Quando o soldado basco José Moreno foi capturado em 1937 durante a Guerra Civil Espanhola, ele foi condenado à morte por um dos comandantes do exército do general Francisco Franco, que acabaria vencendo o conflito. Por razões que ele diz jamais ter compreendido, foi poupado desse destino. Celebrou seu centésimo aniversário em novembro.
“Eu deveria ter morrido naquela época, mas aqui estou, sentindo-me bem o bastante para lembrar de tudo que passei", disse Moreno, com um sorriso largo. “Ainda não sei ao certo por que não fui morto ali indo parar na prisão, e por isso é difícil acreditar que consegui viver por tanto tempo.”
- Foto: The New York TimesJosé Moreno
Agora, Moreno descreve a si mesmo orgulhosamente como “o último gudari", palavras que significa 'soldado' no idioma basco. Trata-se de uma referência àqueles que entraram para o exército basco autônomo em 1936 para ajudar a defender o governo da Espanha contra o levante militar de Franco. Um ano mais tarde, as tropas de Franco capturaram Bilbao, a maior cidade basca, com a ajuda de seus aliados fascistas da Alemanha e Itália.
Moreno se rendeu a soldados italianos, que então o entregaram às forças de Franco. Um comandante espanhol anunciou que ele seria fuzilado, disse Moreno, mas a sentença de morte foi substituída, e ele permaneceu na prisão por três anos. Após o fim da guerra, em 1939, Moreno passou algum tempo num campo de trabalho, pavimentando estradas com outros prisioneiros do seu batalhão basco capturado.
Quando Moreno foi libertado do campo de trabalho, tentou voltar para a marinha mercante, na qual se alistara aos 14 anos, antes da guerra. Foi então, diz ele, quando seu cargueiro transportando carvão atracou nos portos italianos, que ele descobriu “a feiura do fascismo". “Vi muitas pessoas com medo, miseráveis, e até passando fome".
Classificado pelo governo Franco como “separatista vermelho”, Moreno teve negado o direito de voltar ao mar, e teve de aceitar um emprego nos estaleiros de Bilbao. Aposentou-se há mais de 30 anos, participando da liderança de um dos sindicatos locais. “Franco não perdoava e, por isso, não nos peça agora que perdoemos nem esqueçamos", disse ele.
Todos os anos, em junho, Moreno discursa num evento em homenagem aos soldados bascos que resistiram a Franco num monumento no Monte Artxanda, com vista para Bilbao. Ele estava entre os que defenderam a construção do monumento, que parece em parte uma imensa impressão digital. A indelével impressão digital serve como lembrete “para que nunca percamos de vista a lembrança daqueles que lutaram pela democracia", disse Moreno em entrevista durante a qual ele usava uma boina basca e o sobretudo militar, com insígnias presas à lapela.
Moreno agora divide um apartamento com a filha, Manuela, em Portugalete, subúrbio de Bilbao, perto dos estaleiros onde trabalhava. Indagada a respeito do segredo da saúde do pai, a filha de Moreno brincou referindo-se à “inquietação e mau-humor” do pai. “Ele gosta de comer bem e se divertir".
Até recentemente, Moreno fazia parte de um grupo de dançarinos bascos. Para ele, a paixão pela dança está ligada à guerra civil, pois ficou sabendo do levante militar de Franco em julho de 1936 quando estava dançando. “Eu tinha 17 anos, estava pensando em qual garota convidar para dançar, mas sabia que se tratava de algo muito importante, e fui voluntário", disse.
Hoje, os únicos passos de Moreno são no corredor do seu apartamento. A filha disse esperar que o pai possa participar da cerimônia no monumento de Artxanda em junho, mais um motivo para mantê-lo em casa por enquanto. “Não queremos que ele corra riscos de saúde passeando durante o inverno", disse ela.
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