O desembargador Edvaldo Pereira de Moura, do Tribunal de Justiça do Piauí, concedeu liminar para suspender processo contra os ex-tabeliães do Cartório Naila Bucar, Lysia Bucar Lopes de Sousa e seus dois irmãos, ex-tabeliães interinos, Antônio Lisboa Lopes de Sousa Filho e Ronaldo Bucar Lopes de Sousa acusados pelo Ministério Público de peculato e formação de quadrilha.
Com a decisão desta terça-feira (06), a audiência de instrução e julgamento que estava prevista para esta quinta-feira (08), foi suspensa.
A defesa alegou que paralelamente à ação coletiva manejada pela ANOREG (Associação dos Notários e Registradores), a acusada Lysia Bucar impetrou Mandado de Segurança individual tendo obtido liminar em 09-12-2010, assegurando-lhe, provisoriamente, a condição de titular do cartório, o que afastava a necessidade de limitação ao teto constitucional para fins de recolhimento.
- Foto: Reprodução/FacebookLysia Bucar
Aduziu que a liminar concedida foi cassada somente em 06 de junho de 2014, quando do julgamento em definitivo do Mandado de Segurança, que reconheceu a sua improcedência.
O impetrante afirmou que em momento algum Lysia Bucar foi notificada acerca de sua interinidade e necessária submissão ao teto constitucional e que era prática do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí notificar os então titulares do cumprimento da decisão, na medida em que as liminares dos Mandados de Segurança impetrados junto ao Supremo Tribunal Federal restavam cassadas, o que não ocorreu no caso em tela.
Ainda segundo a defesa, correições anuais atestaram a regularidade dos trabalhos e a condição de titular da paciente em relação ao 2° Oficio de Notas e Registros de Imóveis da Comarca de Teresina e que foi asseverado o status de titularidade de Lysia, demonstrando a ausência de dolo ou culpa em sua conduta.
Afirma que no Brasil vigora a liberdade contratual, não existindo impedimento para que a tabeliã contratasse com empresa de titularidade de seus irmãos e que tal fato não indica, por si só, o ato de simulação. Afirma que a decisão de receber a denúncia carece de fundamentação.
Por fim, requereu a concessão da ordem, liminarmente, a fim de que a audiência designada para o dia 08 de fevereiro de 2018 não acontecesse, bem como que o juízo se abstenha de praticar qualquer outro ato processual até o julgamento em definitivo da ordem e o trancamento da ação penal de origem.
Na decisão, desembargador destacou que verificou que “existem elementos que indicam que os pacientes agiram dentro dos limites reclamados pela boa-fé e em conformidade ao princípio da confiança, esperando do Estado que agissem igualitariamente e promovessem notificação quando da alteração para o status de interino”.
O magistrado considerou que existem indícios probatórios suficientes para recomentar a suspensão da audiência, que estava designada para esta quinta-feira e de todos os atos processuais futuros na ação penal, até o julgamento do mérito da presente ordem de habeas corpus.
Entenda o caso
De acordo com o MPE, as atividades de Lysia Bucar estavam sendo investigadas desde junho de 2016, através de procedimento de investigação criminal. A comissão de Promotores de Justiça encontrou indícios de três modalidades diferentes de apropriação de taxas judiciais que deveriam integrar o patrimônio público.
- Foto: Lucas Dias/GP1Cartório do 2º Ofício de notas e registro de imóveis
Desde maio de 2015, Lysia Bucar e irmãos não detinham mais a concessão do tabelionato, respondendo pelo cartório apenas como interinos, ou seja, até a nomeação dos aprovados em concurso público para exercício do cargo. Como interinos, teriam o direito de receber remuneração de R$ 30.471,10, mas deveriam repassar o restante do faturamento líquido ao Poder Judiciário, o que não fizeram. O faturamento do cartório no período maio de 2015 a maio de 2016 fora superior a 18 milhões. Após abatidas as despesas comprovadas com os gastos operacionais e os rendimentos da própria tabeliã interina, deveria ter sido recolhido ao FERMOJUPI um valor aproximado de 15 milhões, o que não teria sido feito pela investigada Lysia Bucar.
Também se colheram indícios de que Lysia Bucar e Antônio Lisboa apropriaram-se de depósitos prévios. Tais valores correspondem ao recebimento de dinheiro no ato da entrada do pedido do serviço cartorário. Em caso de desistência e/ou impossibilidade de realização do ato cartorário solicitado, o depósito prévio é devolvido ao cidadão solicitante. Por outro lado, caso seja realizado o ato, o depósito prévio é convertido em emolumentos, ficando sujeito ao pagamento da taxa do FERMOJUPI (10%). A ex-tabeliã deveria manter custodiados os valores recebidos a título de depósito prévio até a realização do ato ou devolução aos cidadãos interessados, o que não ocorreu. Passados mais de dois meses após serem afastados do tabelionato, os investigados não repassaram à atual tabeliã interina os valores correspondentes aos depósitos prévios. Com base em dados encontrados nos livros contáveis do próprio Cartório do 2º Ofício, os investigados teriam se apropriado de mais de 11 milhões de reais de depósitos prévios.
“Os cidadãos que fizeram depósitos ao Cartório do 2º Ofício e não tiveram seus atos cartorários executados ou não receberam seu dinheiro de volta podem procurar a 6ª Promotoria de Justiça Criminal para que se providencie a juntada dos documentos aos autos do processo criminal e assim possibilitar a devolução de tais valores indevidamente apropriados pelos investigados.” - esclarece o Promotor de Justiça Plínio Fontes.
Outra forma de se apropriar de emolumentos que deveriam ser recolhido aos cofres públicos foi a simulação de gastos de custeio, mediante contratos fictícios. Apurou-se que em julho e agosto de 2010 o cartório apresentou como gasto de custeio a ser abatido dos emolumentos que seriam recolhidos ao Poder Público contrato de locação de móveis e computadores, firmado entre o cartório e a empresa Lar Construções. Ocorre que o cartório continuou a registrar em seus livros contábeis gastos com aquisição de bens móveis e material de informática, u seja, lançou duas despesas referentes aos mesmos objetos a serem abatidas dos emolumentos que foram recolhidos ao Poder Público naqueles meses.
Ressalte-se que os próprios investigados disseram que a Lar Construções não locava material de informática para nenhuma empresa, nem mesmo para o Cartório. Tal informação diverge de contrato apresentado nas prestações de contas ao TJ-PI, no qual Antônio Lisboa, como representante da Lar Construções, locava móveis e material de informática para Lysia Bucar, representando o cartório do 2º Ofício. O gasto simulado importou em apropriação indevida superior a R$ 88 mil reais.
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