Era manhã do dia 18 de fevereiro quando o padeiro Antônio Carlos Paiva da Costa foi abordado por policiais militares na frente da casa do seu chefe, na cidade de Fortaleza (CE), durante fiscalizações de rotina. Ao verificar os sistemas de segurança, a equipe da Polícia Militar identificou um mandado de prisão em aberto pelo crime de estupro, e prendeu o cidadão. Ocorre que, segundo o advogado Ramon Néfi Aguiar, Carlos Paiva naquele momento estava sendo alvo de uma injustiça, sendo detido por engano, sem nunca ter praticado qualquer crime em seus 38 anos de vida.
Em entrevista ao GP1, na noite dessa terça-feira (27), o advogado Ramon Néfi, que representa a defesa de Carlos Paiva, explicou que tomou conhecimento da história por meio das redes sociais e decidiu entrar no caso sem cobrar qualquer valor da família, se dirigindo a Teresina para tentar reverter a prisão.
Segundo Ramon Néfi, Carlos Paiva foi confundindo com uma pessoa de mesmo nome, que foi condenada em 2018 pelo crime de estupro na Comarca de Batalha. O real culpado, que possui o mesmo nome de Carlos Paiva, chegou a ficar preso por seis meses, mas conseguiu fugir do sistema prisional, motivo que levou o juiz José Vidal de Freitas – titular da Vara de Execuções Penais à época – a expedir um mandado de recaptura, que acabou sendo cumprido em desfavor de Carlos Paiva.
O advogado afirma que o verdadeiro responsável pelo crime foi devidamente condenado e chegou a ser preso, entretanto, os dados que constavam no processo, desde o início, coincidiam com os de Carlos Paiva, que sequer esteve no Piauí.
“Um rapaz cometeu o crime aqui na cidade de Batalha no Piauí e ele foi preso em flagrante e processado. Não encontraram documentação dessa pessoa e nessa loucura de conseguir identificá-lo, acabaram identificando uma pessoa do Ceará, que nada tinha a ver com o crime”, explicou Ramon Néfi.
Ainda conforme o representante da defesa, ainda não é possível saber em que momento os dados de Carlos Paiva foram inseridos erroneamente no processo. “O juiz daqui, da Vara de Execuções Penais, não tinha como saber que estava se processando a pessoa errada. Então, aqui ninguém está fazendo juízo de valor, dizendo que o juiz está errado, se o juiz está certo. A questão é que houve um erro do Judiciário, não se sabe ao certo onde nasceu esse erro, mas houve um erro de identificação enorme. Fazer uma pessoa responder por um crime sem nunca ter pisado nessa comarca. Não faz sentido uma situação dessa”, disse.
Inconsistências
O advogado apresentou ainda provas de que seu cliente, de fato, não tem qualquer envolvimento com o crime pelo qual foi preso. Embora seus dados constem no mandado de prisão, a data de nascimento que aparece no documento não confere. Enquanto o verdadeiro culpado nasceu em 19 de julho de 1987, a data de nascimento de Carlos Paiva é 16 de fevereiro de 1986. O delegado do 14º Distrito Policial de Fortaleza, para onde Carlos foi conduzido após ser detido, não observou tal inconsistência.
“Inclusive, nesse meio tempo, enquanto a pessoa cometeu o crime e estava presa, o meu cliente estava dando entrada na habilitação dele, fazendo a documentação direitinho, vivendo a vida dele normalmente. É um cidadão que nunca se envolveu em nenhum tipo de crime”, completou Ramon Néfi.
Além disso, as assinaturas de Antônio Carlos e Carlos Paiva são visivelmente diferentes.
Juíza manteve prisão
Durante a audiência de custódia ocorrida no último dia 19, um dia após a prisão, a defesa de Carlos Paiva apresentou provas incontestáveis das discrepâncias, apelando a uma portaria do Tribunal de Justiça do Ceará, que confere ao juiz de custódia a prerrogativa de reavaliar o caso. Entretanto, a decisão da juíza que analisou o caso foi pela manutenção da prisão, mesmo diante das evidências do erro.
Tragédia pessoal
Não bastasse a prisão injusta, Carlos Paiva e a família compartilham de outra grande tragédia. Ano passado, a filha adolescente dele tirou a própria vida, e nessa terça-feira, dia 27, seria seu aniversário, data que ele não pôde passar com os familiares, por estar detido na Unidade Prisional de Triagem e Observação Criminológica, em Aquiraz (CE).
“A filhinha dele mais nova tem quatro anos, eu tenho dado uma atenção maior a esse caso porque imagino o sofrimento dessa família. Tenho uma foto dele preso, você consegue ver a expressão de desespero no rosto dele, expressão por viver uma injustiça desse tamanho. O Estado, que é para proteger, para assegurar sua dignidade, acaba te colocando em uma situação de total desamparo. Além disso, tem o luto, a depressão com a qual ele vem lutando por conta da filha que tirou a própria vida. No aniversário da filha dele, que deveria ser de dezessete anos, ele deveria estar no cemitério com a família para fazer a homenagem e não pôde fazer essa homenagem, porque está preso”, colocou o advogado.
Providências
O advogado Ramon Néfi tem realizado inúmeras diligências a fim de conseguir a imediata soltura de Carlos Paiva. Ao chegar em Teresina, ele conheceu o também advogado Jaylles Fenelon, que tem lhe dado assistência.
Os advogados conseguiram, nesta terça-feira (27), conversar com representantes do Ministério Público do Piauí, no sentido de obterem um parecer favorável a soltura. Nesta quarta (28), devem se reunir com integrantes do Judiciário.
“Estamos dependendo de um parecer favorável do Ministério Público, para que possamos conseguir uma decisão favorável do juiz da Vara de Execuções Penais, reconhecendo a falha do Judiciário, para que a justiça de fato seja feita”, concluiu o advogado.
Outro lado
Procurada, nesta quarta-feira (28), a assessoria de comunicação do Tribunal de Justiça do Piauí informou que verificaria o caso, contudo não houve nenhum retorno até a publicação da matéria. O espaço está aberto para esclarecimentos.
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