As queimadas na Amazônia entraram no debate do Congresso, mas a preocupação com as florestas não é visível na liberação de verbas para a região. Nos últimos cinco anos, deputados e senadores da Amazônia Legal destinaram apenas 0,001% dos recursos de emendas parlamentares a projetos ligados à gestão ambiental dessa área. Em proporção, trata-se de quantia dez vezes menor do que os colegas do Sudeste repassaram para investimento em projetos do mesmo tipo nos seus Estados. É, ainda, 15 vezes menos do que o dinheiro enviado pela bancada do Nordeste nesta rubrica para seus redutos eleitorais.
Apesar do discurso pela preservação das florestas, há, nos bastidores, uma percepção de que preservar árvores não se traduz em voto, tanto que a rubrica ambiental só recebeu mais verba do que as missões diplomáticas brasileiras no exterior. Do total de R$ 13,1 bilhões em emendas para a Amazônia Legal, R$ 23,9 milhões foram para projetos que tratam da preservação de unidades de conservação, prevenção, controle de incêndios florestais e gestão de biodiversidade que tiveram como destino os nove Estados amazônicos. Na prática, os congressistas preferiram destinar recursos à saúde – uma parte obrigatória – e obras de infraestrutura, mais visíveis e que atendem a demandas de eleitores.
A emenda parlamentar é um dos poucos instrumentos legais que permitem a um deputado ou senador influir diretamente na distribuição de recursos públicos, tanto para Estados e municípios como para instituições. A única exigência é que a metade do dinheiro seja destinada à saúde. O restante pode ser repassado de acordo com conveniências políticas e é comum que emendas sejam usadas como moeda de troca em votações de interesse do Planalto. Além de transferências para saúde e obras de infraestrutura, as áreas de educação e de fomento ao setor agrícola lideram a destinação de verbas.
O valor repassado pelo Congresso para projetos de preservação da Amazônia é quase quatro vezes menor do que os R$ 83 milhões (US$ 20 milhões) oferecidos pelos líderes do G-7 – grupo das maiores economias do mundo. O presidente Jair Bolsonarorecusou a ajuda, considerada por ele “esmola”.
'Agenda positiva' dos partidos inclui PLs e comissões
Na tentativa de construir uma agenda positiva para enfrentar a questão das queimadas, líderes de partidos anunciaram projetos que endurecem as penas por desmatamento e estabelecem bônus para quem preservar áreas nativas em suas propriedades. Os deputados também criaram comissões para acompanhar a crise.
Nada menos do que 55 deputados dividiram a tribuna, na semana passada, para discursar sobre a Amazônia. Desses, 38 foram críticos ao governo e à política ambiental do País. Outros 17 defenderam Bolsonaro. No dia seguinte, 29 deputados e senadores abordaram o tema.
A deputada Perpétua Almeida (PC do B-AC) foi uma das que usaram a tribuna para criticar a política ambiental. “O nosso debate não pode ser um debate de ocasião, na hora em que interessa a Bolsonaro”, afirmou. Nos últimos cinco anos, R$ 16,3 milhões de emendas de Perpétua foram executadas pelo governo. Todas para o setor de infraestrutura e de saúde. “Para desenvolver programa de floresta em pé é preciso de muito recurso. Emendas não dão para isso. Com emenda você resolve um caminhão, um barco.
Governista, o deputado Átila Lins (PSD-AM) destinou, no mesmo período de cinco anos, R$ 77,1 milhões em emendas para obras, desde a construção de estádios de futebol a unidades de saúde. Nenhum recurso para preservação de biomas ou conservação de áreas ambientais. O argumento é o mesmo de sua colega oposicionista: as emendas não são suficientes para atender a essa demanda.
“Quando se discutem queimadas, incêndios, desmatamento da região amazônica, podem observar que o Amazonas sempre está em quarto, quinto lugar. Por quê? Porque a Zona Franca de Manaus tem permitido que o nosso Estado fique preservado, com um nível muito baixo de devastação e de desmatamento. É onde o dinheiro preserva”, disse Lins.
Deputado de primeiro mandato, Marcelo Ramos (PL-AM) tem dois diagnósticos. O primeiro é a falta de políticas estruturadas para meio ambiente na região e o segundo, a baixa demanda local. “Prefeitos e governadores demandam o Congresso por políticas de saúde, educação e infraestrutura. Fica complicado para um parlamentar alocar recursos sem atender a estes pedidos. E a demanda local não traz a questão ambiental como prioridade.”
Diretor da SOS Amazônia, Miguel Scarcello disse lamentar o interesse momentâneo no assunto. “Preservar árvore não dá voto. Espero que o ímpeto parlamentar sobre o tema não suma de novo.”
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