O curso de formação para os próximos policiais penais do Estado do Piauí segue sub judice, mesmo tendo sido convocado de forma ilegal e inconstitucional, como já amplamente comprovado junto ao Poder Judiciário. A Secretaria de Justiça do Estado, juntamente com a Academia de Polícia Penal (Acadepen), manteve sua realização sem as devidas correções, inclusive propostas por este colunista, na condição de especialista na área constitucional e penal penitenciária, já tendo exercido a direção da Academia de Polícia Penal do Piauí.
A importância do Curso de Formação Policial Penal pela Academia de Polícia Penal do Estado do Piauí (Acadepen/PI), instituição reconhecida como Escola de Governo pertencente à estrutura organizacional da Secretaria da Justiça, é fundamental, principalmente pela comprovação da imprescindibilidade do curso ora referenciado para a investidura no cargo de Policial Penal, conforme previsto no próprio Edital do Concurso. E, obviamente, com a formação adequada, tanto na área humanística quanto na operacional, é imprescindível observar toda a legalidade do curso e das fases do concurso para evitar nulidade futura, mesmo que após o término do curso, como no caso do exame psicológico, que adiante tratarei aqui.
Tudo isso aumenta a responsabilidade dos administradores responsáveis pelo Curso de Formação, obrigando-os a realizar todos os atos que precedem o curso com total observância aos requisitos legais e constitucionais para a realização da formação profissional inicial. Pois trata-se de atos da Administração Pública Direta e não de atos de vontade pessoal dos administradores, ou do gestor do sistema prisional, coronel Carlos Augusto, secretário da Sejus/PI.
Com relação à forma como se deu a "seleção" do corpo docente, inquestionavelmente foi "organizada" por atos potencialmente lesivos ao patrimônio público [o Estado está gastando o dinheiro público através de ato ilegal], além de ofender a legalidade e a moralidade administrativa, pelo fato de todos os membros do corpo docente terem sido escolhidos em contrariedade aos princípios legais e constitucionais que regem a Administração Pública, principalmente por ser a Academia de Polícia Penal do Piauí reconhecida legal e constitucionalmente como Escola de Governo.
As pessoas que receberam o comunicado oficial da Sejus/Acadepen para se candidatar às vagas do corpo docente foram tão somente aquelas "eleitas" pelos administradores para ministrar o Curso de Formação Inicial à Polícia Penal. Ora, como as demais pessoas que desejaram participar da seleção não puderam? Inclusive as que não fazem parte das forças de segurança pública? Se qualquer professor habilitado nas disciplinas ofertadas poderia participar e ministrar aulas, como ocorreu em cursos passados. A resposta é simplesmente pelo fato de os administradores da Sejus não quiserem, tanto é que não publicaram a Portaria da "seleção" no Diário Oficial do Estado e tampouco no Site da Sejus. Alegam poder discricionário, mas não há falar em poder discricionário quando existe o limite legal ao qual a autoridade pública se vincula. O policial penal Marcelo Grangeiro é autor de ação judicial no TJPI após seu nome não ter sido contemplado como instrutor da disciplina de teoria e prática de tiro, já que ele (Marcelo) é o único policial penal do Piauí habilitado pela Academia Nacional de Polícia da Polícia Federal e credenciado pela PF do Piauí como instrutor de tiro, já tendo ministrado aulas na Acadepen nos cursos de formação inicial e continuada, mas deixaram-no de fora do atual curso, inexplicavelmente.
Assim foi realizada a tal "seleção" sem a imprescindível legalidade, moralidade, pessoalidade e publicidade, além de outros requisitos do ato administrativo. Portanto, violou de forma absoluta o art. 37 da Constituição da República de 1988, o que, inquestionavelmente, se não for suspenso o CURSO DE FORMAÇÃO INICIAL em andamento trará consequências lesivas ao erário público e prejuízos irreparáveis aos futuros policiais penais do Piauí, porque dificilmente poderão assumir suas funções, considerando que o curso poderá sim ser declarado nulo em momento posterior pelo Poder Judiciário.
Secretaria de Justiça e Acadepen quase extinguiram a totalidade da carga horária das disciplinas de Direitos Humanos e Execução Penal
A atual grade curricular do Curso de Formação da Polícia Penal do Piauí, de forma inexplicável, reduziu absurdamente a carga horária de disciplinas humanísticas, a exemplo de Direitos Humanos e Execução Penal. No curso anterior, essas disciplinas continham 25 horas/aulas, e os próprios alunos, em suas avaliações individualizadas, sugeriram aumentar a carga horária.
Tal postura, além de ser incoerente com as políticas defendidas pelos governos do PT (a nível nacional e estadual), vai de encontro ao que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Roberto Barroso, tem propagado e determinado aos governadores dos estados e do Distrito Federal com relação ao cumprimento do que decidiu a Suprema Corte durante o julgamento do mérito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF Nº 347), que considerou a situação do sistema prisional brasileiro como cruel e degradante por meio da constatação do estado de coisas inconstitucional.
Tanto que, recentemente, o presidente do STF, ministro Barroso, encaminhou ofício ao governador Rafael Fonteles (PT) para apresentar o Plano de Execução para cumprimento da decisão na ADPF 347, que comprovadamente representa a mitigação do estado de coisas inconstitucional no sistema prisional, o que passa necessariamente por políticas de humanização nos estabelecimentos penais.
Os profissionais que vão trabalhar na árdua missão de policial penal não podem receber uma formação apenas com enfoque principal na operacionalidade. Evidentemente, deve ser uma formação que contemple tanto a parte humanística, por ser objetivo da Lei de Execução Penal Nº 7.210/84, que prevê claramente a função de ressocialização do apenado, quanto a função de segurança pública voltada ao sistema prisional, por força da garantia constitucional com o advento da Emenda Constitucional 104/2019, que criou a Polícia Penal no âmbito dos estados, do DF e da União. Portanto, são funções necessariamente compatíveis. A intervenção penitenciária é indiscutivelmente prioridade na grade curricular; todavia, jamais pode se sobrepor às disciplinas humanísticas, até porque não há intervenção prisional cotidianamente, mas o tratamento humanitário é contínuo.
Irrefutavelmente, o governo do Piauí terá que se explicar para o presidente do Conselho Nacional de Justiça, Roberto Barroso, bem como à Suprema Corte de Justiça, considerando o teor da decisão constante do Acórdão da ADPF 347 e o teor da grade curricular atualna formação policial penal, que é drasticamente diferente da grade anterior.
Psicóloga denuncia que NUCEPE descumpriu normas do Conselho Federal de Psicologia e do próprio Edital do Concurso
No que se refere ao concurso da Polícia Penal, a Justiça do Piauí já decidiu que mais 120 candidatos, que foram considerados inaptos no Exame Psicológico realizado pela Banca do NUCEPE, terão direito a nova análise em razão da irregularidade cometida pela Banca. Já existe uma Portaria do secretário da Justiça autorizando uma nova turma no Curso de Formação Inicial à Polícia Penal (CFI-PP), com início previsto para 7 de março do ano em curso.
No entanto, a polêmica continua com relação aos critérios utilizados pela Banca NUCEPE. Nesta semana, a psicóloga Sandra Gomes, especialista em neuropsicologia, contestou o secretário de Segurança Pública, Chico Lucas, que deu uma entrevista alegando um alto número de liminares nos concursos, como o da Polícia Penal, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros. Em relação aos concursos da PM e do CBM, Chico Lucas informou que esse seria o motivo da suspensão dos cursos de formação nas instituições militares, devido à falta de aparato suficiente para acomodar todos os alunos.
Conforme a psicóloga Sandra Gomes, "é preciso ser levado em consideração é que o problema está com a Banca que fez essa "avaliação", a Banca precisa seguir rigorosamente as orientações do Conselho Federal de Psicologia [...] a banca não fez uma 'avaliação psicológica' que é uma das orientações do Conselho e do próprio Edital; a Banca fez uma "testagem" e não uma avaliação... A Banca também não respondeu aos questionamentos dos assistentes técnicos contratados pelos candidatos e também em alguns casos ela (a Banca) fez troca ...de conceitos psicológicos na "avaliação" para justificar a reprovação de alguns candidatos e quando questionada ela (Banca) não coneguiu justificar, declarou a psicóloga Sandra Gomes. Como vai ficar a NUCEPE após essa gravíssima denúncia? Como agirá o Ministério Público do Piauí diante de tal situação?
Salvo melhor ou pior juízo, o que se conclui é que a Justiça agiu dentro do que determina a Constituição da Repúblca de 1988, fundamentando adequadamente (art. 93, IX) suas decisões tanto no 1º Grau (Fazenda Pública) como no 2º Grao (Tribunal de Justiça), por meio dos desembargadores que, em sede de Agravo de Instrumento, mantiveram as decisões do juízo de 1º Grau. Oportunamente irei trazer aqui decisões fundamentadas tanto da 2ª Vara da Fazenda Pública como dos desembargadores do Tribunal de Justiça do Piauí acerca dessa polêmica.
Com relação à Polícia Penal, sobre a qual o secretário de Justiça não suspendeu o curso de formação, é fundamental que o governo se manifeste publicamente para esclarecer como se darão as nomeações pelo governador Rafael Fonteles. Serão dos 200 já anunciados pelo Governo? Ou de todos os que irão se submeter ao Curso de Formação? E se for apenas os 200, quais serão os nomeados? Já que a 2ª Turma a ser formada está amplamente amparada na legalidade e na constitucionalidade das decisões judiciais. É muito importante que o governo também se pronuncie sobre a realização do curso de forma ilegal no procedimento convocatório. Como o governo irá enfrentar tal situação, visando uma solução plausível, caso o curso venha a ser declarado nulo pela Justiça estadual ou nacional?
São situações polêmicas cujos resultados têm enorme repercussão na sociedade, e as autoridades competentes precisam vir a público esclarecer as possíveis soluções. Por outro lado, é importante destacar que existem muito mais vagas na Polícia Penal do que o número anunciado pelo governo do Estado. As 400 vagas, na iminência de serem providas [após as polêmicas criadas pelo próprio governo do Estado], são apenas para suprir aquelas vagas em razão de aposentadorias. E, se considerarmos o novo presídio na região norte do estado, que está prestes a ser concluído com verba do governo Federal (FUNPEN/SENAPPEN), ainda são necessárias, no mínimo, 200 vagas a serem preenchidas. Basta que se faça uma suplementação orçamentária, cuja iniciativa deve partir do Chefe do Executivo estadual para a Assembleia Legislativa do Piauí (ALEPI).
*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1
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