A Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com recurso no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) para derrubar a decisão que obrigou o presidente Jair Bolsonaro a entregar à Justiça “os laudos de todos os exames” realizados para verificar se foi contaminado ou não pelo novo coronavírus. Por decisão de uma desembargadora plantonista Mônica Nobre, Bolsonaro não precisa mais divulgar os papéis hoje.
Em sua decisão, tomada durante o plantão de feriado do TRF-3, a desembargadora suspendeu – pelo prazo de cinco dias – o cumprimento da decisão que obrigava Bolsonaro a entregar em 48 horas todos os papéis dos testes de covid-19. A desembargadora decidiu esticar o prazo para que o relator do caso na segunda instância analise os argumentos da União.
A decisão da Justiça Federal de SP, suspensa agora pelo TRF-3, foi tomada após o governo enviar ontem um relatório, assinado por dois médicos da Presidência da República em 18 de março, informando que Bolsonaro estava assintomático e havia testado negativo para a doença.
Para a juíza Ana Lúcia, o documento da Presidência não atende “de forma integral” à determinação judicial da última segunda-feira. O Estado garantiu no início desta semana o direito de obter os testes de covid-19 feitos por Bolsonaro. Por decisão da juíza, a União foi obrigada a fornecer “os laudos de todos os exames” feitos pelo mandatário.
Bolsonaro já disse que o resultado deu negativo, mas se recusa a divulgar os papéis – em entrevista à Rádio Guaíba, na última quinta-feira, o presidente admitiu que “talvez” tenha sido contaminado pelo novo coronavírus.
“Eu talvez já tenha pegado esse vírus no passado, talvez, talvez, e nem senti”, afirmou o presidente em entrevista à Rádio Guaíba, de Porto Alegre. O presidente já realizou dois testes para saber se foi contaminado pela doença – em 12 e 17 de março – e divulgou que os resultados foram negativos, mas tem se recusado a apresentá-los.
O relatório médico apresentado pela AGU à Justiça Federal de São Paulo é assinado pelo assistente médico da Presidência, o especialista em ortopedia e traumatologia Marcelo Zeitoune, e o coordenador de Saúde da Presidência, o urologista Guilherme Guimarães Wimmer.
O Estado procurou Zeitoune, que disse por telefone que não poderia dar mais detalhes sobre os exames. “Ordens superiores”, afirmou. Sobre o fato de Bolsonaro ter procurado um ortopedista para uma suspeita de covid-19, afirmou: “Sou ortopedista e sou médico. Minha especialidade é ortopedia. Faço parte da equipe.”
O governo também queria que o relatório médico fosse mantido sob sigilo por envolver informações consideradas pessoais do presidente, o que foi negado pela juíza. “A falta de transparência é absoluta. A decisão da Justiça mandou juntar resultado de exame. Não há nenhum resultado de exame juntado, portanto, a decisão foi descumprida”, disse o advogado do Estado Afrânio Affonso Ferreira Neto.
Risco. Em resposta à Justiça, a AGU destacou que o relatório médico do mês passado informa que Jair Bolsonaro “vem sendo monitorado pela equipe médica”, concluindo que “não há, portanto, risco sanitário de contágio/disseminação por parte do Presidente da República, uma vez que o mesmo não demonstrou ser, até o presente momento, hospedeiro do novo coronavírus”. “O relatório médico atesta os resultados dos exames realizados”, afirma a AGU.
Pelo menos 23 pessoas que acompanharam o presidente brasileiro na viagem aos Estados Unidos foram diagnosticadas posteriormente com a doença. Entre eles, auxiliares próximos, como o secretário de Comunicação Social da Presidência da República, Fabio Wajngarten, e o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno.
Depois de questionar sucessivas vezes o Palácio do Planalto e o próprio presidente sobre a divulgação do resultado do exame, o Estado entrou com ação na Justiça na qual aponta “cerceamento à população do acesso à informação de interesse público”, que culmina na “censura à plena liberdade de informação jornalística”.
A Presidência da República se recusou a fornecer os dados ao Estado via Lei de Acesso à Informação, argumentando que elas “dizem respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, protegidas com restrição de acesso”.
Aglomerações. Ao longo das últimas semanas, o presidente tem descumprido orientações da Organização Mundial da Saúde e do próprio Ministério da Saúde, fazendo passeios pelo Distrito Federal e arredores, cumprimentando populares e formando aglomerações em torno de sua pessoa.
Neste sábado, Bolsonaro causou grande aglomeração de pessoas na cidade de Cristalina (GO), a 150 quilômetros de Brasília. Em passagem por um posto de gasolina da cidade, acompanhado de seguranças e representantes da prefeitura de Cristalina, o presidente cumprimentou dezenas de pessoas, entre elas idosos e crianças. Apesar de estar com uma máscara no pescoço, o presidente permanecia o tempo todo sem utilizar a proteção de forma correta. Abraçou diversas pessoas.
Dentro do posto de gasolina onde parou, Bolsonaro tomou café, comeu pastel e voltou a criticar o isolamento social para aqueles que o cercavam. “Isso é uma irresponsabilidade, uma irresponsabilidade”, disse.
Bolsonaro já minimizou a gravidade da pandemia, referindo-se ao novo coronavírus como “gripezinha” e “resfriadinho”. O Brasil encerrou o mês de abril com um total de 5.901 óbitos e 85.380 pessoas contaminadas pelo novo coronavírus.
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