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A reforma deveria valorizar o voto do eleitor



*Júlio César Cardoso

No atual estágio da política corrupta brasileira nenhuma reforma política poderá vir de cima para baixo, sem a aprovação preliminar da sociedade. Isso é princípio de moralidade que o legislador precisa sensibilizar-se.

As decisões corporativistas de interesses políticos não podem mais prosperar no país. A sociedade eleitoral (o povo) precisa, como agente principal da democracia, ter outro tratamento. Apenas ela terá de dizer qual o sistema político representativo lhe é mais conveniente, e não certos grupos políticos, oportunistas e interessados em obter vantagens, vir vender o seu peixe à sociedade como lhe convém.

Vejam, por exemplo, a esperteza do relator da Comissão Especial da Reforma Política da Câmara, deputado Henrique Fontana (PT-RS), ao apresentar anteprojeto de reforma, que cria o sistema “proporcional misto”, uma verdadeira arquitetura da irracionalidade para enganar o eleitor e de complexo entendimento, mas, certamente, atendendo aos interesses do PT: “(...) nossa proposta é que cada eleitor passe a ter direito a dois votos: no primeiro, ele vota numa lista de candidatos do partido de sua escolha; no segundo, ele vota no candidato de sua preferência. No caso da lista, (...) que os candidatos sejam definidos em votação secreta pelos filiados ou convencionais dos partidos.” Com um critério intricado como este, que mantém o nefasto sistema proporcional e institui o voto cego de lista fechada, só pode mesmo afastar o cidadão das decisões políticas.

Se for feita uma consulta popular, porque este deveria ser o caminho correto, certamente a melhor proposta seria a adoção do voto distrital puro. Por quê? Porque é o sistema eleitoral mais simples, objetivo, barato e que combateria a corrupção política pela fiscalização direta do eleitor ao parlamentar eleito.

No voto distrital, a eleição seria descentralizada e cada estado dividido em distritos com um número fixo de eleitor. Cada partido apresentaria um candidato por distrito. Quem receber mais voto ficaria com a vaga. E os eleitores teriam um leque mais reduzido de candidatos a escolher. Assim, com um representante por distrito fica mais fácil para o eleitor fiscalizar o parlamentar, o que não ocorre no sistema atual em que a maioria dos eleitores não sabe em que deputado federal votou.

No sistema distrital haverá o barateamento das campanhas, pois cada candidato só disputará voto em seu distrito, reduzindo os custos com viagens e gastos com material de propaganda, que poderão ser suportados com recursos do fundo partidário e do próprio bolso do candidato, porém jamais com financiamento público. Dinheiro público deve ser direcionado para financiar as necessidades sociais e não para campanha política.

Os deputados distritais não vão se transformar em vereadores de luxo para só tratar de sua paróquia. O eleitor distrital, conhecendo o seu representante político, saberá fazer exigências de caráter nacional, bem como de combate ao fisiologismo, ao cabide de emprego e a outros comportamentos políticos imorais.

O sistema não prejudicará minorias. No Brasil não existem minorias permanentemente alijadas, como os sunitas, em alguns países árabes, conforme afirma o cientista político Amaury de Souza. Na prática, os candidatos de um distrito terão de buscar o apoio de todos os grupos de eleitores, se quiserem vencer.

Não haverá dinastias locais eternizadas pelo poder econômico e político, como no sistema atual - José Sarney, Jáder Barbalho etc. – em que o dinheiro faz a diferença para aqueles que precisam se deslocar em grandes territórios para disputar votos. Ao concentrarem a campanha em um distrito, os candidatos menos poderosos terão mais facilidade de chegar ao eleitor no corpo a corpo.

Os partidos não ficarão mais enfraquecidos. Na realidade no Brasil não existe partido político, mas sim um cipoal de siglas partidárias, composto internamente de políticos com várias tendências ideológicas. No sistema vigente vota-se em candidatos e não em partidos. Quem votou em Tiririca, na realidade, não votou no partido, pois se Tiririca pertencesse a outro partido seria eleito da mesma forma. O voto distrital fortalecerá a qualificação dos partidos na medida em que estes se vejam obrigados a terem em suas fileiras candidatos competentes e de ilibada conduta para disputar pleitos individualmente por distrito.

Não é verdadeiro o pressuposto de que o voto distrital não vai eleger grandes cabeças pensantes. No sistema atual porventura são eleitas grandes cabeças pensantes? Nesta legislatura, 36 dos 513 deputados federais elegeram-se com votos próprios, o restante entrou graças ao facilitador coeficiente eleitoral. Desses 36, quantos são grandes pensadores? E o que dizer dos 477 caronistas?

Aqui está o maior mérito do voto distrital: a aproximação do eleito com o eleitor. Como cada político representa uma região delimitada, os eleitores do lugar poderão acompanhar mais atentamente o trabalho dos parlamentares em Brasília. Hoje, temos um sistema que distancia o eleito do eleitor, e a maioria não sabe em que parlamentar votou.

Qualquer cidadão de mediana cultura sabe que nenhum partido político brasileiro traz em seu bojo consistência de um projeto alternativo ao país. Nem o PT do Lula, que na realidade copiou o modelo de política econômica de FHC, com algumas alterações. Portanto, o voto distrital puro é o caminho mais eficaz para se ter um Parlamento efetivamente representativo e fiscalizado. É o voto da transparência em que se conhece o candidato e não o voto cego de lista fechada. Nada de sistema esdrúxulo “proporcional misto” para beneficiar partido político.


*Júlio César Cardoso
Bacharel em Direito e servidor federal aposentado


*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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