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Raimundo Nonato da Costa Alencar: o combatente leal, digno, generoso e competente

Artigo do desembargador Edvaldo Pereira de Moura, que é diretor da ESMEPI e professor da UESPI.

Foto: Marcelo Cardoso/GP1Desembargador Edvaldo Moura
Desembargador Edvaldo Moura

Edvaldo Pereira de Moura, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí; Professor da UESPI; Vice-presidente do IMB e COPEDEM

Temos a mesma idade: o colega é de julho, e eu de agosto de 1948. Nasci na primeira capital do Piauí - Oeiras -, e você na aconchegante Teresina. Somos, ambos de famílias simples e pais humildes. Chegamos à Faculdade de Direito, com esforço de quem só tinha um caminho para não ficar à margem na vida: o estudo com bons mestres, mas sem bons livros. Deus sabe com que sacrifício tínhamos acesso pelo menos às obras essenciais ao nosso aprendizado. Somos filhos da esperança e do zelo dos nossos pais, do esforço pessoal e da superação às hostilidades do meio social e econômico em que nascemos. Isso, quando estudar era privilégio que muitos dos nossos parentes e amigos, não conseguiam conquistar.


A Internet, com seu acervo colossal de informações, geralmente em tempo real, não existia. O acesso à nossa velha Salamanca, anualmente, nunca passava das trinta vagas. Hoje, muitos e bons cursos superiores estão em busca até dos poucos interessados. Qualquer pessoa de baixa renda pode oferecer um diploma universitário a seus filhos, desde que não seja na área de medicina, pois só as universidades públicas, com raríssimas vagas, podem disponibilizar uma oportunidade a quem as procura.

Refiro-me a este assunto para lembrar às novas gerações de magistrados, que honram e orgulham os nossos quadros, que a vida deles não imita às nossas, tamanhas foram as dádivas do avanço tecnológico e didático por eles alcançados. Não falamos em questão de mérito ou de inteligência privilegiada, mas no sacrifício para chegarmos onde chegamos e de onde partimos. Se pelo menos isso for relevado em nosso favor, já estaremos satisfeitos e devidamente justiçados.

Não é segredo para os nossos pares que nem sempre tivemos em nossos julgados a mesma opinião, visávamos lapidar o trato daquilo que a sociedade colocava em nossas mãos com o zelo que nos parecia melhor. O colega com seu silêncio interior, seu comedimento criterioso e sua sabedoria beneditina; eu com esse meu jeito apressado de lidar com tudo e com todos. O importante é que jamais nos defrontamos fora daquele gramado, como cidadãos e artesãos do mesmo ofício, esquecendo o mínimo de lisura, de respeito mútuo e afeto de irmãos.

Nem sempre o início de uma atividade humana apresenta-se como uma oportunidade propícia para a exultação da alegria e do contentamento.

É no início e no chão receptivo e generoso em que a semente é fecundada, em momento de esperança e alegria, porque nem sempre ela germina conforme sonhou quem a plantou.

Nasce uma criança, explosão de afetos e alegrias de seus pais, familiares e amigos lhe circundam o berço; pobre em silencioso tugúrio de periferia ou rico e perfumoso, em uma mansão suntuosa. A mesma alegria e a mesma esperança exultam no coração de ambos os pais.

É comum entre nós o ato solene de inaugurar um ambiente ou um espaço, muitas vezes, com pompas e circunstâncias, sendo que tempos depois de uma administração odiosa e medíocre, avistamos o mesmo espaço, outrora iluminado, pleno de flores, sorrisos e cantos, músicas e orações, total ou parcialmente abandonado ou destruído.

Pensando assim e nos direcionando ao objeto deste momento fraterno, voltamos a considerar que um campo bem plantado pode, no tempo da colheita, ser um espaço desfigurado pela destruição de uma seca horrível, e que uma criança mal ou bem-nascida, poderá não sobreviver ou não ser a pessoa esperada para compor uma sociedade moralmente digna.

É neste momento que recorremos à luz sempiterna dos Evangelhos de Cristo, precisamente em Timóteo, onde o Apóstolo Paulo, em seu canto do cisne prenuncia:

"Quanto a mim, estou a ponto de ser imolado e o instante da minha libertação se aproxima. Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. Resta-me agora receber a coroa da justiça, que o Senhor, justo Juiz, me dará naquele dia, e não somente a mim, mas a todos aqueles que guardam com amor a sua Aparição."

Por enquanto, do meu distintíssimo colega, amigo e companheiro, filho afetuoso, esposo exemplar, pai amoroso, ficará no nosso Tribunal de Justiça, o perfume de sua alma generosa e simples exalando o incenso bendito de agradecimento aos antepassados que o inspiraram nesta Corte, nos momentos em que a tristeza, o desencanto, a solidão e a decepção o assediaram. Eles, que serviram de inspiração para que a lei fosse cumprida, sem a mancha da desonra e da vaidade, sem o simulacro da sabedoria e da compaixão para com os inocentes, os pobres e oprimidos.

Quanto ao que o espera lá fora, pode-se afirmar que com a saúde física de atleta, a obstinação de um vascaíno, a calma e a alegria de viver, com o grande círculo de amizade, respeito e consideração, que sempre soube conservar, uma nova vida resplandecerá, um novo sol brilhará, e sobre seus ombros que por tantos anos envergou com honra, decência e generosidade, a sua bela toga de magistrado.

Quanto aos seus familiares, será a comemoração da volta paradoxal à casa daquele que dela nunca partiu. Na distância dos corredores agitados da Casa de Coelho Rodrigues, tenha sempre aquecendo o seu peito amigo e confiável, a lembrança do amplexo sincero dos que durante tantos anos foram cativados pela sua amizade graciosa, silenciosa e verdadeira.

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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