Líderes da União Europeia estão alertando a Rússia de que qualquer movimentação de seu Exército para dentro Ucrânia terá um grande custo, com novas sanções do principal parceiro comercial de Moscou. As severas mensagens à Rússia, porém, são a parte fácil do jogo.
Muito mais desafiador para os 27 países-membros do bloco europeu é concordar a respeito das potenciais reações econômicas e diplomáticas em retaliação a uma possível ação militar russa na Ucrânia, que perdeu a Crimeia para os russos em 2014 e trava uma guerra de quase oito anos contra separatistas apoiados por Moscou no leste do país. Desde a primavera, a Rússia tem concentrado tropas na fronteira com a Ucrânia de maneira significativa.
Todos os membros da União Europeia têm de concordar a respeito de sanções impostas pelo bloco, mas os membros estão divididos há muito tempo a respeito de como lidar com a Rússia. Países como Polônia e Suécia têm criticado manobras para manter contato diplomático com o presidente russo, Vladimir Putin. França e Alemanha, contudo, negociaram diretamente com Putin. O presidente da Hungria, Viktor Orbán, é com frequência considerado um aliado de Putin.
“É evidente que não podemos ser ingênuos, mas não devemos rejeitar o diálogo de antemão”, afirmou o presidente francês, Emmanuel Macron, no início da manhã da sexta-feira.
Além disso, há a questão do quase pronto gasoduto Nord Stream 2, que levará gás natural da Rússia para a Alemanha evitando as atuais rotas através da Ucrânia. A oposição ao gasoduto é generalizada na Europa, e alguns líderes do bloco europeu argumentam que é contraditório sancionar a Rússia ao mesmo tempo que a União Europeia estabelece acordos comerciais com o país. Mas a Alemanha — um dos mais poderosos membros do bloco — quer o gasoduto, e autoridades da UE ainda não indicaram se consideram o Nord Stream parte de possíveis sanções.
Ainda assim, líderes do bloco europeu parecem estar unidos em torno da necessidade de deixar claro quais seriam as consequências para a Rússia de uma eventual invasão à Ucrânia.
“Qualquer agressão ocasionará um alto custo político e econômico”, afirmou na quinta-feira o chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, antes de uma reunião entre os líderes europeus. O novo chanceler alemão, Olaf Scholz, afirmou que seria um “erro grave acreditar que violar as fronteiras de um país europeu não teria consequências”.
“Estamos convencidos que que a Rússia está realmente preparando uma guerra total contra a Ucrânia”, afirmou o ministro de Relações Exteriores lituano, Gabrielius Landsbergis, acrescentando que “um ataque sem precedentes contra um país que caminha na direção do Ocidente” justificaria uma resposta “sem precedentes”.
A Rússia insiste que não tem planos de enviar tropas para além da fronteira ucraniana. Mas Putin opõe-se firmemente ao aprofundamento dos laços da Ucrânia com o Ocidente e qualificou o sonho ucraniano de adesão à Otan como uma “linha vermelha”.
O governo de Joe Biden alertou que estaria disposto a impor sanções econômicas mais severas contra a Rússia do que as impostas pelos Estados Unidos em 2014 e afirmou que o gasoduto pode ser uma forte moeda de troca nessas negociações.
Autoridades da União Europeia até agora não revelaram detalhes a respeito de qualquer sanção que estejam considerando, mas muitos analistas e diplomatas afirmam que o bloco está mais bem posicionado para adotar medidas duras do que em 2014, após a anexação da Crimeia. Entre as razões: desde 2014, a Ucrânia estreitou suas relações com o Ocidente, criando um consenso mais fervoroso no bloco europeu de que a Ucrânia deve ser protegida da Rússia.
“Acredito que todos nós estamos dispostos a demonstrar com ação, mais do que palavras, qual é o limite”, afirmou na quarta-feira um graduado diplomata europeu, que falou sob condição de anonimato em razão da sensibilidade das deliberações internas do bloco.
“Desta vez, sim”, afirmou Borrell a repórteres na quinta-feira, quando indagado se pensa que os países da União Europeia concordarão em relação a sanções.
Quando a Rússia invadiu a Crimeia, em 2014, a União Europeia respondeu com sanções que tiveram como objetivo principal evitar que 44 empresas e organizações russas, assim como cerca de 200 cidadãos do país, tomassem dinheiro emprestado de bancos europeus. As sanções proibiram essas pessoas de entrar nos países do bloco.
Após sofrer críticas pelas limitadas sanções, a União Europeia intensificou posteriormente a severidade das penalidades, que foram renovadas várias vezes e ainda vigoram.
Os laços econômicos próximos entre a União Europeia e a Rússia possibilitam ao bloco impor ao país sanções potencialmente mais danosas do que os EUA. Mas também significa que as sanções poderiam prejudicar seus próprios cofres.
Edward Hunter Christie, pesquisador-sênior do Instituto Finlandês para Assuntos Internacionais, afirmou que as sanções decorrentes da anexação da Crimeia mal afetaram a indústria energética da Rússia, da qual os europeus dependem.
Ainda assim, o Fundo Monetário Internacional estimou em 2015 que as sanções do Ocidente reduziram o produto interno bruto da Rússia em mais de 1%. Um estudo posterior do FMI determinou que as sanções diminuíram o ritmo de crescimento do país desde então. Essas sanções foram aplicadas aproximadamente na mesma época em que os preços do petróleo despencaram, resultando, por este motivo, em um golpe muito mais duro para a economia russa.
“As [atuais] sanções são fortes o suficiente para se fazer notar, mas não fortes o suficiente para fazê-lo sentir que outros países estão tentando esmagá-lo”, afirmou Christie, que trabalhou como economista de defesa para a Otan em 2014. “E isso foi proposital.”
Francesco Giumelli, professor-associado de relações internacionais da Universidade de Groningen, nos Países Baixos, afirmou que a União Europeia terá de pensar em tipos diferentes de sanções desta vez, o que representa outro potencial desafio. Quando russos foram proibidos de acessar bancos europeus e americanos, muitos deles se voltaram para a China.
Giumelli, cuja pesquisa tem como foco sanções internacionais, alertou que, se a Rússia estiver determinada em invadir a Ucrânia, sanções econômicas, por si só, dificilmente a dissuadiriam.
Até agora, líderes parecem divididos em relação à possibilidade de o gasoduto Nord Stream 2 ser ou não incluído nas sanções.
“É importante manter a política energética fora do conflito”, afirmou a primeira-ministra finlandesa, Sanna Marin, na quinta-feira.
Gwendolyn Sasse, pesquisadora-sênior para o Leste Europeu do instituto de análise e pensamento Carnegie Europe, afirmou que a mais recente crise envolvendo a Rússia dá oportunidade à União Europeia de demonstrar força durante uma crise.
“A urgência é muito maior. A concentração militar é massiva. Nada é secreto”, afirmou Sasse. “O que está em jogo é a capacidade da UE de agir e ser vista como um forte e coerente ator de política externa se algo acontecer.”
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