O Advogado Geral da União (AGU), André Luiz de Almeida Mendonça, conjuntamente com técnicos da Instituição de defesa da União, assinaram parecer jurídico na ADPF 568, nesse 1º de abril, para que os recursos financeiros na ordem de 2,5 bilhões de reais do Fundo suspeito da Lava Jato sejam destinados ao Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN) administrado pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
O teor do parecer vai de encontro ao acordo feito entre a Força-Tarefa da Operação Lava Jato de Curitiba e o governo dos Estados Unidos para ressarcimento dos prejuízos causados a investidores norte-americanos pelos casos de corrupção na Petrobras.
- Foto: Dida Sampaio/Estadão ConteúdoAlexandre de Moraes que ainda vai se manifestar sobre a destinação dos recursos ao Funpen
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), havia atendido no último dia 15 de março ao pedido da Procuradora-Geral da República (PGR), Raquel Ellias Dodge, formulado por meio de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), e suspendera naquela ocasião a homologação do acordo que foi carimbado pela juíza Gabriela Hardt da 13ª Vara da Justiça Federal em Curitiba, entre a força-tarefa da Lava-Jato, a Petrobras e o Departamento de Justiça do Estados Unidos da América.
Raquel Dodge, disse textualmente na petição que iniciou o processo junto ao STF, acerca dos procuradores da República que atuam na Lava Jato de Curitiba: “desviaram-se de suas funções constitucionais ao assumir o compromisso de desenvolver uma atividade de gestão orçamentária e financeira de recursos, por meio de uma fundação de direito privado, em situação absolutamente incompatível com as regras constitucionais e estruturantes da atuação do Ministério Público.”
Na decisão liminar, o ministro do STF, Alexandre de Moraes havia bloqueado valores de aproximadamente 2,5 bilhões de reais, depositados em uma conta judicial vinculada à 13ª Vara da Justiça Federal em Curitiba, que seriam utilizados irregularmente pelos procuradores da República que atuam na Lava Jato de Curitiba, inclusive a movimentação financeira ficaria a cargo de uma fundação de direito privado e da qual faria parte integrantes do Ministério Público nos âmbitos federal e estadual.
No parecer emitido agora dia 1º de abril, a AGU ratifica o entendimento da Chefe da Procuradoria Geral da República, Raquel Dodge e aprofunda ainda mais a discussão para dizer que a competência absoluta para assinar esse tipo de documento com os Estados Unidos é da União por meio da Controladoria Geral do País, jamais por parte do Ministério Público, tampouco da Justiça Federal de Curitiba para homologar tal acordo.
Veja parte dos argumentos da AGU acerca do polêmico caso em que procuradores da República são acusados de irregularidades
“Neste ponto, já é possível identificar que as premissas sobre as quais se baseiam a avença entre o Ministério Público Federal e a Petrobras não correspondem aos termos dos acordos celebrados entre a empresa e as autoridades estadunidenses. Isso porque, independentemente de quaisquer tratativas que tenham sido estabelecidas, não há, nestes ajustes, qualquer menção à necessidade de participação do Ministério Público Federal no processo de internalização da penalidade pecuniária a ser revertida para o Brasil.
Ainda que o Ministério Público Federal houvesse sido designado como uma espécie de articulador especial desse processo, essa atribuição deveria ser conduzida de acordo com as previsões existentes no sistema jurídico nacional para a tutela contra atos de corrupção praticados contra a administração pública. É à luz dos padrões jurídicos do ordenamento brasileiro que se deve indagar sobre: (i) a natureza jurídica da penalidade aplicada; (ii) quem representa o Estado Brasileiro, ou seja, qual é a instituição competente para estabelecer os termos da avença no território nacional; e, consequentemente, (iii) as possíveis destinações da verba. [...].
Portanto, também em razão da ilegitimidade funcional da autoridade ministerial proponente, o acordo homologado pelo juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR se mostra viciado”.
Diferentemente do que foi alegado em manifestações da Petrobrás e dos Procuradores da República que participaram do acordo ora impugnado, não há fundamento normativo algum no sistema jurídico nacional para estipular a afetação de 50% do valor da penalidade arbitrada no exterior ao ressarcimento de acionistas minoritários.
Esse aspecto particular do acordo homologado pela 13ª Vara Federal de Curitiba/PR reflete um direcionamento compensatório que, além de alheio às conclusões do acordo firmado nos Estados Unidos, pode – ele sim – frustrar os objetivos sancionatórios da penalidade pela quebra dos padrões jurídicos anticorrupção do direito americano.
Isso porque, como já frisado, a União não atua no processo de internalização das penalidades aplicadas à Petrobras no exterior por práticas de corrupção como acionista dessa empresa. Ela atua, por meio da Controladoria-Geral da União e Advocacia-Geral da União, como representante do Estado brasileiro dentro do sistema anticorrupção.
Analisando-se detidamente os termos do acordo impugnado, a reserva de 50% do valor a ser pago no Brasil, para a quitação de dívidas oriundas de acordos ou decisões judiciais da Petrobras com seus acionistas, traduz uma provisão em favor da empresa para evitar que, em razão de ulteriores responsabilizações, tenha que indenizar os prejudicados, despendendo mais recursos. Essa cláusula pode representar, assim, uma espécie de vantagem indireta à Petrobras, pois lhe permitirá utilizar parcela de penalidade devida por ilícitos de corrupção – que, portanto, lesam difusamente o Estado e a sociedade –, para quitar dívidas que surgirem em desfavor da companhia nos próximos anos.
Essa disposição do acordo sob invectiva parece desobedecer à vedação, constante no ajuste celebrado nos Estados Unidos, de pretensão de ressarcimento pela Petrobras. Dessa maneira, a reversão dos recursos ao Tesouro Nacional é a solução que melhor reflete a natureza sancionatória da penalidade imposta à Petrobras nos Estados Unidos.
A reserva de valores aos sócios minoritários configura, ademais, verdadeira desnaturação da penalidade imposta nos Estados Unidos. De fato, a título de indenização aos acionistas prejudicados naquele país, a Petrobras já havia feito um acordo em uma class action anterior ao non-prosecution agreement, o que se infere do item (j) deste documento (documento nº 50 do processo eletrônico, fl. 57), in verbis: (j) A Companhia fez um acordo em uma ação coletiva de acionistas, em Petrobras Securities Litigation, No. 14-cv-9662 (S.D.N.Y.), relativa à conduta descrita na Inicial, pelo qual ela acordou em pagar $2.95 bilhões; Resta claro, portanto, que o objetivo primordial do non-prosecution agreement que precedeu o acordo celebrado entre Petrobras e Ministério Público Federal não era indenizar acionistas.
- Foto: Jacinto Teles/Gp1Sede do Ministério da Justiça em Brasília onde Sérgio Moro deve se manifestar
Em outras palavras, a verba objeto da avença não tinha natureza indenizatória, mas sim sancionatória. Dessa constatação decorre a necessidade de internalizar os recursos com respeito às normas que delimitam atribuições e destinação de valores no âmbito do sistema brasileiro anticorrupção.
Além disso, a destinação de recursos recuperados no âmbito de ações de combate à prática de atos ilícitos demanda autorização legislativa e previsão nas ADPF nº 568, Rel. Min. Alexandre de Moraes 31 leis orçamentárias, não se admitindo que possa ser objeto de livre estipulação pelas partes interessadas em acordo de leniência, cujas normas reguladoras não autorizam negociação sobre o destino dos valores envolvidos. Trata-se de domínio jurídico da legalidade estrita.
AGU defende que os recursos sejam destinados ao Fundo Penitenciário Nacional
Todavia, pelas peculiaridades do caso concreto (e da condição estabelecida no acordo formalizado com as autoridades americanas, de não reversão das penalidades pagas à própria Petrobrás), não parece haver empecilho absoluto à consideração da possibilidade de aplicação analógica de uma destinação fundiária dos recursos captados.
No plano contábil, essa providência poderia garantir que os valores internalizados jamais se comunicariam com o orçamento da Petrobrás. E, nesse sentido, a legislação cuja aplicação seria mais pertinente seria a do Fundo Penitenciário Nacional – FUNPEN. [...]
Assim, os recursos incorporados ao território nacional por força do acordo estrangeiro deveriam ser vertidos, em regra, ao Tesouro Nacional, sendo possível, pela excepcionalidade da situação, a destinação ao FUNPEN. [...]
Em todo caso, eventual irresignação com o contingenciamento de recursos do fundo deve ser resolvida dentro da moldura do Estado Democrático de Direito, e não com a criação de soluções próprias, como ocorreu no caso. Recorde-se que, por exemplo, o contingenciamento de recursos do FUNPEN está sob análise desse Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347.
- Foto: Jacinto Teles/Gp1Fabiano Bordignon, diretor geral do Depen que ainda não se manifestou sobre o caso
Essa discussão é muito oportuna e ainda vai render grandes embates até o STF julgar a ADPF 568. Acompanharei todos os seus desdobramentos. Espera-se que a Suprema Corte mande esse dinheiro para ser aplicado para amenizar o caos em que se encontra o Sistema Penitenciário nacional, seria indiscutivelmente a medida mais adequada e sensata.
Antes de concluir esta notícia, solicitei por meio dos conatos oficiais, a opinião tanto do ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro como do diretor geral do Departamento Penitenciário Nacional, delegado federal Fabiano Bordignon.
Confira o Parecer da AGU na íntegra:
*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1
Ver todos os comentários | 0 |