A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de abrir um inquérito para investigar o vazamento e a divulgação de mensagens trocadas entre seus assessores gerou preocupações quanto à possível violação do direito constitucional ao sigilo da fonte, garantido aos jornalistas. A medida pode acabar inibindo o trabalho da imprensa, que publicou as conversas.
O novo inquérito, instaurado nesta semana, busca entender como a mídia obteve acesso às mensagens que, supostamente, revelam que o gabinete de Moraes ordenou informalmente à Justiça Federal a produção de relatórios contra apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro e comentaristas de direita. As conversas indicariam adulteração de documentos, prática de "pesca probatória", abuso de autoridade e possíveis fraudes de provas.
Moraes justifica a investigação afirmando que o vazamento das mensagens é um indicativo de uma possível organização criminosa que visa desestabilizar as instituições republicanas, incluindo o STF e o Congresso Nacional. A pressão por seu impeachment tem crescido no Senado e na sociedade.
Nesta quinta-feira (22), Moraes ordenou à Polícia Federal a apreensão do celular de Eduardo Tagliaferro, ex-assessor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e perito no combate à desinformação eleitoral. As mensagens sugerem que ele elaborava relatórios para subsidiar inquéritos no STF. Em depoimento à PF, Tagliaferro negou ter repassado o material à imprensa. Moraes acredita que as mensagens vazaram do celular do perito.
Moraes argumenta que o vazamento faz parte de uma "organização criminosa" que atenta contra a democracia e o Estado de Direito, pleiteando o fechamento do STF e o retorno da ditadura. Na decisão de busca e apreensão, o ministro cita os crimes de divulgação de segredo e violação do sigilo funcional.
A defesa de Tagliaferro afirma que o celular apreendido em maio não é o mesmo que ele utiliza atualmente, alegando que o aparelho foi descartado por estar defeituoso. Advogados, como André Marsiglia, alertam que o inquérito pode levar à violação do sigilo da fonte e, indiretamente, à investigação de jornalistas. Gabriel Quintão Coimbra, da Comissão de Liberdade de Expressão da OAB, também vê o inquérito como uma tentativa de violar o sigilo da fonte, possivelmente indiciando jornalistas por atos antidemocráticos.
O histórico de Moraes como vítima, acusador e juiz no inquérito das fake news é citado como exemplo de um modus operandi autoritário. A decisão de Moraes é criticada por não esclarecer qual sigilo foi violado e por seguir uma lógica semelhante à de ditaduras que usam slogans vagos para justificar ações repressivas.
O silêncio de entidades de defesa da liberdade de imprensa também foi criticado. Advogados apontam que a proteção ao trabalho jornalístico tem precedentes no STF, como no caso do jornalista Glenn Greenwald, que foi protegido por Gilmar Mendes em 2019 contra tentativas de investigação por ter divulgado mensagens de procuradores da Lava Jato.
Este novo inquérito, no entanto, pode marcar uma escalada no embate entre o Judiciário e a imprensa, com potenciais impactos sobre a liberdade de expressão e a integridade do direito ao sigilo da fonte no Brasil.
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