa, vice-presidente da Comissão de Combate à Corrupção e Impunidade da OAB, secção Piauí, que existem casos de direcionamento de licitação pelo uso de artimanhas que terminam eliminando outros concorrentes da disputa. No setor público brasileiro, já se criou alguns artifícios para burlar as licitações – na semana passada foi presa uma quadrilha de fraudadores no Paraná.
A Barragem de Milagres, a ser construída no município de Santa Cruz dos Milagres/PI, por exemplo, o seu custo inicial saltou de R$ 81 milhões para R$ 190 milhões, com sobrevalorização de R$ 109 milhões. E considerando que em obras públicas no Brasil geralmente se recorrem aos 25% de acréscimos previstos na Lei nº 8.666/93 (§1º, alínea d, inciso II, artigo 65), que significaria mais R$ 47,5 milhões, a obra terminaria com custo exorbitante de R$ 237,5 milhões, o que precisaria de nova licitação para adequação da nova proposta dentro dessa nova realidade da construção.
Mas a alegação do Governo do Piauí ao Tribunal de Contas da União (TCU) para continuar com o consórcio vencedor da licitação de 12 anos atrás, foi que o Piauí está em seca e a obra é importante para combater a estiagem no Estado. Acontece que obra desse porte dura mais de três anos de execução e, nesse período, o Centro Técnico Aeroespacial (CTA) não prevê escassez de chuvas no Nordeste. Outro fator relevante é que o Ministério da Integração Nacional aprovou o Termo de Compromisso do Governo do Piauí em 14 de novembro de 2012 e a primeira parcela correspondente a 30% dos recursos só foi liberada em 31 de julho de 2013, portanto oito meses depois, e uma nova licitação só demoraria no máximo dois meses, então, por que não foi realizado um novo procedimento licitatório?
A Barragem de Castelo, que está orçada em R$ 320 milhões, mais os 25% da lei acresceriam R$ 80 milhões, num custo total de R$ 400 milhões, a Associação Piauiense de Combate à Corrupção e a Degradação do Meio Ambiente - ONG Olho Aberto ajuizou Ação Civil Pública contra o Governo do Estado e pediu a impugnação do Edital. Afirmou que o documento possui vícios que comprometem a legalidade do certame, ameaça a livre concorrência e está em desacordo com a Lei de Licitações. A Justiça do Piauí determinou a suspensão da licitação e, na decisão exarada em 16 de julho de 2013, o juiz auxiliar da 1ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública, Rodrigo Alaggio Ribeiro, sustentou que o Edital fere os princípios da Administração e a liminar determinou ainda que sejam retirados do Edital alguns pontos restritivos do certame.
E uma das restrições diz respeito à visita pelo concorrente ao local da obra para melhores esclarecimentos técnicos. A visita é necessária para se conhecer os entraves físicos e estruturais da obra e imprescindíveis na construção da barragem, como acesso, estrada, energia, jazida e outros subsídios para elaborar proposta de engenharia, e cujo Atestado da Visita é obrigatório na juntada da documentação de habilitação do concorrente (inciso II, art. 30 da LL). Mas o tal Edital determinou a visita nos dias 11 e 12 de julho, ou seja, em apenas dois dias, e a entrega da documentação de habilitação e a proposta às 10h do dia 16 de julho, portanto quatro dias depois, e entremeados por um final de semana, o que limita a ampla competitividade. Além da exigência de Atestados de Capacidade Técnica relativos a quantitativos da obra em percentuais superiores aos 50% previstos como razoáveis por decisões do TCU.
Face ao exposto, ver-se-á que o montante a ser investido pelo Governo Federal nas duas barragens poderá girar em R$ 637,5 milhões, o que por si só deveria acarretar total lisura no processo licitatório para escolher construtoras com experiências comprovadas nesse ramo da construção civil e que busquem a conjugação da qualidade e menor onerosidade como vantajosidade para a Administração. E nunca se recorrer a filigranas hermenêuticas para dificultar o escorreito cumprimento dos editais licitatórios sem escamotear o bom entendimento das regras procedimentais como ardil inibidor da concorrência nacional que, assim, pode sair vencedor concorrente que não apresenta as condições técnicas nem know-how exigidos para execução de obras de tão complexa magnitude. Só para lembrar, cita-se o rompimento da Barragem de Algodões.
*Deusval Lacerda de Moraes
Pós-Graduado em Direito
*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1
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