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"PEC de Fábio Novo sobre orientação sexual na Constituição é inconstitucional", diz Procurador

"De início, devo dizer, sem o temor do erro, que a PEC de autoria do deputado Fábio Novo é de uma inconstitucionalidade aberrante. De rachar os nervos", disse Miguel Dias.

O advogado e procurador no Piauí, Miguel Dias Pinheiro, divulgou texto com sua opinião sobre a Proposta de Emenda à Constituição Estadual (PEC) do deputado estadual Fábio Novo, aprovada pela Assembleia Legislativa, que propõe incluir a alteração "orientação sexual" no texto da Constituição do Piauí.

Imagem: Divulgação/GP1Advogado Miguel Dias(Imagem:Divulgação/GP1)Advogado Miguel Dias

De acordo com o procurador, a PEC pretende que sejam alterados os "objetivos fundamentais" do Estado, para incluir “orientação sexual" como objetivo fundamental, modificando a redação do inciso III, do artigo 3º, da Constituição do Piauí.

Para o procurador Miguel Dias, a PEC de autoria do “é de uma inconstitucionalidade aberrante; Se no texto federal não se pode incluir "orientação sexual" como objetivo fundamental e princípio constitucional da República, não cabe ao Estado legislar sobre a questão, por faltar-lhe competência e autorização legislativa para tanto”.

Veja o texto do procurador na íntegra:

Imagem: Foto: ReproduçãoClique para ampliarDeputado Fábio Novo(Imagem:Foto: Reprodução)Deputado Fábio Novo
Sinceramente, confesso que tomei um susto quando assisti um debate ontem (13) em um canal de televisão do Piauí entre o deputado estadual Fábio Novo (PT-foto) e um pastor evangélico sobre a Proposta de Emenda à Constituição Estadual, aprovada pela Assembléia Legislativa, que propõe incluir a alteração "orientação sexual" no texto da Constituição do Piauí.

Segundo ouvi do deputado piauiense do PT, a PEC modifica a redação do inciso III, do artigo 3º, da Constituição do Piauí, inserindo o termo “orientação sexual” nos "objetivos fundamentais do Estado para promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".

Isso mesmo, doutor! Quase cai! PEC aprovada pela Assembléia (pasmem!) pretende que sejam alterados os "objetivos fundamentais" do Estado, para incluir "orientação sexual" como objetivo fundamental, tudo isso ao arrepio da Constituição Federal. Realmente, em obediência à nossa Carta Política, nosso Piauí é mesmo "sui generis"!

De início, devo dizer, sem o temor do erro, que a PEC de autoria do deputado Fábio Novo é de uma inconstitucionalidade aberrante! De rachar os nervos!

Para que todos entendam, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, são princípios derivados da Constituição Federal. Como princípios constitucionais, devem, obrigatoriamente, ser repetidos pelas demais Constituições dos Estados federados. São, portanto, inalteráveis, imutáveis, sem que haja uma Emenda aprovada pelo Congresso Nacional para modificá-los.

Vamos transcrever, então, os dois textos legais:

Constituição Federal

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Constituição do Estado do Piauí

Art. 3º – São objetivos fundamentais do Estado:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

III – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Como dissemos, tanto a Constituição Federal como a Constituição Estadual repetem "ipsis litteris" os mesmos objetivos e princípios fundamentais na promoção do bem de todos. São cláusulas básicas, pétreas, somente podendo modificar-se quando o constituinte autorizar

Ora, para que a Constituição do Estado do Piauí possa ser alterada e, no inciso III, do art. 3º, inserirem-se as expressões "orientação sexual", seria necessário que tivesse o legislador piauiense autorização, permissão da Constituição Federal para reformar o nosso texto constitucional. Em outras palavras, o Congresso Nacional teria que, primeiro, incluir como objetivo fundamental da República a "orientação sexual" pretendida pelo deputado piauiense Fábio Novo.

Vejam a gravidade desta PEC aprovada aqui no Piauí!

Constitucionalmente, o que se entende por objetivos fundamentais da República e dos Estados? São espécies do gênero dos Princípios Fundamentais, possuindo, portanto, as mesmas funções e características conferidas aos Princípios Constitucionais. Quando a Constituição - tanto federal como estadual - prescreve o princípio de que haverá a "promoção do bem de todos", sem preconceito de sexo, por exemplo, já está açambarcando a "orientação sexual", que é uma das especificidades do preconceito de sexo insculpido na Norma Maior.

Portanto, quer a federal como as constituições estaduais tratam do gênero e não das espécies. A título de argumentação, vamos admitir que como o deputado Fábio Novo aprovou PEC para incluir no texto da Constituição do Piauí as expressões "orientação sexual" como um dos objetivos fundamentais do Estado, poderá muito bem outro parlamentar desejar também incluir a "terceira idade" ou a "orientação sobre a negritude" como objetivos fundamentais, para atender os permissivos da idade, da cor e da raça. Pelo o amor de Deus, aonde vamos parar!

Segundo o constitucionalista José Afonso da Silva, os Princípios Constitucionais são ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de normas. Nas sábias palavras do renomado constitucionalista, "os princípios são preceitos básicos da organização constitucional".

O princípio da legalidade, por exemplo, é um princípio jurídico fundamental que estabelece que o Estado deva se submeter à força imperativa da lei. Em outras palavras, o Estado do Piauí deve, sim, submeter-se ao império da Constituição Federal. Se no texto federal não se pode incluir "orientação sexual" como objetivo fundamental e princípio constitucional da República, não cabe ao Estado legislar sobre a questão, por faltar-lhe competência e autorização legislativa para tanto.

O princípio da legalidade - como são os casos dos objetivos fundamentais da República e dos Estados - é de fundamental importância para a certeza jurídica do Estado Democrático de Direito, justamente para garantir a segurança político-jurídica do cidadão. O mestre José Afonso da Silva arremata para dizer que, "o princípio da legalidade é a expressão da garantia vital de que a sociedade não está presa às vontades particulares e exclusivamente favoráveis daqueles que a governam".

Os princípios, enquanto mandamentos nucleares de um sistema, segundo CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, "exercem a importante função de fundamentar a ordem jurídica em que se inserem, fazendo com que todas as relações jurídicas que adentram ao sistema busquem na principiologia constitucional "o berço das estruturas e instituições jurídicas". Os princípios são, por conseguinte, enquanto valores, "a pedra de toque ou o critério com que se aferem os conteúdos constitucionais em sua dimensão normativa mais elevada" - destacamos.
No Brasil, o Piauí será o único entre os federados (advirta-se para essa forte expressão) que trará no texto de sua Constituição as expressões "orientação sexual" como objetivo fundamental do Estado. Não quero crer! Creio, no entanto, que o governador deverá vetar a PEC, com apenas um fundamento implacável: da incostitucionalidade.

por Miguel Dias Pinheiro, advogado e procurador no Piauí


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