Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira, 28, colocar no banco dos réus o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), denunciado por divulgar um vídeo sobre o Ato Institucional 5 (AI-5) e criticar integrantes da Corte. Conforme antecipou o Estadão, todos os ministros se manifestaram a favor do recebimento da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), marcando mais uma defesa do Supremo frente a insultos e tentativas de intimidação.
Silveira foi enquadrado pela PGR por grave ameaça (crime tipificado no Código Penal) e incitar a animosidade entre o tribunal e as Forças Armadas – delito previsto na Lei de Segurança Nacional (LSN). A legislação, em vigor no País desde a ditadura, é contestada em cinco ações que tramitam no STF. A Câmara também discute sua revogação.
O Supremo, no entanto, não se debruçou sobre a validade da LSN, e sim concluiu que há indícios de que o parlamentar cometeu o crime previsto na legislação.
“A Constituição não permite a propagação de ideias contrárias ao Estado democrático, nem tampouco realização de manifestação nas redes sociais incitando, por meio de violência, o rompimento do Estado de Direito, a extinção da separação de poderes, o fechamento do Supremo Tribunal Federal. O recado que deve ser dado, claro, por esta Suprema Corte, que tranquiliza e tranquilizará todos os juízes de primeiro grau, é que o Poder Judiciário não aceita intimidações. Não aceita ameaças. O Poder Judiciário continua exercendo, de forma livre, autônoma, imparcial e neutra, a sua função”, disse o relator do caso, Alexandre de Moraes.
“Liberdade de expressão não se confunde com liberdade de agressão. Liberdade de expressão não se confunde com anarquia, desrespeito ao Estado de direito e uma total possibilidade da defesa, por parte de um parlamentar, do fechamento do Congresso e do STF. A Constituição consagra liberdade de expressão, dentro do binômio liberdade com responsabilidade. Aqueles que confundem atentados contra a Constituição, contra a ordem democrática com liberdade de expressão estão fazendo um malefício à liberdade de expressão”, completou Moraes.
A denúncia da PGR foi apresentada logo após o plenário do Supremo confirmar, por unanimidade, a prisão de Silveira, determinada por Moraes um dia antes, na terça-feira de carnaval. O episódio marcou a primeira crise entre o STF e o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL). Em março, Moraes colocou Silveira em prisão domiciliar, com uso de tornozeleira eletrônica. Ele tem acompanhado, de casa, as sessões da Câmara.
“Não se trata aqui de opinião, de ideia, de programa partidário. Se trata de depreciação, violência verbal. Intimidar o seu julgador, ameaçar o seu julgador é e sempre foi uma conduta absolutamente reprovável, independentemente da filiação ideológica do parlamentar”, afirmou o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros.
De acordo com a PGR, em três vídeos recentes, o deputado praticou agressões verbais e graves ameaças contra integrantes da Corte, incitando o emprego de violência e a animosidade entre as Forças Armadas e o STF. A denúncia da PGR se baseia em um vídeo do parlamentar, divulgado em fevereiro, com ataques ao STF, e em outras duas gravações publicadas pelo parlamentar no final do ano passado, intituladas “Na ditadura você é livre, na democracia é preso!” e “Convoquei as Forças Armadas para intervir no STF”.
No vídeo de fevereiro, Silveira afirma que os onze ministros do Supremo “não servem pra porra nenhuma pra esse país”, “não têm caráter, nem escrúpulo nem moral” e deveriam ser destituídos para a nomeação de “onze novos ministros”. A única exceção que é elogiada é o ministro Luiz Fux, a quem o deputado diz respeitar o conhecimento jurídico, mas mesmo o presidente da Corte é incluído nas críticas generalizadas aos integrantes do tribunal, chamados de “ignóbeis”.
“Fachin, um conselho pra você. Vai lá e prende o Villas Bôas (general Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército), rapidão, só pra gente ver um negocinho, se tu não tem coragem. Porque tu não tem culhão pra isso, principalmente o Barroso, que não tem mesmo. Na verdade ele gosta do culhão roxo”, continuou o deputado. “Gilmar Mendes… Barroso, o que é que ele gosta. Culhão roxo. Mas não tem culhão roxo. Fachin, covarde. Gilmar Mendes… (o deputado faz gesto simulando dinheiro) é isso que tu gosta né, Gilmarzão? A gente sabe”, afirmou o parlamentar.
Durante o julgamento, o advogado Jean Cleber Garcia Farias, defensor de Daniel Silveira, reconheceu que o parlamentar cometeu “excessos” nos vídeos, mas criticou o uso da Lei de Segurança Nacional para investigá-lo.
“Não podemos transformar a Corte maior deste País em um gabinete particular para que se use da Constituição para punir seus desafetos. Se houve excessos, e acredito que sim, por parte do deputado, que ele seja punido, mas dentro do que aconteceu, mas não usando uma lei odiosa, que não foi efetivamente recepcionada e está prestes a ser enterrada com uma nova Lei de Segurança Nacional”, afirmou Farias.
Recadinho
No vídeo de fevereiro, o deputado também mencionou o AI-5, o Ato Institucional mais duro instituído pela repressão militar nos anos de chumbo, em 13 de dezembro de 1968, ao revogar direitos fundamentais e delegar ao presidente da República o direito de cassar mandatos de parlamentares, intervir nos municípios e Estados. Também suspendeu quaisquer garantias constitucionais, como o direito a habeas corpus, e instalou a censura nos meios de comunicação. A partir da medida, a repressão do regime militar recrudesceu.
“O AI-5, que é o mais duro de todos como vocês insistem em dizer, aquele que cassou três ministros da Suprema Corte, você lembra? Cassou senadores, deputados federais, estaduais… foi uma depuração. com um recadinho muito claro: se fizer besteirinha, a gente volta”, afirmou Silveira.
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