Resolvi escrever hoje sobre um assunto que vem sido trazido à tona em alguns filmes e livros atuais, como Matrix e Quem somos nós?
Em que pese a enorme abrangência e incerteza do tema, é por demais instigante. Será que nós existimos mesmo? Será que somos reais ou apenas fruto de uma grande ilusão planetária, ou porque não dizer universal?
O assunto, parece-me, não ser de todo novidade para ninguém. Em algum momento da vida já nos perguntamos algo existencialista correlato, mesmo que não tenhamos dividido essa angústia com ninguém.
Vejamos o que dizem os que vieram antes de nós e abordaram o tema. Entretanto, é imperioso que se diga desde já que esse tema é extremamente árido e poucos filósofos o abordam com alguma clareza.
Escolhi dois mestres para resumir o tema: René Descartes e Immanuel Kant. Graças à amplitude e profundidade de suas obras nos diversos campos do conhecimento humano, como a filosofia, a física e a matemática, Descartes ficou conhecido por muitos como o fundador da filosofia moderna, tendo inaugurado o racionalismo na Idade Moderna.
Já Kant, destacou-se sobretudo por sua filosofia moral, bem como por sua concepção do transcendentalismo e principalmente por sua filosofia da natureza e do homem, que é uma das mais determinantes fontes do relativismo.
Mas em que ambos podem nos ajudar nesse tema? A frase de Descartes mais conhecida e que aqui se destaca por pertinência com o tema é: Penso, logo existo. Ele entendia que a primeira idéia era o próprio Eu e dessa idéia não se podia duvidar. O filósofo francês a desenvolveu, em apertada síntese, no bojo de seus estudos do método cartesiano ao instituir a dúvida, asseverando que cada idéia que pode ser duvidada, deve ser duvidada, em oposição aos gregos antigos e escolásticos que criam que as coisas existiam, simplesmente porque precisavam existir. Afirmava que só é possível dizer que existe algo que possa ser provado, e a dúvida seria a prova do pensar e, por conseguinte, o pensar seria a prova do existir. Em outras palavras, a autoconsciência seria a certeza da própria realidade.
Já Kant, foi um dos primeiros filósofos a se aprofundar na relação tempo e espaço e sua percepção por nós, afirmando que não somos capazes de conhecer inteiramente os objetos reais e que o nosso conhecimento é apenas fruto do que somos capazes de pensar. Ao unir essas duas idéias, chegamos a uma encruzilhada dogmática. Será que é condição suficiente o fato de pensar para provar a existência? Pensar prova o existir? E se prova, será que essa prova não é ilusória?
Partindo das diversas consciências individuais que Descartes entendia como prova do existir, vemos que cada indivíduo tem uma visão de mundo e de extensão distinta de todos os seus semelhantes e quem garante que não estejamos todos equivocados e tudo não passa de uma grande ilusão?
Vejamos um simples exemplo. Se pensar prova o existir, o que dizer dos reinos vegetal e mineral? Até onde entendemos, uma pedra não pensa - pelo menos não como os humanos, logo ela não poderia existir. Mas alguém poderia argumentar que todos nós podemos ver ou sentir uma pedra.
Nesse contexto, a condição do existir passaria do pensamento para os sentidos. Ora, ambos nada mais são do que partes de um todo complexo chamado corpo humano, que não pode justificar a sua própria existência por si mesmo.
A meu ver, os sentidos e muito menos o pensar não provam nem justificam o existir. Parece-me que o equívoco de Descartes reside no fato de estabelecer como idéia primeira o próprio Eu, inquestionável. Ao questionar tudo, esqueceu de questionar a si próprio.
Caso o leitor não tenha entendido muito bem esta coluna, digo-vos que estamos empatados. Para aprofundamento da dúvida sugiro a leitura dos filósofos citados, ou, pelo menos, refletir, vendo o primeiro filme da série Matrix ou Quem somos nós?
Boa sorte a (nós) todos.
Eusébio/CE, 20 de junho de 2008.
José Anastácio de Sousa Aguiar
*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1
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