Embalado pela musicalidade do título e plagiando Clarice Lispector que gostava de intitular suas obras com rótulos alternativos, creio que "No Absoluto, nada é relativo; no Relativo, nada é absoluto", cairia bem.
Em verdade, há algum tempo estava pretendendo trazer este tema a lume, mas sua complexidade e abrangência, fizeram-me adiá-lo. Entretanto, a hora é chegada.
Poucos conceitos são tão importantes para o estudo da filosofia como a verdadeira compreensão do significado das palavras relativo e absoluto. Esta questão não é nova. Já foi abordada por quase todos os filósofos de uma maneira ou de outra, como por exemplo, quando os primeiros pensadores procuraram identificar o arkhé, ou o princípio único que rege o universo. Sugiro esta abordagem...
Entenda-se por relativo tudo que estiver sob a égide da relação tempo-espaço. Se algo está sujeito e, por via de conseqüência, tem seus limites nesta equação, enquadra-se e pertence ao relativo. Como conseqüência dessa relação, tudo, em tese, pode ser caracterizado e definido, mantendo-se determinados parâmetros, bem como, alterado qualquer fator anterior de medição, pode ser alterado o resultado final.
Em outras palavras, o relativo está intimamente ligado aos valores do observador e tem como uma de suas principais características a mutabilidade. Cumpre alertar, entretanto, que em que pese todas as verdades que possamos alcançar sejam relativas, este relativismo é diferente daquele proposto por Protágoras, ao proclamar que "o homem é a medida de todas as coisas".
Ele apontava pertencer a cada qual a sua verdade, o que não nego, mas enfatizo que há outro grupo de verdades que podem ser tão abstratas quanto a totalidade das idéias. Já para o absoluto, a regra é exatamente a oposta. Ele pertence ao inconcebível, logo não há qualquer parâmetro de aferição. Tentar entender o absoluto com valores do relativo, faz-nos, por definição, enveredar por uma seara que jamais poderá ser entendida.
Outra advertência importante, que fica desde já registrada, é que não estou a defender, - nem tampouco a atacar -, o relativismo, enquanto conceito filosófico que se baseia na relatividade de todo conhecimento e repudia qualquer verdade ou valor absoluto. Muito pelo contrário, enfatizo a existência e o valor de ambos - relativo e absoluto, desde que aplicados cada um em seu contexto.
É bem verdade que essa confusão conceitual permeou, permeia, e, por certo, permeará, por um longo tempo ainda, toda a história da humanidade, em razão de interesses inconfessáveis, que uma simples leitura imparcial dos fatos históricos poderia desmascarar.
A perda de parâmetros e a deturpação de conceitos nos tornam impotentes, na medida que nos faz perder o rumo, como assevera André Comte-Sponville: "Que importa o verdadeiro, se não sabemos viver? Que importa a justiça, se somos incapazes de agir justamente?"
Talvez seja nessa seara que a confusão entre o que é relativo e absoluto tenha a função de eternizar a incompreensão e preservar a manutenção do poder e influência das correntes dominantes. Resumo esta parte com os ensinamentos de Huberto Rohden: "A realidade é absoluta e infinita - mas o contato com essa realidade, que chamamos conhecer, é sempre relativo (...) Daí a insensatez que há em querer estabelecer regras absolutas e dogmas imutáveis, no terreno religioso ou político, para todos os tempos e todos os homens".
Explicação mesmo para tudo isso, só encontramos nos poetas, senão vejamos Fernando Pessoa sobre o tema: "O universo não é uma idéia minha. A minha idéia do universo é que é idéia minha. A noite não anoitece pelos meus olhos, A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos. Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos A noite anoitece concretamente E o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso."
Boa sorte a (nós) todos.
Eusébio/CE, 26 de julho de 2008.
José Anastácio de Sousa Aguiar
*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1
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