O Brasil registrou 180 casos de estupro e 720 agressões em contexto de violência doméstica por dia em 2018, segundo dados divulgados nesta terça-feira, 10, pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Os números de estupro são os maiores desde 2009, ano de início da análise após uma alteração na abrangência da lei. Crianças e adolescentes são a maior parte das vítimas.
O anuário do Fórum reúne estatísticas policiais de todos os Estados do País. O relatório mostra que os registros de estupro passaram de 63,1 mil para 66 mil entre 2017 e 2018, crescimento de 4,5%. O maior número de crimes absolutos aconteceu em São Paulo, com 12,8 mil casos. Proporcionalmente, a taxa por 100 mil habitantes é maior no Mato Grosso do Sul (70,4).
Os pesquisadores se debruçaram sobre o perfil da vítima desse tipo de crime: 81,8% são do sexo feminino, 51% são vítimas negras e em 63% dos casos foi configurado estupro de vulnerável, configurado quando praticado contra pessoas menores de 14 anos ou se a vítima não tinha o discernimento necessário para a prática do ato, não podendo oferecer resistência.
Entre as vítimas do sexo feminino, a faixa etária mais comum é de meninas entre 10 e 13 anos (28,6%), mas também é frequente contra pessoas um pouco ainda mais jovens - 5 a 9 anos (16%) - e um pouco mais velhas, 14 e 15 anos (11,8%). Entre as vítimas do sexo masculino, o crime se concentra contra meninos de 5 a 9 anos (27,2%) e de 10 a 13 anos (18,5%).
As estatísticas fez com que o Fórum afirmasse que, a cada hora no País, quatro meninas até 13 anos foram estupradas ao longo de 2018. “As vítimas estão sendo estupradas dentro de casa por alguém que elas conhecem e confiam. Precisamos pensar políticas públicas de enfrentamento a esse enorme desafio, que é vergonhoso do ponto de vista civilizatório, a discussão precisa ser levada para dentro de casa”, disse a diretora executiva do Fórum, Samira Bueno.
Para ela, é necessário desmistificar a concepção que se tem de quem pratica o estupro: temos um pouco a ideia de que o estuprador é alguém que vai aparecer no meio da noite numa rua escura e nos pegar quando sair do metrô. Isso pode acontecer, claro, mas a maior parte dos episódios envolve aquele tio legal, o vizinho bacana. São pessoas absolutamente normais perpetrando esse tipo de violência.”
Quanto à agressão no contexto de violência doméstica, o relatório mostra 263 mil casos em 2018 ante os 252,9 mil casos em 2017. O maior número absoluto desse crime aconteceu em São Paulo, com 50,6 mil registros, e proporcionalmente ele foi mais frequente no Distrito Federal, onde a taxa por 100 mil habitantes a 503,7.
Mafoane Odara, gerente do Instituto Avon, onde desenvolve iniciativas de enfrentamento às violências contra as mulheres e meninas, disse que o assunto tem dois componentes importantes. O primeiro, destacou, é a necessidade de o sistema de Justiça trabalhar com equipes multidisciplinares no momento de investigar e processar os casos. “Todas as outras provas deveriam ser levantadas antes de se chegar na criança. Normalmente, assim como para mulheres, é esperado que a vítima tenha todas as informações organizadas.”
Ela apontou também a necessidade de se discutir o tema apropriadamente com todas as faixas etárias. “Para prevenir, é necessário falar sobre a causa da violência. E temos dificuldade de falar sobre esse tema de forma que as crianças entendam que aquilo que é um desconforto não é natural. Não se pode naturalizar essa violência.”
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