“Eu sei que Machado de Assis de modo intencional ou não incentivou muitas pessoas negras da sua época e incentiva na nossa geração que é importante que a gente escreva outros gêneros, ele fez romance, drama. Nós podemos falar sobre outros temas que não o racismo, sem deixar que a questão racial esteja centralizada. É nossa função não deixar esquecer o legado e a cor dele. Machado era um homem negro, o mesmo que fundou a Academia Brasileira de Letras”.
É a partir dessa localização que Agatha Aparecida enxerga o escritor carioca. A manutenção de um legado tão importante na história da construção das Letras que, preserva assim a memória que não se esvai das têmporas.
“Imagem vivaz do gênio e do louco: um fita o presente, com todas as suas lágrimas e saudades, outro devassa o futuro com todas as suas auroras” (O Alienista, Machado de Assis).
Com a primeira experiência se iniciando na escola, também com um dos clássicos da Trilogia Realista, Dom Casmurro, entre 13 e 14 anos. No mesmo ano, em 2011, um comercial de televisão em referência aos 150 da Caixa Econômica Federal, apresentou um escrito embranquecido. No imaginário da população, aquela era a forma correta de se perceber alguém tão importante. O vídeo foi retirado dos canais oficiais da instituição, mas ainda pode ser visualizado no YouTube.
“Eu não tinha me questionado antes até ver essa cena, isso perdurou até os 18 anos. Na minha família tem muitos leitores e nós nunca tínhamos falado sobre. Aos 19 anos eu li O Genocídio do Negro Brasileiro (Abdias Nascimento) e aqui eu entendi a perspectiva do apagamento histórico”, relata Agatha.
Entre sua casa, em Belford Roxo, Baixada Fluminense e o trabalho, em Copacabana, Andressa Moura demora 2h para se deslocar. Às 7h40, finalizado o interim e já no hotel em que trabalha, a estudante de Letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro começa sua rotina.
“Mas pode entrar no ânimo do governo eliminar a loucura? Não. E se o governo não a pode eliminar, está ao menos apto para discriminá-la, reconhecê-la? Também não; é matéria de Ciência.” (O Alienista, Machado de Assis)
O caminho é dividido entre música nos fones de ouvido e, quando possível, sempre que há um espaço no metrô, um cochilo pra compensar as poucas horas de sono que restam após as conclusões dos trabalhos da Universidade.
Durante o processo de gentrificação ocorrido no Centro do Rio de Janeiro, entre o fim do século XIX e início do século XX, narrado por Machado de Assis e suas descrições sobre os pormenores do caráter humano, o Bruxo do Cosme Velho atingiu locais inimagináveis.
Futura professora, a preocupação em levar para a sala de aula situações e que a curiosidade e atenção sejam instigadas, Andressa percebe a literatura machadiana como uma porta de entrada para que outras formas de enxergar e retratar a realidade sejam promovidas.
“A importância de ler as obras, de manter sua memória e saber como atrair a atenção dos estudantes na escola, para que se interessem por essa linguagem utilizada por ele à época é um desafio, aí que a didática dos professores é posta à prova”, disse a estudante. “É também uma forma de conhecer nosso passado a partir dos fragmentos do século XX que ele nos transporta e demonstra as questões sociais que ele visualizava durante sua vida”, conclui Andressa.
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