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Ciência e Tecnologia

Indústria revê mapa da produção de chips para enfrentar escassez

Os chips são essenciais a produtos que vão de brinquedos e rádios a pilha até supercomputadores e carros.

A pandemia e a guerra entre Rússia e Ucrânia estão forçando um rearranjo na cadeia global de produção de semicondutores. O item se tornou símbolo das dificuldades de uma economia globalizada que tem a maior parte de sua fabricação concentrada na Ásia. Os chips são essenciais a produtos que vão de brinquedos e rádios a pilha até supercomputadores e carros autônomos.

Após uma onda de fechamento de fábricas por falta de componentes, especialmente na indústria automotiva, vários governos, como o dos Estados Unidos e os da União Europeia, abriram seus cofres para atrair novas fábricas ou ampliar as já existentes. O governo americano espera aprovação do Senado de US$ 52 bilhões para essa finalidade. A UE já liberou US$ 45 bilhões.


O problema de escassez persiste e deve se estender até 2024 ou 2025, ainda que em menor grau.

Para este ano e o próximo estão programadas inaugurações de 29 fábricas. Os investimentos dessa leva de empresas somam cerca de R$ 140 bilhões, segundo cálculos da Semi, associação global de fabricantes de eletrônicos.

A maioria delas será instalada na própria Ásia – oito em Taiwan, oito na China e duas na Coreia do Sul. Os três países já concentram cerca de 80% da produção mundial, mas especialistas esperam que o movimento de desconcentração altere esse mapa.

Outros grandes destinos são EUA e Alemanha. “As indústrias vão continuar dependentes da Ásia, mas com novas capacidades indo também para outras regiões”, avalia Carlos Libera, sócio da consultoria Bain & Company. “Pelo menos uma parte da demanda vai ser suprida pelas fábricas que estão surgindo nos outros países, até por uma questão de segurança.”

A Intel, uma das gigantes no setor, anunciou este ano duas novas fábricas nos EUA e uma na Alemanha. Carlos Augusto Buarque, diretor de marketing da Intel Brasil, explica que a intenção do grupo é diversificar sua cadeia de suprimentos. “Nosso objetivo é um equilíbrio de 50% da oferta nas Américas e na Europa e os outros 50% na Ásia até 2030.”

Até o Brasil, onde a atividade ligada a semicondutores é limitada à fase final de montagem, chamada de encapsulamento, decidiu participar do movimento, após vários encontros com representantes de setores como automotivo e eletroeletrônicos.

O Ministério da Economia promete apresentar neste mês ou início do próximo um programa que deve conter medidas como a desoneração da cadeia de produção de semicondutores, apoio à pesquisa e desenvolvimento, formação e capacitação de profissionais e facilitação de importações. O setor tem hoje cerca de 20 empresas, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Semicondutores (Abisemi).

Corrida global

A ampliação da capacidade de produção de semicondutores já estava nos planos das grandes corporações em razão da superdemanda por chips que virá da tecnologia 5G, dos carros elétricos e autônomos, da internet das coisas e da inteligência artificial. “Os sensores serão o grande vetor de crescimento da indústria mundial”, diz Márcio Kanamaru, sócio líder de Tecnologia, Mídia e Telecomunicações da KPMG no Brasil.

Relatório de mercado feito pela Semi, associação global de fabricantes de eletrônicos, cita que 86 novas fábricas ou expansões de plantas já ativas foram anunciadas para o período de 2020 a 2024. Muitos desses projetos e outros novos anunciados durante a pandemia estão sendo executados antes do que era imaginado, afirma Kanamaru.

Das plantas que já iniciaram atividades – como a da Bosch na Alemanha, em 2021 – e daquelas que estão em construção, 15 ficarão em Taiwan, 14 na China, nove na Europa, oito nas Américas, sete na Coreia do Sul, seis no Japão e pelo menos uma na Índia.

Uma fábrica leva em média dois anos para ficar pronta. Alguns grupos ainda não anunciaram os locais das novas unidades. A pandemia antecipou vários dos projetos. Segundo a Semi, essas novas plantas devem ampliar a capacidade produtiva atual em 20% a 40%.

De acordo com Kanamaru, a expectativa dos executivos do setor de semicondutores é de que em oito a dez anos a indústria dobre sua capacidade de produção global, com mais fábricas ou aumento de produtividade. “Esse aumento é fundamental para nutrir as novas demandas por digitalização do planeta”, diz.

Não há dados disponíveis sobre a capacidade instalada para semicondutores, mas para a etapa produtiva chamada de foundry (fundição) – quando são feitas as “bolachas” de silício (wafers) que depois são processadas e cortadas em vários dispositivos –, o aumento deve ser de 43%. Estudo da Bain & Company mostra que passarão de 90 milhões de unidades por ano em 2021 para 129 milhões em 2025.

Com receita de US$ 595 bilhões no ano passado, o setor projeta alcançar US$ 1 trilhão em 2030. Hoje os semicondutores são o quarto produto mais comercializado no mundo, atrás de óleo cru, veículos e peças e óleo refinado. Um automóvel moderno, por exemplo, tem até 1,5 mil semicondutores, informa a KPMG. Um carro elétrico terá por volta de 3 mil, diz um executivo da Ford.

O próprio lar está sendo um grande consumidor. “Todos os eletrodomésticos, geladeiras e micro-ondas com inteligência, sensores para controle de temperatura, acionamento de portas, sistemas de segurança e de vigilância representam um consumo muito grande e vai crescer mais”, prevê Kanamaru.

Complexo

Com nove fábricas nos EUA, Costa Rica, Irlanda, Israel, China, Vietnã e Malásia, a americana Intel vai investir US$ 38,2 bilhões nas três novas unidades previstas para entrar em operação em 2025. As duas plantas americanas vão dar origem a um complexo que futuramente poderá abrigar até oito fábricas, tornando-se um dos maiores locais de produção de semicondutores do mundo.

Outros US$ 20 bilhões estão sendo gastos em duas novas operações no complexo do Arizona, para início de atividades em 2024. O grupo também reservou US$ 600 mil para ampliar, nos próximos três anos, a produção a fábrica da Costa Rica, unidade que a Intel negociou com o Brasil em meados dos anos 90, mas acabou escolhendo o outro país da região.

A Bosch inaugurou sua segunda fábrica de semicondutores na cidade alemã de Dresden em julho passado, com investimento de US$ 1,07 bilhão, o maior valor gasto em um único projeto na história da empresa. Em outubro, o grupo anunciou mais US$ 428 milhões para ampliação dessa unidade e da mais antiga, em Reutlingen. Além disso, está construindo um centro de testes na Malásia.

A coreana Samsung também informou recentemente que vai construir uma nova fábrica de semicondutores no Texas (EUA), plano estimado em US$ 17 bilhões. Outro que vai ampliar atuação no mercado americano é a TSMC, grupo de Taiwan considerado o maior do mundo em produção terceirizada. A empresa pretende gastar US$ 12 bilhões em uma planta no Arizona e tem vários outros projetos, em especial na Ásia.

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