As vacinas contra a covid-19 produzidas pela Universidade de Oxford com a AstraZeneca e pela Pfizer parecem ser capazes de neutralizar a variante brasileira do coronavírus, a P.1. É o que indica um estudo feito in vitro publicado nesta segunda-feira, 15, em formato de pré-print – ainda sem revisão de outros cientistas - no site BioRxiv.
O trabalho avaliou a capacidade da cepa originada no Amazonas de escapar de anticorpos – não somente os induzidos por vacinas, mas também do soro de convalescente (anticorpos gerados por quem teve a infecção há mais tempo), e os chamados anticorpos monoclonais, que são um tipo de remédio biológico. E constatou que nos dois primeiros casos, o cenário é mais positivo.
Houve uma pequena perda de neutralização na comparação com as cepas mais comuns, mas ainda assim o efeito das vacinas não ficou comprometido em relação à P.1, situação similar à observada para a cepa britânica B.1.1.17.
O estudo, conduzido por pesquisadores de Oxford e da Fiocruz Amazônia, coletou amostras de soro de 25 pessoas que receberam a vacina de Oxford e 25 que receberam o imunizante da Pfizer.
A limitação do trabalho, porém, é que ele só analisa o desempenho do vírus in vitro. Ainda faltam estudos para testar a eficácia das vacinas em seres humanos, mas os resultados, de acordo com os cientistas, são animadores porque estudos com humanos no Reino Unido já comprovaram que essa pequena perda no nível de anticorpos não atrapalhou a efetividade da vacina.
"Essas duas cepas se comportam de maneira muito semelhante. No caso da variante britânica, a eficácia caiu pouco, de 80% para 75%. Temos que esperar os estudos de efetividade aqui, mas acreditamos que vá ser um índice parecido para a P.1. É um resultado muito positivo", diz Sue Ann Costa Clemens, coordenadora dos centros de pesquisa da vacina de Oxford no Brasil e uma das autoras do estudo.
A preocupação dos pesquisadores era que a P.1 pudesse escapar dos anticorpos induzidos pela vacina da mesma forma que ocorreu com a variante que surgiu na África do Sul, a B.1.351, em relação ao imunizante de Oxford.
As duas variantes, assim como a surgida no Reino Unido, B.1.1.7, compartilham mutações muito semelhantes principalmente na parte do vírus que se liga às células humanas.
“O estudo de fato constatou que a P.1 tem uma afinidade muito grande com o receptor, o que lhe dá uma vantagem de realmente ser mais transmissível que as linhagens anteriores”, explica a microbiologista Natalia Pasternak, da USP, que avaliou o trabalho a pedido do Estadão. “Com isso ela vai ganhar fácil a briga e deve se tornar prevalente no Brasil bem rapidamente”, diz.
“Mas, para a nossa sorte, ela não tem um escape tão grande da vacina da AstraZeneca, e isso é uma boa notícia para nós porque é vacina que temos. Mas precisamos vacinar rápido para não dar a chance de as cepas desenvolverem mais mutações que podem prejudicar a eficácia das vacinas”, afirma a pesquisadora.
Na comparação com as cepas mais comuns, a neutralização da Pfizer contra a P.1 teve uma redução de 2,6 vezes e a da Oxford, de 2,9 vezes – um desempenho parecido com o da variante britânica, mas bem menos preocupante do que ocorreu, por exemplo, com a variante da África do Sul, contra a qual as reduções foram, respectivamente, de 7,6 e 9 vezes.
Os autores apontam que “surpreendentemente” a P.1 é menos resistente aos anticorpos naturalmente adquiridos ou induzidos pela vacina que a B.1.351, o que sugere que outras mudanças na variante sul-africana podem impactar a neutralização.
Sem efeito contra a variante da África do Sul
Uma outra pesquisa divulgada nesta terça – este sim em periódico com revisão de pares e realizada em pessoas –, confirmou os resultados em relação à variante sul-africana.
O trabalho, publicado no New England Journal of Medicine, constatou que um regime de duas doses da vacina de Oxford não foi capaz de conferir proteção contra casos leves a moderados da covid-19 causada pela B.1.351. Ainda não está claro se a vacina poderá ter alguma eficácia contra casos graves e óbitos.
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