Após um ano marcado por embates entre representantes do Judiciário e do Legislativo, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), definiu como uma das prioridades de 2020 votar proposta que muda a forma de escolha de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e limita a dez anos seus mandatos, hoje vitalícios.
A medida é vista no meio jurídico como uma forma de reduzir o poder de integrantes da Corte, pois eles ficariam menos tempo na cadeira. Já apoiadores de Jair Bolsonaro veem uma tentativa de esvaziar as atribuições do presidente e dificultar uma eventual indicação do ministro da Justiça, Sérgio Moro, ao tribunal.
O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), afirmou que as bancadas da Casa vão discutir a proposta. Ele evitou, no entanto, se manifestar sobre a medida. "Estou falando das prioridades do governo. O que o governo quer é botar o País para voltar a crescer e gerar emprego. Essa é a prioridade do governo", disse Bezerra após sessão de reabertura do ano legislativo. "Esse tema será apreciado no colégio de líderes do Senado. Não tivemos nenhuma reunião, não tenho como opinar."
A mudança na escolha dos membros do STF está prevista em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) em discussão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. O texto, apresentado pelo senador Lasier Martins (Podemos-RS) em 2015, obriga o presidente a indicar os integrantes da Corte dentro de uma lista tríplice. Neste modelo, uma comissão formada por sete instituições, entre elas o próprio Supremo e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), faria a lista.
O formato é semelhante ao adotado em alguns países da Europa, como Portugal, onde ministros têm mandatos de nove anos e, de um total de 13, três são escolhidos pela própria Corte. Hoje, no Brasil, o presidente da República é livre para escolher qualquer pessoa, desde que tenha “notável saber jurídico e reputação ilibada”. O Senado precisa dar aval ao nome indicado após sabatina. Até o fim do mandato, em 2022, Bolsonaro poderá fazer duas indicações. Caso seja reeleito, mais duas.
No início do ano, a proposta chegou a ser alvo de bolsonaristas nas redes sociais, que viram na iniciativa uma retaliação a Moro. Na avaliação de aliados do ministro, ele dificilmente figuraria na lista tríplice. Após a enxurrada de críticas, senadores admitem alterar a PEC para prever que a medida, caso aprovada, só valha a partir de 2023.
Lista. A PEC foi incluída como nono item de uma lista de dez prioridades para 2020 divulgada nesta segunda-feira, 3, pelo Congresso em razão do início do ano legislativo. No topo estão as reformas econômicas, como a que muda o sistema de tributação e a que reformula carreiras de servidores.
A presidente da CCJ, senadora Simone Tebet (MDB-MS), afirmou que só pautará a PEC após aprovar medidas econômicas. “Não posso ser irresponsável de colocar na frente das PEC econômicas, concordando com elas ou não, qualquer projeto polêmico”, disse a senadora.
Nos bastidores, parlamentares viram a inclusão da proposta sobre o STF como uma sinalização de Alcolumbre para diminuir as pressões que enfrenta ao não pautar assuntos que gerem conflitos com o Judiciário. “A nona colocação é estratégia para não tratar neste ano. Mas vamos cobrar”, disse Martins. “Foi para diminuir pressão e aumentar cacife perante o Supremo”, afirmou o senador Plínio Valério (PSDB-AM), autor de outra PEC sobre o tema.
No ano passado, Alcolumbre enterrou duas tentativas de senadores de criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com foco na atuação de ministros do Supremo, a CPI da Lava Toga. A justificativa era o que os parlamentares chamam de “ativismo judicial”, como decisões para anular ou alterar projetos aprovados pelo Congresso. O presidente do Senado também não levou adiante pedidos de impeachment de ministros da Corte.
A inclusão da PEC na lista de prioridades, porém, ocorre após o ministro Luiz Fux suspender a criação do juiz de garantias, aprovado no fim do ano passado. A decisão foi vista por parlamentares, incluindo o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), como uma afronta ao Legislativo.
Em discurso na cerimônia de abertura do ano legislativo no Congresso, o presidente do Supremo, Dias Toffoli, adotou um tom de conciliação entre os Poderes. Segundo o ministro, não cabe ao Judiciário “ter desejos”. O ministro voltou a afirmar que o “Legislativo cuida do futuro, o Executivo, do presente, e o Judiciário, de conflitos do passado”.
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