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*Zé da Cruz
Imagem: Wanessa Gommes/GP1Zé da Cruz(Imagem:Wanessa Gommes/GP1)Zé da Cruz
Tem uma frase do Che Guevara que sigo muito à risca, e que diz: “se você for capaz de se indignar com uma injustiça, então somos companheiros”. Como liderança comunitária não posso me furtar da luta do povo, seja ela de dia ou de noite, faça chuva ou faça sol.

Dia quinze de agosto, por volta das cinco horas da manhã, recebo uma ligação de uma mulher grávida dizendo que estava sendo agredida e que seus pertences tinham sido queimados por um grupo de jagunços armados em uma ocupação nas imediações do Mário Covas próximo a minha residência. Liguei para o comandante da Companhia Independente do Promorar, e avisei da gravidade dos fatos. Sem pensar duas vezes eu e minha companheira nos dirigimos pra lá. Chegando ao local me deparei com uma cena de horror. Eu nunca tinha visto tanta crueldade e malvadeza comandada pelo proprietário da terra e seu o jagunço-mor de alcunha “mão de ferro”. Os dois estavam acompanhados por um bando armado até os dentes que batiam e atiravam nas pessoas sem dó nem piedade. Tentei conversar com eles na intenção de intermediar e acalmar o conflito, mas fui atacado covardemente pelo próprio dono e sua milícia. Foi taca demais. Eu e muitos companheiros e companheiras e inclusive muitas crianças e idosos e gestantes Apanhamos de pau, levemos chutões e eu só não morto pelas graças de Deus e do povo que conseguiu me resgatar das mãos deles antes que me colocassem num L200 vermelha do Coroné da zona sul... O que mais me impressionou nesse ataque foi a participação de policiais militares ajudando a comandar o massacre contra pessoas indefesas. A audácia deles era tanta que atiraram até na imprensa sem medo de nada, nem de mostrar a cara. Quando foram detidos e levados pela polícia saíram dando o dedo pra população.

Depois do ataque fui até a Companhia Independente do Promorar, e mesmo com três viaturas pra se deslocarem, os policiais me negaram ajuda e sequer me prestaram socorro, pelo contrário desdenharam de mim. Um deles até riu da minha aflição. Desnorteado, procurei a Secretaria de Segurança, e depois de um dia quase inteiro, consegui registrar um BO e fazer exame de corpo delito e só.

Acredito que todo Piauí e o Brasil viu a barbárie promovida pelos capangas contratados a peso de cobre, porque são pessoas do povo da pior escória que se vendem por muito pouco pra matar, bater e roubar, pois durante o ataque surrupiaram meu celular. Ao ver aquele ataque minha mente foi bater em Canudos onde as tropas republicanas dizimaram ferozmente a população liderada por Antonio Conselheiro numa verdadeira carnificina promovida pelo governo que devia proteger o povo. As pessoas em Canudos não queriam poder nem dinheiro, nem fama, queriam apenas um pedacinho de terra pra morar em paz, como é caso das mais de três mil pessoas que estão naquela ocupação.

Pelas Sete Estrelas, juro que jamais imaginei presenciar uma cena daquelas em pleno século XXI. O próprio dono da terra, na cara dura, comandar um massacre contra o povo pobre sem dar nenhuma chance de diálogo. O que é mais grave, é que apesar de ter sido formalizada a denúncia contra eles, esses marginais não se sentiram intimidado e continuam rondando minha casa como se fossem muriçocas esperando um momento certo pra me atacar de novo. O povo humilde, pobre, famélico e sem teto que estão nos terrenos do coroné, sofre todo tipo de ameaça, um terrorismo constante. A toda hora o “homi” diz que vai voltar e completar o serviço, mesmo depois de balear quatro e espancar outro bocado.

Penso primeiro em Deus e peço, parafraseando o jornalista Amadeus Campos, “aos homens de bem do Piauí” que tomem providencia com relação a esse crime. Não quero aqui rasgar a Constituição Federal, que assegura o direito a propriedade, muito menos fazer apologia à ocupação de terra, pois apregoaria a desobediência civil que também é crime, mas quero lembrar aos meus leitores que essa mesma Constituição diz que a terra tem que ter uma função social. Olha aí a dubiedade na lei. Mas quem sou eu para interpretá-la? Esse mérito é do judiciário e aqui na terra poder maior que o dele só o poder de Deus, embora alguns se metam a besta querendo estar acima de Deus. Acredito que é aqui que entra aquela mulher com venda nos olhos. Que ao invés da balança ela use a espada. É isso que peço, nem mais nem menos: que se faça justiça.

*Zé da Cruz é poeta e liderança comunitária de Teresina

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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