O Superior Tribunal de Justiça (STJ) devolveu à Justiça Federal no Piauí as ações penais decorrentes de investigações realizadas pela Polícia Federal, por meio da "Operação Topique", enviadas à Corte Especial após declínio de competência. As ações foram remetidas devido à possível conexão com a ação penal instaurada contra a conselheira Rejane Dias e outras pessoas.
O Ministério Público Federal, no entanto, apontou em manifestação que as denúncias que originaram as diversas ações penais "retratam situações próprias, nas quais os denunciados desempenham funções/empregos distintos, além de as situações fáticas não envolverem a Conselheira do TCE/PI", com exceção de uma ação penal, baseada em crimes supostamente cometidos pela própria Conselheira.
Conforme a denúncia apresentada na ação penal em trâmite no STJ, a Conselheira Rejane Dias teria recebido vantagens indevidas, diretamente ou por meio de seus assessores e/ou parentes, "pelo menos desde 2013, notadamente no período em que exerceu o cargo de Secretária de Estado da Educação do Piauí (2015/2018), em troca do suposto favorecimento das empresas do grupo criminoso investigado".
Rejane Dias foi denunciada pelo Ministério Público Federal após investigação que revelou a existência de uma organização criminosa composta, entre outras pessoas, por agentes públicos da Secretaria de Educação e Cultura do Estado do Piauí. Esses agentes teriam recebido vantagens indevidas para beneficiar empresas integrantes de um esquema criminoso, por meio da simulação e fraude de procedimentos licitatórios, da celebração e manutenção de contratos irregulares de transporte escolar com a SEDUC/PI, e da liquidação e execução de despesas superfaturadas.
Relator
De acordo com o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, apesar de as ações penais terem origem na Operação Topique, "os fatos são diversos e, além disso, a decisão declinatória proferida pelo juízo de primeiro grau não apontou em que medida, eventualmente, a prova dos fatos que desencadearam a ação penal poderia influir na prova daqueles que embasam a ação em trâmite no STJ".
"A jurisprudência da Corte Especial está sedimentada no sentido de que a excepcionalidade do foro por prerrogativa de função determina o desmembramento das ações penais, de forma que apenas aqueles que gozam desse privilégio devem permanecer sendo processados perante este órgão", afirma o relator.
A decisão ressalta que não se justifica a tramitação, perante o STJ, de diversas ações penais em que não figuram acusados com prerrogativa de foro, apenas porque dizem respeito a fatos que guardam alguma relação com aqueles que embasam a denúncia oferecida contra a Conselheira do Tribunal de Contas do Estado do Piauí, Rejane Dias.
As ações foram enviadas à Justiça Federal no Piauí em 23 de maio deste ano e reativadas para regular tramitação.
ORCRIM movimentou mais de R$ 346 milhões
A auditoria e as análises da CGU/PI mostram que a empresa Locar Transportes, sob a administração do empresário Luiz Carlos Magno Silva, se transformou na maior prestadora de serviços de transporte escolar do Piauí, com faturamento anual de dezenas de milhões de reais. Pelas informações bancárias, cujo sigilo foi afastado na primeira fase da Operação Topique, foi constatado que, entre janeiro de 2013 e dezembro de 2015, entre operações de débito e crédito, a empresa movimentou valores que totalizam R$ 346.659.942,39 (trezentos e quarenta e seis milhões, seiscentos e cinquenta e nove mil, novecentos e quarenta e dois reais e trinta e nove centavos).
No mesmo período, o empresário e ex-professor Luiz Carlos teve uma movimentação financeira elevadíssima, atingindo um total de R$ 12.316.764,43 (doze milhões, trezentos e dezesseis mil, setecentos e sessenta e quatro reais e quarenta e três centavos).
Ação no STJ
O Supremo Tribunal Federal fixou a tese segundo a qual "o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas". No entanto, afastou, excepcionalmente, o entendimento para a fixação do foro por prerrogativa de função de desembargadores, com o fundamento da necessidade de garantir a independência também ao órgão julgador. Assim, o Superior Tribunal de Justiça admitiu, também, o foro especial aos membros do Ministério Público, com base na equiparação prevista no art. 96, inciso III, da Constituição Federal, e aos membros dos Tribunais de Contas dos Estados, por força do art. 105, inciso I, alínea “a”, da Constituição, independentemente de a infração penal haver sido praticada durante o exercício do cargo e de estar relacionada às funções desempenhadas.
Ao declinar a competência, o juiz Agliberto Gomes Machado, da 3ª Vara Federal do Piauí, seguiu o entendimento e determinou o envio dos autos independentemente de os fatos haverem ocorrido quando a investigada ocupava o cargo de Secretária de Estado da Educação.
“De outra parte, cumpre esclarecer que, considerando o tamanho e a complexidade da acusação de existência de organização criminosa, denota-se, do conjunto de provas produzidas e analisadas, a imperiosa necessidade de remessa de todos os processos conexos, a fim de garantir o julgamento conjunto dos fatos e também dos corréus que respondem pelos mesmos crimes, em uma só assentada, permitindo ao juízo competente uma visão completa do quadro probatório e evitando julgamentos contraditórios”, afirma a decisão proferida em 19 de dezembro de 2023.
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