O prefeito de Manaus, David Almeida, culpou nesta quinta-feira, 14, o isolamento do Estado pela crise de abastecimento de oxigênio para atendimento das vítimas da covid-19. Enfrentando uma segunda onda, com a presença de uma nova cepa da doença, a P1, detectada por cientistas do Instituto de Medicina Tropical da USP, a cidade registra aumento de casos de mortes por covid-19 no sistema hospitalar lotado e há registros de pessoas que estão morrendo em casa sem conseguir atendimento dos respiradores artificiais nos hospitais
“Vocês precisam entender por que Manaus sofre. É que Manaus é cidade-Estado. Nós temos mais da metade da população do Estado morando em Manaus. Todas as UTIs do Estado estão em Manaus”, afirmou o prefeito em entrevista ao Estadão, argumentando que a cidade recebe pacientes de 62 municípios e que o isolamento geográfico da região afeta a chegada dos tubos de oxigênio necessários no sistema de saúde. Almeida já foi infectado pela covid-19 em setembro e perdeu a mãe, de 84 anos, depois de 29 dias de internação por causa da doença.
“Nós estamos passando a tragédia em relação ao oxigênio por um problema de logística. De Belém para Manaus é 1.500 quilômetros, sete dias de barco. Ou, para Porto Velho, seis ou sete dias também”, explicou Almeida. “Agora, vou pedir para que você que grave e publique isso: o Amazonas é o Estado mais preservado do Brasil e talvez do mundo. Temos 97% da floresta preservada. Somos o exemplo para o mundo, mas estamos sendo penalizados por isso”, disse o prefeito de Manaus.
Almeida alegou que o abastecimento da região depende do asfaltamento de um trecho de 400 quilômetros da estrada BR-319 para Porto Velho, obra que não foi feita. “No inverno, aquele trecho de terra fica intransitável”, explicou. A obra ajudaria a romper o isolamento regional e facilitaria o abastecimento, defendeu. “E aquela área da estrada nem é apropriada para agricultura”, reclamou.
“A preservação, que deveria servir a nosso favor, está contra nós”, criticou Almeida. “Tem gente que devasta em seus países e vem fazer aqui lobby contra a nossa estrada, a BR-319, que liga a Porto Velho. Isso causa o nosso isolamento. Esse isolamento em parte contribui para essa tragédia da covid”, disse.
Ele reclama que ambientalistas protestam contra desmatamento, mas quando o Amazonas precisa de ajuda humanitária, ninguém dos ambientalistas dá atenção. “Nós aqui sabemos preservar a floresta”, disse. “Mas quando nosso povo, o povo que preserva a floresta, está precisando, ninguém aparece para ajudar”. afirmou.
Segundo Almeida, há dois dias ele já previa a tragédia da falta do oxigênio. O prefeito declarou que a necessidade do Estado na segunda-feira era de 55 mil metros cúbicos de oxigênio por dia. “Hoje, quinta-feira, é de 76 mil metros cúbicos por dia. No auge da pandemia, a maior necessidade era de 30 mil metros cúbicos”, explicou. Almeida ressaltou que os tubos de oxigênio não podem ser transportados em avião de carga normal - precisam de avião que voa em baixa altitude, como os aparelhos da Força Aérea.
Ele afirma que ainda não há evidências científicas sobre a nova variante, mas acredita que ela seja bem mais contagiosa. “É um vírus muito agressivo”, disse. Para ele, houve relaxamento na prevenção em dezembro, época das festas, e agora a cidade está vendo o agravamento no quadro da doença.
O governo do Estado chegou a decretar o lockdown no fim do ano, mas recuou da medida após manifestações de comerciantes. A Justiça, então, determinou a vigência das medidas restritivas no Estado.
Segundo o prefeito, que assumiu o cargo há duas semanas e acompanha tudo de um Centro de Cooperação da Cidade (CCC), o atendimento de saúde da prefeitura não sofre falta de oxigênio. “Eu fiz a previsão disso, falei que ia acontecer, já na segunda-feira”, disse. “Os meus abrigos de idosos, asilos, todos estão abastecidos”, afirmou.
A Prefeitura não tem hospital público, só unidades básicas de saúde (UBSs), que são 247 unidades, explicou Almeida. O problema maior, segundo Almeida, está concentrado nas unidades hospitalares do Estado, encarregado das média e alta complexidade de atendimento.
"Nós estamos recomendando que a população procure atendimento nas UBSs logo nos primeiros sintomas, para evitar o impacto no sistema que atende os pacientes mais graves”, orientou. “É uma doença devastadora”, afirmou Almeida.
“O nome disso é assassinato”, diz ex-prefeito de Manaus
O ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio Neto (PSDB) culpou o governador Wilson Lima (PSC) pelas mortes provocadas por falta de oxigênio em hospitais e defendeu processo de impeachment contra ele, em vídeo publicado em redes sociais. Na declaração, feita nesta quinta-feira, 24, também chama a situação de "assassinato à la Hitler".
Segundo Virgílio Neto, ao menos 28 pessoas teriam morrido asfixiadas nesta quinta só no Hospital 28 de Agosto, na capital do Amazonas. “Eu não estou vendo que falte oxigênio em nenhum outro lugar, mas falta em Manaus, falta no Amazonas”, disse o ex-prefeito, no vídeo postado no Twitter. “Eu queria dizer diretamente ao governador do Estado (Wilson Lima) que o nome disso é assassinato.”
No vídeo, Virgílio Neto também pede o afastamento de Lima do cargo. “Eu tenho impressão, governador, que do senhor basta. Do senhor basta. A assembleia precisa tomar uma atitude máscula, maiúscula, e partir claramente para o seu impeachment, o seu impedimento.”
O ex-prefeito diz, ainda, que Lima seria “o pior governador que esse Estado já teve”. “O senhor está praticando assassinato. E, pior, a assassinato à la Hilter, tipo câmara de gás, por asfixia. O pior tipo, o mais doloroso, o mais cruel, o mais perverso.”
Virgílio Neto foi prefeito de Manaus por dois mandatos consecutivos e ocupava o cargo no início da pandemia. Já na primeira onda do novo coronavírus, o sistema de saúde da capital entrou em colapso e mortos por covid-19 chegaram a ser enterrados em valas coletivas. No dia 1.º, foi substituído por David Almeida (Avante), que venceu a eleição.
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