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*Arthur Teixeira Junior

Imagem: Divulgação / GP1Clique para ampliarArthur Teixeira Junior é articulista e escreve para o GP1(Imagem:Divulgação / GP1)Arthur Teixeira Junior é articulista e escreve para o GP1
Visitávamos semanalmente minha sogra que reside em Agricolândia, cerca de 90 km da capital do Piauí, a bela Teresina. Certa feita, entrando em seu casebre, lá encontrei uma chorosa vizinha a lamentar-se, com a qual minha sogra dividia o pouco alimento colhido no fundo de seu quintal. Como de costume, não envolvi-me nos tratos da velha, embora não pudesse deixar de escutar a lamentação: seu benefício social (e única fonte de renda) havia sido suspenso e, para reativá-lo, precisava apresentar, dentre outros documentos, o seu CPF que há muitos anos havia perdido e que nem do número lembrava-se mais...”. Não pude deixar de intervir, sugerindo-lhe que fosse até a Receita Federal, na Capital, e solicitasse o número e uma segunda via do documento perdido.

Naquele momento eu demonstrei a ignorância que os ditos “informados” têm da realidade de nosso interior. Como pedir para uma mulher sozinha na vida, analfabeta, que nunca saiu do interior, que para sobreviver pede comida a tão pobres quanto ela, que se desloque até a Capital, localize uma Repartição Pública, consiga expressar-se para o atendente (nem sempre muito solícito), que então vá a uma agência bancária pagar a taxa, volte com o protocolo, etc., etc., e ainda consiga achar um meio de retornar a sua terra, atendida por uma única linha de ônibus? Tudo isto sem um Real no bolso.

Foi quando fiz algo que mudaria minha vida: anotei em um pedaço de papel tão velho quanto aquela senhora, seu nome, nome da mãe, data de nascimento, endereço. Na minha casa, utilizei-me dos meus conhecimentos e da poderosa ferramenta que dispunha, chamada internet, e em poucos minutos tinha em mãos uma folha com a certidão de regularidade do CPF daquela idosa, com o número e tudo mais, emitido on line pela própria Receita Federal.

Na semana seguinte, coloquei a anciã em meu carro e junto fomos até a Prefeitura, responsável pelo recadastramento dos benefícios federais, e fizemos sua regularização. Poucas vezes na vida senti uma emoção tão forte como aquela que senti ao ver os olhos marejados da velhinha e seus lábios que escondiam sua boca desdentada, balbuciar um “obrigada”.

Na semana seguinte, na minha próxima visita à Cidade, foi o caos! Uma pequena multidão aglomerava-se no terreiro defronte o barraco de minha sogra: miseráveis, rotos, coxos, mulheres maltrapilhas com crianças nuas e barrigudas no colo, anões, aleijados, semimortos saídos talvez do “Acidente em Antares” ou versão ampliada do “Exército de Brancaleone”. Mas o que impressionou mesmo foram as demandas levantadas.

Engana-se, leitor, ao pensar que lá estavam aqueles coitados a mendigar esmolas, migalhas, roupas velhas. Estavam sim ávidos por informação, por orientação. Como tirar um RG, já que a Delegacia da cidade nem delegado tem? Como regularizar um CPF? E para consertar uma data de nascimento assentada equivocadamente? Como faço para inscrever-me no Pronaf? Posso levar meu nenê para vacinar-se em outra cidade, já que aqui nunca tem vacina? E para parcelar um débito da Agespisa?

Nossos irmãos dos rincões dos interiores do Piauí são muito carentes, em quase tudo, mas principalmente em informação, em acesso. O pseudo intelectual abestalhado, trancado em um gabinete com ar condicionado aqui na Capital, pode dizer: porque não procuram a Prefeitura, o Padre, o Delegado, ou um vereador? Não sei em outras cidades, mas em Agricolândia, o Prefeito, o Padre, o delegado e grande parte dos vereadores (aqueles alfabetizados), não moram na cidade.

Hoje moro em Agricolândia, onde instalei um computador conectado com banda larga na varanda de casa, e reservo um dia da semana (somente isto, algumas horas de um único dia) para prestar informações e orientações aos meus irmãos necessitados. Não me custa nada, mas me dá um prazer muito grande, além de ajudar quem mais precisa com aquilo que mais precisa.

Meus pares no Serviço Federal onde sou servidor abriram um processo contra mim. Ameaçam-me de demissão. Acham que isto é beneficiar uma parcela da população, quebrando a isonomia no Serviço Público. Querem socializar a pobreza e a desinformação. Ou será somente racismo?

*Arthur Teixeira Junior é articulista  escreve para o GP1

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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