Diante do agravamento da pandemia do coronavírus pelo País e das medidas de restrição de deslocamento e de aglomeração impostas, vieram à tona propostas de adiamento das eleições municipais, previstas para outubro deste ano. Não é somente no Brasil que esse tema vem gerando discussões. Segundo dados do IDEA (Institute for Democracy and Electoral Assistance), entre o dia 1º de março e o começo do mês de abril, 47 países já haviam decidido pelo adiamento de algum tipo de eleição, seja de caráter nacional ou local, por conta da crise desencadeada pela covid-19.
No Brasil, o tema já provocou diversas propostas, inclusive a de prorrogação dos mandatos dos atuais prefeitos e vereadores até 31 de dezembro de 2022, arrastando os mandatos por mais dois anos, sem qualquer votação, apenas como forma de unificar os calendários eleitorais e economizar recursos públicos.
Recentemente, houve o adiamento de uma nova eleição para ocupar a vaga da Juíza Selma (Podemos-MT), que foi cassada por uso de caixa dois e abuso de poder econômico. A eleição estava prevista para o dia 26 deste mês. Por enquanto, o cargo que era dela no Senado está sendo ocupado por Carlos Fávaro (PSD-MT), que foi o terceiro colocado nas eleições de 2018 e é ex-vice-governador de Mato Grosso e presidente estadual do PSD.
Em alguns países, como nos Estados Unidos, por exemplo, as eleições primárias em 15 estados foram adiadas, além de várias eleições locais por todo o país, originalmente marcadas para os meses de março a maio de 2020.
Na França foi adiada a votação do segundo turno das eleições locais, prevista inicialmente para 22 de março. Na Suíça, a votação federal, originalmente prevista para 17 de maio, foi adiada, bem como diversas eleições municipais previstas para os meses de abril a junho. No Chile, um referendo constitucional estava marcado para 26 de abril, onde seria votada a elaboração ou não de uma nova Constituição para o país.
“Trata-se de um caso de grande relevo, especialmente porque a demanda por uma nova Constituição está no centro dos protestos em larga escala que envolvem o Chile desde outubro de 2019. Para efetivar essa nova data para o plebiscito, foi proposto um projeto de reforma constitucional, que exigiu a aprovação de dois terços dos parlamentares”, destaca o advogado Cristiano Vilela, especialista em direito eleitoral e sócio do escritório Vilela, Silva Gomes & Miranda Advogados. Ele cita também o adiamento da eleição suplementar para o cargo de senador no Estado de Mato Grosso, com a cassação da Juíza Selma.
Na avaliação de Cristiano Vilela, as medidas de saúde pública adotadas por conta da pandemia podem ocasionar a necessidade de mudanças nos calendários eleitorais - e não apenas de Brasil.
"O que deve se levar em conta é a conveniência de tais medidas e o tamanho do adiamento, isto é, quais as consequências que estes adiamentos, eventualmente, podem ocasionar. Medidas graves como essas, portanto, não podem ser tomadas de forma impensada, sob pena de gerarem consequências constitucionais mais danosas que os benefícios de eventuais mudanças”, ressalta.
Para o advogado, no caso do Brasil ainda há tempo para se decidir sobre a necessidade de qualquer mudança nesse sentido, já que as eleições municipais estão marcadas para outubro. Vilela, contudo, rejeita a ideia de prorrogação dos mandatos dos atuais prefeitos para 2022, como vem sendo proposto por alguns parlamentares.
“A democracia e a representação através do voto são elementos basilares da nossa Constituição Federal, sendo impensável um retorno dos políticos ‘biônicos’ , isto é, daqueles que ocupam cargos de natureza eletiva não pelo voto, mas pela força das canetas, o que seria completamente contrário a uma cláusula pétrea de nossa Constituição”, afirma.
Na avaliação do advogado Fernando Neisser, sócio do escritório Rubens Naves Santos Jr. Advogados, ainda é cedo para se falar em adiamento das eleições no Brasil, uma vez que é possível que até outubro a situação da pandemia já possa estar mais controlada.
“Todos os países que têm feito adiamento dos seus processos eleitorais estavam com datas muito mais próximas. Alguns em março, outros em abril e alguns, no máximo, em maio. Coincidentemente alguns países adiaram as eleições exatamente para outubro, quando se espera que já tenha passado a principal onda da pandemia do coronavírus.
Por essa razão, e acompanhando o que está sendo feito em outros países, Rubens Naves imagina que ainda não seja o momento para se discutir o adiamento das eleições municipais no Brasil.
“O ministro Luís Roberto Barroso [que assumirá a presidência do Tribunal Superior Eleitoral a partir de maio] deu uma entrevista recentemente e disse que junho seria o momento ideal para fazer esta análise com dados mais atuais e mais precisos para saber se será necessário fazer o adiamento ou não", complementa.
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