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Edvaldo Pereira de Moura: características essenciais do magistrado

Artigo do desembargador Edvaldo Pereira de Moura, que é diretor da ESMEPI e professor da UESPI.

Foto: Lucas Dias/GP1Desembargador Edvaldo Moura
Desembargador Edvaldo Moura

Desembargador Edvaldo Pereira de Moura,

Diretor da Escola Superior da Magistratura do Piauí (Esmepi) e professor da UESPI


Pedro Maciel Vidigal, escritor mineiro, muito famoso como memorialista e pensador erudito, em 1981 publicou, em Belo Horizonte, um livro magistral denominado: Retratos Literários.

É com ele que vamos refrescar a mente dos que se dispuserem a ler este singelo artigo, quanto à autenticidade e crueza de certos postulados, que também acentuam as características essenciais do magistrado, em qualquer tempo e lugar.

A Justiça implica certa igualdade, como o seu próprio nome estar a indicar. Vulgarmente, se diz que só se ajustam as coisas que se igualam. É o que ensina Thomas de Aquino em sua Summa Theológica.

De fato, a Justiça não é só uma constante e perpétua vontade de dar a cada um o que é seu, como defende o jurisconsulto Ulpiano. Ela consiste, também, em não tirar de quem quer que seja, o que efetivamente lhe pertence.

O Papa Pio II costumava dizer que as leis sempre falavam severamente com os pobres e pequenos, mas ficavam silentes diante dos ricos e poderosos. Laércio conta em seu livro, De Vita Et Moribus Philosophorum, que Solon ao ser perguntado sobre o que eram as leis, respondeu, sem titubiar: As leis são teias de aranha, que prendem as frágeis e inofensivas moscas, mas não conseguem segurar em suas malhas os animais avantajados, que as rompem facilmente.

Santo Ambrósio adverte: Aquele que, por ato de ofício, julga os seus semelhantes, deve resplandecer na inteireza, na gravidade e nas belas e peregrinas virtudes, de tal maneira que a si mesmo se dê por espelho, para o mais edificante e exigível exemplo, que deve ser exigido de todos os que fazem a Justiça. A utilidade pública é o norte para onde sempre devem dirigir-se as ações dos bons julgadores. Bem praticada, a Justiça se apresenta como o perfeito molde de todos os acertos, pois sem a sua adequada e correta aplicação, o mundo seria inabitável, porque a força reinaria, a verdade se acovardaria, a mentira se faria atrevida, a razão andaria presa, os bons viveriam oprimidos e os maus se beneficiariam de tão insustentável situação. Se desaparece a Justiça, já não vale a pena que os homens vivam sobre a terra, segundo pontifica Kant.

O magistrado nunca poderá se esquecer de que é um ser humano, dotado de razão e de alma.  E ainda: em tudo o mais, todos somos irmãos, unidos pelo dever fraterno, recomendado pelo Redentor de Nazaré: Amai-vos uns aos outros, tanto quanto eu vos amei. É que a Justiça sem generosidade, sem amor, sem condolências, é menos inteligente e inumana do que as máquinas de que nos utilizamos para materializá-la.

O julgador pode ter as suas amizades, desde que sadias, só não deve admitir que elas cheguem à porta dos fórun. Quando se diz que a solução deste ou daquele caso, depende do arbítrio do juiz, quase sempre se ignora que a palavra arbítrio não significa disposição pendente do afeto, mas pautada pela razão e pelo juízo. Tal significação vem do verbo latino arbitror, de que deriva a palavra arbítrio, ato de entendimento e não de vontade.

Ao juiz não se deve permitir que receba qualquer dádiva, porque, na quase totalidade dos casos, ela não é oferecida por amizade, mas para corromper e para infamar quem a recebe.

A história antiga revela que eram cortadas as mãos dos juízes ambiciosos, que recebiam presentes para que as suas sentenças fossem contra a Justiça. E, quando com esse drástico remédio, não era possível extinguir o mal, eles eram punidos de maneira mais violenta, mais rigorosa.

A impunidade das maldades, multiplica os malfeitores. De Platão vêm estas memoráveis palavras: Importa muito dar a morte ao juiz a quem se provar suborno. Antes dele, o Rei Dario havia mandado enforcar o corrupto juiz Sandoce. Um dos Imperadores do Japão determinou que se queimasse vivo um juiz venal e degolar quem o havia subornado. Justiniano queria que os juízes venais fossem publicamente açoitados. E o Rei Cambises mandou encourar, com a pele do juiz venal Sinsanes a cadeira que ele ocupava no Tribunal e, para substituí-lo, nomeou seu filho Otanes, a fim de que ele julgasse, sentado nela.

Nunca será bastante repetir que, quanto mais se levantam os homens nas dignidades, tanto mais devem crescer nos bons exemplos. É obrigação do bom juiz brilhar nas virtudes sobre todos os seus jurisdicionados e ser visto como excelente modelo, digno de ser imitado, por seu louvado procedimento. Felizes as Comarcas em que os juízes vivem como servos e não como senhores a lei, pois magistrados que se colocam fora e acima das leis põem o povo no caminho da perdição.

Deveras interessante aquela advertência que se lê no Versículo 6 do Capítulo 7, do Eclesiástico: Não procures tornar-te juiz, se não fores bastante forte para destruir a iniquidade.

Concluindo, impõe que ressaltemos as qualidades que devem ornamentar aqueles que fazem uso da toga sagrada para julgar e fazer justiça: a lealdade, a discrição e a fraternidade.

Cada um deve ser parte da fortaleza dos atos de cada um, pois cada um responderá por si, no certo e no errado. Eis a regra ontológica, em cuja essência moram as bases desta ciência, desta arte e desta religião, que se chama Justiça. Que vivamos em paz, sob o norte da seriedade, da honradez, da coragem cívica e da verticalidade moral e funcional.

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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