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Conselheiro Jaylson Campelo critica decisão do STF

O STF decidiu ontem (10) que somente a Câmara Municipal tem competência para julgar as contas de governo e as contas de gestão dos prefeitos. Dessa forma somente ela pode tornar o prefeito in

Em entrevista ao GP1, o conselheiro substituto do Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE-PI), Jaylson Fabianh Lopes Campelo, criticou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de que somente a Câmara Municipal tem competência para julgar as contas de governo e as contas de gestão dos prefeitos, determinando que o Tribunal de Contas só deve auxiliar o Poder Legislativo municipal, emitindo parecer prévio e opinativo. Dessa forma somente a Câmara pode tornar o prefeito inelegível.

Membro da diretoria da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), ele afirmou que o TCE-PI não se posicionou sobre assunto, mas a sua opinião é que a decisão do STF vai contra a Lei Ficha Limpa e que isso pode abrir portas para a corrupção.


Para o conselheiro, o Supremo não levou em consideração a diferença que há entre as contas de gestão e de governo. Para ele, as contas de governo, que são de natureza política, devem ser julgadas pelo parlamento, mas as de gestão, só quem tem capacidade para fazer toda a análise documental é o Tribunal de Contas.

“Estamos vendo [essa decisão] com preocupação e tristeza. Primeiro porque fere a Lei Complementar 135 que ficou popularmente conhecida como a Lei da Ficha Limpa. Além de ferir a competência dos tribunais que historicamente sempre fizeram a distinção da natureza das contas. Uma coisa são as contas do chefe do executivo, as globais, prestadas anualmente, que tem que ser julgadas pelo parlamento, pois são contas políticas e vão ser julgadas politicamente. Outra coisa são as contas de gestão que se referem à movimentação de recursos. O prefeito municipal não é eleito para movimentar recursos financeiros, assinar ordem de serviço, realizar licitação, assinar recibos, isso são atos de gestão. Os Tribunais de Contas julgam de acordo com o que diz o artigo 71, inciso II da Constituição Federal e a Lei da Ficha Limpa, onde independentemente de quem é o gestor, seja julgado pelo TCE se praticasse atos de gestão. Agora isso passar a ser só no parlamento”, declarou.

  • Foto: Lucas Dias/GP1Jaylson CampeloJaylson Campelo

Explicou ainda que é “importante a distinção de conta de governo e de gestão, pois o parlamento tem efetivamente a competência para o julgamento político. As contas de governo tem relação direta com o orçamento global, com resultado das ações e opções políticas feitas pelo gestor. As contas de gestão não, diz respeito a execução orçamentária financeira, a movimentação de recursos e as questões técnicas”.

Contradição na decisão

Ele afirma que a decisão não é inconstitucional, mas vai contra uma lei que o próprio Supremo considerou constitucional. “Não seria caso de inconstitucionalidade, pois o Supremo é o guardião da Constituição. Então as decisões do STF são interpretando a constituição. O curioso é que a lei da Ficha Limpa diz que aqueles que tiveram as contas julgadas irregulares pelos Tribunais de Contas, independentemente de quem seja o ordenador de despesa, tanto faz ser o chefe do executivo ou não, gera inelegibilidade, e o Supremo disse que essa norma é constitucional. Então essa nova decisão contraria frontalmente uma decisão anterior do Supremo”, destacou.

Jaylson disse não entender como essa decisão foi tomada sem o devido debate. “É uma posição contraditória, eu não consigo compreender como o STF diante de um assunto tão relevante e importante decidiu desse jeito. Na minha forma de entender, sem maiores discussões, sem maiores debates. Alguns ministros pareciam não entenderam o que estavam votando e não souberam distinguir o que é conta de governo e de gestão. O voto do ministro Luís Roberto Barroso foi um voto didático, excepcional. O Teori Zavascki, da mesma forma, onde deu uma aula sobre o que é conta de governo e de gestão, mas parece que não tiveram essa compreensão e infelizmente estamos com isso. Quem perde não são os Tribunais de Contas, mas o Brasil,  [que está] abrindo portas para o desperdício e a corrupção”, criticou.

Câmaras podem rejeitar análise do TCE

O conselheiro explica que dessa forma o parlamento pode não levar em consideração todas as análises técnicas feitas pelos Tribunais. “Para saber a gravidade do problema, o Tribunal de Contas pode comprovar que o gestor recebeu recurso para construir uma unidade escolar e não realizou a construção, pegou esse dinheiro e depositou na sua conta. O TCE decide então que ele tem que devolver esse recurso e julga como irregular as contas. A Câmara Municipal pode pensar diferente e dizer que o prefeito não vai devolver nada e que as contas não estão irregulares. Imagine que o Tribunal de Contas passa meses seguidos com o seu corpo de engenharia realizando a fiscalização, analisando as planilhas e constata que houve desvio, superfaturamento, e a Câmara Municipal pode simplesmente ignorar essa conclusão do Tribunal, que tem provas, documentos e cálculos realmente realizados”, analisou.

Vereadores não possuem capacidade técnica para julgamento

Outro ponto importante nesse caso, é que o conselheiro acredita que muitos vereadores não possuem capacidade técnica fazer a devida análise dos documentos relacionados à gestão do prefeito.

“É uma responsabilidade muito grande, e as Câmaras não tem estrutura ou conhecimento para tanto. Sem nenhum tipo de preconceito, a Câmara é feita por professores, às vezes por advogados ou médicos, mas é constituído principalmente por pessoas populares, pelo homem do povo, que se tornou uma liderança municipal, que tem legitimidade para julgar o chefe do executivo, mas politicamente não têm condições de analisar cumprimentos de Lei de Responsabilidade Fiscal, realização de obras, cumprimento dos diversos limites da educação, da saúde, com o pessoal do magistério, esses são assuntos árduos complicados e complexos que nós mesmos trabalhamos aqui no Tribunal com dificuldade. Não é uma coisa simples. Como um vereador vai poder analisar essa execução orçamentária? Fica praticamente inviável”, declarou.

  • Foto: Lucas Dias/GP1Tribunal de Contas do PiauíTribunal de Contas do Piauí

TCE deve manter fiscalização

Com essa decisão do STF, Jayson Campelo acredita que os Tribunais de Contas vão ter que se reinventar e vão precisar encontrar uma maneira para continuarem fiscalizando e protegendo a sociedade.

“Nós temos que nos reinventar. Temos que encontrar a melhor saída para a sociedade, não para o tribunal. Para o tribunal poderia ser muito cômodo, pois poderíamos não nos preocupar tanto com tudo que estamos fazendo hoje, pois temos feito um esforço muito grande para se modernizar, investindo em Tecnologia da Informação, no treinamento do seu pessoal, não recebemos mais papéis dos municípios. Já fomos esse ano a 120 municípios e vamos aos 224. O TCE decidiu que não vai julgar nenhuma conta sem ir até ao município. Fiscalização in loco. Tudo isso é um desafio muito grande, é um esforço muito grande que estamos fazendo. Então poderíamos muito bem nos acomodar, mas não pensamos assim. Vamos ter que nos reinventar e descobrir de que maneira vamos atuar para proteger a sociedade”, disse ao GP1.

Encontro com Michel Temer

Ele afirmou que já foi marcada uma audiência com o presidente em exercício Michel Temer (PMDB) para discutir sobre a decisão e apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que possa reverter essa situação. Jaylson Campelo deve participar do encontro que terá a presença de presidentes de vários tribunais.

“Os Tribunais estão se articulando por meio das suas associações. Estamos tentando mobilizar a OAB, as entidades da sociedade civil organizada, inclusive o próprio parlamento, onde temos uma audiência marcada com o presidente Michel Temer para o dia 18, onde estaremos lá, presente, e levaremos uma Proposta de Emenda à Constituição para deixar claro que o ordenador de despesa conforme diz a Constituição Federal deve ser julgado no Tribunal de Contas e não no parlamento. Estamos nos mobilizando para tentar reverter de alguma forma, mas quero deixar claro que a decisão do Supremo é definitiva e não cabe recurso”, finalizou.

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