Neste 08 de março de 2024, Dia Internacional da Mulher, o GP1 preparou uma reportagem especial com a atual presidente da Academia Piauiense de Letras, Fides Angélica de Castro Veloso Mendes Ommati , mostrando um pouco da sua trajetória e marcas no Piauí.

Fides Angélica Ommati nasceu no município de Floriano, no Sul do Piauí, a aproximadamente 250 quilômetros de Teresina, e é professora, advogada, jurista e escritora, com uma caminhada inspiradora para os leitores e novos escritores.

Em longa e instigante conversa com o GP1 , Fides contou um pouco da sua jornada, desde a chegada a Teresina, na infância, passando pelas dificuldades da vida adulta, até o momento atual.

Chegada na Capital do Piauí e começo da vida adulta

No início da entrevista, a professora procurou contar um pouco de sua vida, desde a infância. Sendo a décima terceira a nascer entre 14 irmãos, Fides Angélica revelou que tentou cursar Engenharia, mas fez Direito, curso pelo qual se apaixonou e onde se tornou destaque desde muito jovem.

Foto: Reprodução/APL
Fides Angélica, advogada e escritora

“Eu nasci em Floriano, porque meu pai trabalhava lá e vim para Teresina aos três anos. Aqui, na capital piauiense, eu me criei, estudei, fiz minha atividade de magistério e de advocacia e me perguntavam ‘por que advocacia?’. Na realidade, gostaria de ter feito engenharia, tenho quatro irmãos engenheiros, sempre adorei matemática e física, mas como não foi possível por eu ter 14 irmãos, tive que ficar, porque era muita despesa. Comecei muito cedo no magistério, adoro ser professora, mais do que advogada. Dava aula de reforço escolar e quando eu tinha 15 anos comecei a preparar jovens para uma espécie de vestibular que tinha na época, para ingressar no ensino médio. Depois, aos 19 anos, já dava aula à noite, na Escola Técnica de Comércio e sempre gostei de lecionar. Fiz o curso de Direito, era minha única opção, porque na época que fui fazer vestibular, tínhamos apenas três cursos superiores em Teresina que era Odontologia, Direito e faculdade de Filosofia que já funcionava. Gostei do curso de Direito, porque realmente é apaixonante e, nesse ínterim, já trabalhava como funcionária pública desde os 19 anos, na área de planejamento e de orçamento. Eu sempre fui muito curiosa e tudo que eu vejo e que posso aprender, eu quero aprender. Então, fazia orçamento e planejamento, mas quando avancei no curso de Direito, tive um convite e fui trabalhar no departamento jurídico do estado", contou Fides Angélica.

Pioneirismo profissional

Desde cedo, Fides é pioneira em diversas áreas. Ela relembrou a época em que ajudou a fundar a Procuradoria-Geral do Estado do Piauí e de quando escreveu um dos primeiros manuais de Direito Previdenciário do Brasil, em um período no qual havia pouca bibliografia da matéria no país.

“De lá, ajudei a fundar a Procuradoria-Geral do Estado, participei de seu primeiro concurso, em 1974, e fui procuradora do estado até me aposentar. Mas, antes disso, fiz processo seletivo e ingressei como professora do curso de Direito na Universidade Federal do Piauí, em 1972, quando eu tinha 26 anos, e comecei a lecionar. Lá, eu lecionei várias disciplinas, mas me fixei em duas. Em 1973, foi feita uma reforma universitária e o Direito Previdenciário passou a ser uma disciplina eletiva e fui convidada, porque quando comecei a advogar, comecei a advogar pela previdência. Então, comecei a estudar Direito Previdenciário, a ler a legislação e, em razão disso, fui a primeira professora de Direito Previdenciário. Além disso, como era uma disciplina muito nova e a bibliografia nacional era muito escassa, acho que um dos primeiros manuais de Direito Previdenciário foi meu, publiquei pela Editora Forense, lá do Rio de Janeiro. Percebi o problema dos meu alunos com relação a fontes de pesquisa e resolvi elaborar esse manual. Fui uma das primeiras autoras da disciplina no Brasil”, evidenciou Fides.

Dificuldades transformadas em força

Durante a entrevista, Fides expôs as dificuldades durante sua trajetória. Sempre trabalhando durante três turnos, ela precisou criar os filhos sozinha após a morte de seu marido, mas, com muito ânimo e sem romantizar os percalços, expôs que fez o que precisou fazer, transformando as dificuldades em vigor.

“Eu até hoje fico pensando como foi que eu dei conta. Eu trabalhava de manhã, de tarde e de noite. Corria. No Conselho Federal, por exemplo, eu era conselheira de uma das câmaras de lá e desde que cheguei lá, chamaram-me para fazer a revista do conselho, que estava atrasada havia vários anos. Para você ver, cheguei a conclusão, durante minha vida, que todo conhecimento é útil, é importante para a vida da gente. Comecei no serviço público aos 19 anos, quando fui datilógrafa também. No tempo em que ficava ociosa, comecei a ler o que tinha disponível lá de livro de orçamento. Mas era uma vida de doido rapaz, era uma vida de doido...entrava às 07 horas da manhã no meu trabalho e era a pé, porque naquela época quase não se tinha carro. Trabalhava lá no Centro, perto da Praça Rio Branco, ia para a Praça do Fripisa, onde tinha a faculdade de Direito e, às vezes ia sem almoçar, passava a tarde todinha lá e fazia só um lanchinho. Dava aula à noite, na Escola Técnica, às vezes ia sem jantar. Então, era assim, mas eu sempre tive muita disposição. Assim [nessas condições], criei meus filhos. Com 11 anos de casada meu marido faleceu e fiquei com três filhos, um de três, um de seis e um de nove anos e nem pensei muito, tinha que trabalhar, então fui trabalhar. E tem uma coisa muito boa, é que meus filhos tiveram o meu exemplo. Hoje, estão todos formados, pós-graduados e foram embora. E me perguntam ‘você fica aqui sozinha?’, eu respondo que fico. Comecei só, continuo só, aqui tenho a minha vida e por que eu iria embora daqui, não é? Então, a gente pensa, meu Deus, quanto mais atividade a gente tem, mais o tempo nos ajuda, mais força a gente tem. Os obstáculos são os nossos desafios. Vida mansa forma pessoas indolentes, sem incentivo, sem coragem”, expôs Fides Angélica.

Vaidade?

A professora filha da Princesa do Sul chama a atenção também pelos trajes que veste. Segundo ela, trata-se muito mais de usar a roupa adequada para cada ambiente, mas também há prazer em se arrumar.

“Eu gosto [de andar arrumada]. A pessoa também precisa disso. Acho que há um mínimo de traje, de adequação. Por exemplo, eu gosto muito de andar com camisa sem manga, com decote, mas eu não viria pra cá [Academia Piauiense de Letras, onde a entrevista se deu] com o vestido que eu vou passear, que eu vou no shopping. A pessoa tem que saber que há regras, há também questão de postura e de compostura. Sempre dizia isso em sala de aula e exigia das moças, dos rapazes...ficava uns rapazes com shortinho na sala de aula e eu dizia ‘meu filho, venha cá, você está em um curso formal, um curso que vai formar pessoas que tem que ter seu formalismo’, então eu era muito exigente”, explicou Fides.

Recado para mulheres

Por fim, Fides deixou um recado para todas as mulheres, que apesar de direcionado para a sua classe, pode servir para todas.

Foto: Reprodução/APL
Fides Angélica, a única mulher a ocupar cargo na Academia Piauiense de Letras, de onde é a primeira presidente mulher

“As mulheres estão muito adiantadas hoje. Na advocacia, por exemplo, que é minha área, nós somos a maioria no Piauí, a maioria da advocacia no estado é constituída de mulheres. Na minha época, quase não havia mulheres. E eu falo hoje para algumas companheiras, por exemplo, que se pode fazer uma chapa de mulheres, e compor toda a direção da OAB com mulheres e podem ceder alguns cargos para os homens. É preciso unir-se, é preciso se conscientizar, é preciso saber que não é apenas ser eleita, é saber a responsabilidade que vem disso”, finalizou Fides Angélica.