Mais de 100 mil pessoas estão sendo afetadas pelo desabamento de duas pontes ocorrido em um período de dez dias na rodovia federal BR-319, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO). Os acidentes levaram o Governo do Amazonas a declarar situação de emergência em três municípios nesta segunda-feira, 10. São eles: Careiro da Várzea, Careiro Castanho e Manaquiri, todos na região metropolitana da capital.
“Temos uma série de situações que estão acontecendo e dificultando a vida das pessoas, como o escoamento da produção rural, o desabastecimento de alimentos, remédios e combustíveis. Há um risco de que alguns dos municípios possam ficar sem energia elétrica”, disse o governador Wilson Lima (União) durante entrevista coletiva realizada na manhã desta segunda-feira, 10.
A região amazônica vive o período de estiagem até este mês, o que faz com que o transporte por terra se torne a principal opção de mobilidade. Porém, com o desabamento da primeira ponte (KM 25) em 28 de setembro e da segunda (KM 12), no sábado, 8, a situação é considerada problemática por moradores.
A produtora rural Valsineri da costa Peixoto mora no quilômetro 11 da rodovia estadual AM-254 (Manaus – Autazes), ligada à BR-319. Há quatro anos, trabalha com uma granja de sete mil galinhas de postura (produção de ovos). Agora, com o encarecimento dos custos para comprar ração, ela teme não conseguir alimentar todos os animais e já planeja sacrificar cerca de duas mil galinhas.
“Semana passada, quando ainda tinha caído só uma das pontes, tivemos de fretar um barco. A gente teve que se virar e pagamos em torno de R$ 3 mil para a embarcação trazer as 100 sacas de ração, cada uma com 50 quilos, e deixar ali na beira da ponte do quilômetro 12, essa agora que também desabou. Agora, tá sem condições. Já estamos pensando em sacrificar as galinhas mais velhas”, diz a produtora.
Ela conta que o mesmo percurso com os insumos custava em torno de R$ 100 a R$ 200 antes da queda das pontes. “A Secretaria de Produção Rural do município de Autazes mandava um caminhão para vender lá em Manaus o que os produtores daqui forneciam, aí na volta cediam o caminhão para quem quisesse trazer alguma coisa. Era como a gente fazia para pegar as rações”, acrescentou.
Valsineri ressalta a preocupação sentida por ela e o marido, já que a renda da família – composta por mais duas crianças – é totalmente dependente da venda das galinhas. “A gente fornece aqui para Autazes mesmo, mas estamos muito preocupados, Deus nos livre de não conseguir alimentar essas galinhas. Se elas morrerem, vamos fazer o quê?”, questiona.
Abastecimento
A comerciante Osiane Martins vive no distrito Purupuru, no município de Careiro Castanho, e relata a preocupação com a explosão no preço de alimentos e outros itens de necessidade básica. A maioria das compras para abastecer o estoque da mercearia era feita em Manaus, a partir da BR-319.
“Os preços no interior já são maiores normalmente por conta justamente do transporte, mas a gente teve que aumentar ainda mais porque está sem condições. Compramos de uma distribuidora aqui do município que colocou o preço lá em cima esses dias”, afirma a moradora.
Segundo ela, o café em pó, antes R$ 8, agora é vendido a R$ 9. Açúcar, R$ 3,75 antes da queda da ponte, saltou para R$ 4,75 em pouco mais de uma semana. Outros itens tiveram aumentos ainda mais expressivos, como o gás de cozinha, que já era vendido a R$ 120 e agora é encontrado por até R$ 170 no município.
Presidente da Associação de Amigos e Defensores da BR-319, André Marsílio alerta para o risco de o desabastecimento começar a afetar também Manaus e até mesmo Roraima (ligado ao Amazonas pela BR-174), já que ambos os territórios agora estão isolados do restante do país, por terra, após a queda das pontes.
“O risco ocorre porque a maioria dos produtos perecíveis no Amazonas são de fora. Eles vêm pela BR-319 e pela BR-364. O fornecimento vem muito de Rondônia. Agora com os caminhões impossibilitados de realizar esse trajeto até Manaus, o perigo de faltar comida só aumenta”, pontua.
Ação
Moradores do Careiro Castanho e de Autazes criaram um grupo no WhatsApp para marcar um protesto ainda para esta semana. O objetivo dos mais de 200 integrantes é exigir a manutenção da rodovia e a disponibilização de uma balsa que permita à população e aos comerciantes transportarem cargas de uma margem à outra nos rios Curuçá e Autaz Mirim – onde as pontes desabaram.
Atualmente a travessia no Rio Curuçá é feita por duas lanchas da Defesa Civil do Estado. Porém, segundo moradores, quase dois quilômetros antes e depois da ponte estão interditados para carros, obrigando a população a realizar o trajeto a pé. No Rio Autaz Mirim, a travessia também está sendo feita por duas pequenas embarcações cedidas pelo governo estadual.
Em nota divulgada no domingo, 9, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) informou que emitiu autorização emergencial para permitir a atuação de balsas no local em que desabou a ponte sobre o Rio Curuçá. Agora, a licença se estende também para travessia no trecho do desabamento no Rio Autaz Mirim.
“A mesma empresa autorizada emergencialmente também já se prontificou a mobilizar balsas para, dentro de cinco dias, iniciar as operações no trecho interditado sobre o Rio Autaz Mirim, e com isso retomar a ligação da rodovia”, diz o órgão federal. O serviço deve seguir até que as condições de tráfego da BR-319 sejam estabelecidas.
Em nota, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), responsável pela manutenção das rodovias, afirma que técnicos do órgão trabalham para investigar as causas dos desabamentos e no projeto de construção de novas pontes. “O Dnit também monitora a situação das demais estruturas existentes na rodovia”.
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