Segundo Roberto Gurgel, procurador-geral da República, o Congresso Nacional odeia o Ministério Público (ver post de ontem). A sua fala é infeliz e, de certo modo, preocupante. O chefe do MP não pode colocar a instituição que comanda como adversária de um dos Poderes — a rigor, aquele que caracteriza a democracia. Executivo atuante existe em qualquer país, inclusive nas tiranias. Justiça atuante, pouco importa a serviço de quem, idem. Mas só as democracias têm Parlamentos autônomos, que têm seus defeitos, é evidente.
Não os terá também o Ministério Público? A minha simpatia por Paulo Maluf é abaixo de zero. Só para que não reste muita dúvida, um dado da minha biografia no que diz respeito a este senhor: ele já me processou. E perdeu. Nem por isso a sua proposta de responsabilizar promotores e procuradores por abusos cometidos deve ser considerada um atentado à democracia — e, com isso, não estou dizendo que ele tenha sido vítima de injustiça. Ora, todas as autoridades devem responder por abusos que cometem.
Tenho cá meus princípios, que não escondo. Ninguém é enganado ao ler este blog: “Pô, fui lá esperando ler textos de um cara isento…” Vão catar coquinho os que vierem com essa conversa mole. Não tenho partido, mas isento não sou: estou comprometido com a democracia, o estado de direito, as liberdades públicas e as liberdades individuais. Ataco o que — incluindo os “quens” — julgo ferir esses princípios. O que Gurgel está negando? Que exista abuso do Ministério Público? Vênia máxima, senhor procurador, não procure, como diria a intelectual Dilma Rousseff, “tampar” o sol com a peneira.
Gurgel pode ser contra o projeto. É um direito seu. Mas não tem o direito de colocar o Congresso como inimigo do MP. É um erro. Porque isso faz supor que o MP, então, é inimigo do Congresso, e aí a isenção funcional foi para o brejo. Notem que falo em “isenção funcional”. Procuradores também têm gosto, ideologia, preferência partidária, utopia, visão de mundo etc. Não podem é usar o seu quase ilimitado poder para atingir reputações em razão de seus particularismos.
A imprensa vai mal nessas coisas. Lemos que a proposta, chamada de “Lei da Mordaça”, busca coibir “supostos abusos” dos procuradores… Como assim? Não!!! Quer coibir “abusos” mesmo, que sejam comprovados. O texto não trata de “supostos” abusos. A acusação que se prova infundada não pode desaparecer no ralo. E a reputação de quem foi atingido? Terei de lembrar ao dr. Gurgel o que aconteceu com Eduardo Jorge Caldas Pereira, secretário-geral da Presidência do governo FHC? Tudo aquilo resultou em quê? Numa enorme dor de cabeça para a vítima. ERA TUDO IDEOLOGIA. O único verdadeiramente punido na história? Eduardo Jorge, o inocente!
Eu não tenho nenhuma simpatia pelos Savonarolas e Torquemas que aparecem volta e meia na política. Nenhuma! Não raro, acabam revelando, tudo bem analisado, ódio pela democracia propriamente, não apenas por seus desvios. Gurgel, indo muito além de suas sandálias na defesa da aprovação da tal proposta dos fichas-sujas, afirma: “Acho que é preciso aproveitar o momento que vivemos de uma mobilização sem precedentes da sociedade a respeito do tema, que pressionam o Legislativo e também o Poder Judiciário”.
Que avaliação notável! Uma proposta, apresentada na Casa da democracia, que busca conter abusos — e não “supostos abusos” — de promotores é vista por Gurgel como grave ameaça ao MP, e isso basta para ele atacar todo o Congresso. Mas ele considera aceitável um discurso que, potencialmente ao menos, cria um clamor público para influenciar decisões do Legislativo e do Judiciário.
Outro inimigo
Para a democracia, embora fosse também incorreto, se o MP considerasse o Executivo um seu adversário, talvez fosse melhor. Vejam o caso do uso que Lula fez da rede nacional de rádio e TV, por exemplo. Há regras para requisitá-la. O tempo não se destina à propaganda de governo, à propaganda eleitoral e ao confronto com a oposição. Tudo o que Lula fez. Basta ler as funções da PGR para saber que o órgão pode se mobilizar para coibir e punir a transgressão. E nada foi feito até agora. A mesma frouxidão com o Executivo deixou Lula, inexplicavelmente, fora da denúncia do mensalão — mas incluiu Eduardo Azeredo por muito menos. Não estou contestando a inclusão de Azeredo. Indago desde sempre as razões da exclusão de Lula.
O procurador geral deve desculpas ao Congresso. Gurgel pode estar sendo vítima da jactância por causa do protagonismo alcançado no caso da roubalheira no Distrito Federal. Mas é preciso ter mais prudência. Os que estão lá foram eleitos pelo povo. E são inocentes até prova em contrário, senhor procurador. Não lhe cabe condenar o Congresso. Até porque o Ministério Público, embora não pareça, não condena ninguém. É uma tarefa da Justiça.
A democracia precisa de um Ministério Público independente, capaz, e responsável!
PS - “Pô, o Reinaldo tem coragem de escrever em defesa do Congresso!? Tenho coragem de escrever em defesa da democracia!
*Reinaldo Azevedo é colunista de Veja
Não os terá também o Ministério Público? A minha simpatia por Paulo Maluf é abaixo de zero. Só para que não reste muita dúvida, um dado da minha biografia no que diz respeito a este senhor: ele já me processou. E perdeu. Nem por isso a sua proposta de responsabilizar promotores e procuradores por abusos cometidos deve ser considerada um atentado à democracia — e, com isso, não estou dizendo que ele tenha sido vítima de injustiça. Ora, todas as autoridades devem responder por abusos que cometem.
Tenho cá meus princípios, que não escondo. Ninguém é enganado ao ler este blog: “Pô, fui lá esperando ler textos de um cara isento…” Vão catar coquinho os que vierem com essa conversa mole. Não tenho partido, mas isento não sou: estou comprometido com a democracia, o estado de direito, as liberdades públicas e as liberdades individuais. Ataco o que — incluindo os “quens” — julgo ferir esses princípios. O que Gurgel está negando? Que exista abuso do Ministério Público? Vênia máxima, senhor procurador, não procure, como diria a intelectual Dilma Rousseff, “tampar” o sol com a peneira.
Gurgel pode ser contra o projeto. É um direito seu. Mas não tem o direito de colocar o Congresso como inimigo do MP. É um erro. Porque isso faz supor que o MP, então, é inimigo do Congresso, e aí a isenção funcional foi para o brejo. Notem que falo em “isenção funcional”. Procuradores também têm gosto, ideologia, preferência partidária, utopia, visão de mundo etc. Não podem é usar o seu quase ilimitado poder para atingir reputações em razão de seus particularismos.
A imprensa vai mal nessas coisas. Lemos que a proposta, chamada de “Lei da Mordaça”, busca coibir “supostos abusos” dos procuradores… Como assim? Não!!! Quer coibir “abusos” mesmo, que sejam comprovados. O texto não trata de “supostos” abusos. A acusação que se prova infundada não pode desaparecer no ralo. E a reputação de quem foi atingido? Terei de lembrar ao dr. Gurgel o que aconteceu com Eduardo Jorge Caldas Pereira, secretário-geral da Presidência do governo FHC? Tudo aquilo resultou em quê? Numa enorme dor de cabeça para a vítima. ERA TUDO IDEOLOGIA. O único verdadeiramente punido na história? Eduardo Jorge, o inocente!
Eu não tenho nenhuma simpatia pelos Savonarolas e Torquemas que aparecem volta e meia na política. Nenhuma! Não raro, acabam revelando, tudo bem analisado, ódio pela democracia propriamente, não apenas por seus desvios. Gurgel, indo muito além de suas sandálias na defesa da aprovação da tal proposta dos fichas-sujas, afirma: “Acho que é preciso aproveitar o momento que vivemos de uma mobilização sem precedentes da sociedade a respeito do tema, que pressionam o Legislativo e também o Poder Judiciário”.
Que avaliação notável! Uma proposta, apresentada na Casa da democracia, que busca conter abusos — e não “supostos abusos” — de promotores é vista por Gurgel como grave ameaça ao MP, e isso basta para ele atacar todo o Congresso. Mas ele considera aceitável um discurso que, potencialmente ao menos, cria um clamor público para influenciar decisões do Legislativo e do Judiciário.
Outro inimigo
Para a democracia, embora fosse também incorreto, se o MP considerasse o Executivo um seu adversário, talvez fosse melhor. Vejam o caso do uso que Lula fez da rede nacional de rádio e TV, por exemplo. Há regras para requisitá-la. O tempo não se destina à propaganda de governo, à propaganda eleitoral e ao confronto com a oposição. Tudo o que Lula fez. Basta ler as funções da PGR para saber que o órgão pode se mobilizar para coibir e punir a transgressão. E nada foi feito até agora. A mesma frouxidão com o Executivo deixou Lula, inexplicavelmente, fora da denúncia do mensalão — mas incluiu Eduardo Azeredo por muito menos. Não estou contestando a inclusão de Azeredo. Indago desde sempre as razões da exclusão de Lula.
O procurador geral deve desculpas ao Congresso. Gurgel pode estar sendo vítima da jactância por causa do protagonismo alcançado no caso da roubalheira no Distrito Federal. Mas é preciso ter mais prudência. Os que estão lá foram eleitos pelo povo. E são inocentes até prova em contrário, senhor procurador. Não lhe cabe condenar o Congresso. Até porque o Ministério Público, embora não pareça, não condena ninguém. É uma tarefa da Justiça.
A democracia precisa de um Ministério Público independente, capaz, e responsável!
PS - “Pô, o Reinaldo tem coragem de escrever em defesa do Congresso!? Tenho coragem de escrever em defesa da democracia!
*Reinaldo Azevedo é colunista de Veja
*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1
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