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Ciência e Tecnologia

Macacos, aves e até répteis são os novos reis dos memes na internet

Depois de cães e gatos, outros bichos viram conteúdo divertido nas redes sociais.

Desde os primórdios, cães e gatos são os reis da internet: eles geram memes, vídeos e imagens que variam entre o fofo e o divertido — se você não consome esse tipo de conteúdo, está usando a rede do jeito errado. Com o crescimento de Instagram e TikTokTikTok, porém, a fauna de bichos preferidos da web cresceu. Hoje, macacos, aves e até répteis disputam espaço nos corações de usuários de mídias sociais.

Em especial, são os primatas que têm estado sob os holofotes da internet, com destaque para as espécies macaco-prego e macaco-rhesus. Nossos primos na linha evolutiva têm abastecido a rede com figurinhas de aplicativo, vídeos, GIFs e imagens estáticas engraçadas da mesma maneira que cães e gatos faziam há mais de uma década. A mania é turbinada pelo fato de esses animais serem facilmente antropomorfizados - além dos sorrisos largos, é comum encontrá-los de roupinhas bem ajustadas e brinquedos saídos das lojas infantis.


“Eles são os animais mais parecidos com a gente. Isso traz um carisma a mais, porque, de certo modo, dá pra se identificar com o conteúdo”, conta o artista João Marcos Martins, 22, que utiliza GIFs de primatas nas redes sociais e possui figurinhas de WhatsApp para dar uma animada na comunicação.

O empresário Igor Almeida Lucas, 24, concorda: “As figurinhas costumam ser de cenas hilárias que somente nós, humanos, ou esses animais podemos reproduzir”, diz. Ele coleciona pacotes que somam mais de 80 dessas imagens no WhatsApp.

A mania, claro, tornou alguns desses animais em “celebridades”. Talvez, a mais conhecida delas seja Georgie, um macaco-prego americano de 12 anos que reúne quase 18 milhões de seguidores no TikTok com um carisma de dar inveja em muitos humanos — a morte dele em junho de 2021 (por complicações com anestesia durante procedimento odontológico), causou comoção nas redes.

Já o perfil ucraniano Vet Crew, que tem 249 mil seguidores no Instagram, mostra o dia a dia de Tosya, um macaco-rhesus que tem vivido em meio à guerra no país europeu. A tutora do animal tranquiliza os seguidores, dizendo que o primata passa bem — mas ela frisa que as coisas eram mais fáceis antes da guerra, como garantir alimento para o bicho.

No Brasil, uma dessas celebridades é Davi, famoso no TikTok com o perfil Macaco Capixaba, que tem 153 mil seguidores. O massoterapeuta Rafael Monteiro Cruz, dono do animal, conta que comprou o primata em 2017, a partir de um criadouro em Santa Catarina, respeitando a legislação nacional do Ibama. “Era um sonho de criança ter um macaco”, diz.

Hoje, aos 5 anos de idade, Davi habita em um viveiro de 7 metros de largura por 3 de altura por 4 de comprimento na casa de Cruz, em Serra, no Espírito Santo. Lá, o dono e o animal fazem brincadeiras que logo viralizaram no TikTok.

“Sempre postei conteúdos do Davi na minha página pessoal, e as pessoas falavam para criar uma página só para o macaco”, lembra ele — o perfil no TikTok nasceu em abril de 2021. “Às vezes eu postava coisas sobre mim e os seguidores perguntavam onde estava o Davi.”

Fauna digital

É claro que a internet não vive só de macacos. Ao descer pelo TikTok, é possível encontrar diversos “nichos” da fauna digital, de animais da roça (Josenafazenda, Guridademencia) à vida silvestre (Tiago Jácomo).

Bichos supostamente antipáticos também têm espaço nos algoritmos. Recentemente, tomou conta da internet a história da jiboia arco-íris Sylas: a cobra escapou do terrário em que vivia. A dona do réptil avisou os vizinhos, o que gerou um alerta de pânico em Perdizes, bairro na capital paulista, com a possibilidade de uma cobra (não-peçonhenta) circular pela região. Seis dias depois, foi encontrada dentro do fogão da dona - ele estava não apenas saudável, como já ostentava fama nas redes.

Para o consultor em redes sociais Alexandre Inagaki, a expansão de nichos de bichos “influenciadores” é uma questão de concorrência. “Para se destacar em meio a milhões de perfis de cachorros e gatos, é natural que algum dono de ‘animal diferente’ tentasse transformar seu bicho na nova sensação do universo dos pet influencers”, afirma. “São vídeos que não demandam grandes produções, tampouco análises intelectualizadas. É consumo fast-food.”

Essa é a história de Marcelo, a calopsita de 5 anos da estudante de Direito Jéssica Silva, 25, moradora de Sertãozinho (SP). Quando adotou a ave, ela não tinha pretensão de transformar o pássaro numa celebridade das redes. Porém conteúdos despretensiosos postados em grupos de Facebook logo explodiram. Hoje, Marcelo acumula 2 milhões de seguidores no TikTok e 111 mil no Instagram.

Conforme a fama chegava para a ave, Jéssica notou o interesse de marcas em aparecer nos vídeos do animalzinho — sinal de maturidade para o mercado de “pet influencers”, diz ela. Hoje, por meio de permutas negociadas com as marcas, a estudante consegue bancar os custos de manter seus animais em casa, que incluem a calopsita Dora e um gato de 21 anos. “Eu brinco que esse é o dinheiro deles”, diz. “Nunca imaginei que eu poderia ganhar dinheiro postando fotos do Marcelo na internet”.

Nem tão divertido assim

Apesar do sucesso dos conteúdos, o assunto preocupa especialistas em bem-estar animal. Entre eles, há praticamente consenso de que boa parte das interações entre seres humanos e animais silvestres, como macacos de pequeno porte, sequer deveria existir.

A principal crítica acontece porque esses animais acabam vivendo sozinhos e em ambientes “humanos”, como casas e apartamentos. “Animais silvestres pertencem à natureza e a casa de seres humanos jamais irá conseguir atender às necessidades para que esses bichos possam ter uma vida digna”, afirma João Almeida, biólogo da ONG World Animal Protection.

“É errado achar que cuidar de um macaco no colo, enchê-lo de adereços ou brinquedos e fornecer alimento de maneira facilitada seja tão bom ou melhor do que a vida na natureza”, pontua ele. “Macacos são seres socialmente complexos, que gostam de viver em bando e em liberdade, comunicam-se o tempo todo, têm suas preferências na hora de dormir e comer, além de vários outros fatores.”

Caso um animal seja obtido de maneira legal, com aval do Ibama, há pouca coisa que pode ser feita do ponto de vista jurídico para evitar que um bicho vire celebridade nas redes. “A lei brasileira fala apenas de maus-tratos, o que é quase sempre interpretado como quando o tutor fere, agride ou deixa o animal sem comida”, explica Ivanira Pancheri, professora da disciplina de Direito Animal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

Ela diz que as discussões sobre o tratamento de animais demoram a ter efeitos práticos. “Há toda uma questão de conscientização e sensibilização da sociedade também”, reflete. Ou seja, questões que já eram importantes em relação a gatos e cachorros ganham ainda mais força com os outros bichos da rede.

Cruz, dono do macaco Davi, reforça que o desafio é grande. “Requer muito trabalho, porque ele precisa de espaço e de gastar muita energia”.

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