Advogados constituídos pelo Hospital São Marcos pediram o arquivamento do inquérito instaurado pela Polícia Civil do Piauí, para investigar o débito de R$ 56 milhões que a unidade de saúde tem junto à Fundação Municipal de Saúde (FMS) de Teresina. O ofício foi encaminhado ao Departamento de Combate à Corrupção (DECCOR) no dia 9 de janeiro.
No ofício, os advogados argumentam, inicialmente, que o Hospital São Marcos somente contraiu empréstimos junto a instituições bancárias por atrasos nos repasses da FMS, o que acabou acumulando o débito milionário.
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“Os empréstimos contraídos pelo Hospital São Marcos evidenciam o impacto dos atrasos nos repasses da FMS em sua saúde financeira. A instituição se vê forçada a buscar recursos no mercado para garantir a continuidade de suas atividades, arcando com o ônus de juros e taxas que comprometem sua sustentabilidade”, diz o texto.
As operações firmadas com os bancos se deram na modalidade de antecipação de crédito, quando a instituição adiantava valores mediante a cessão fiduciária dos direitos creditórios do hospital sobre os recebíveis do Sistema único de Saúde (SUS).
Hospital diz ter alertado FMS
Segundo os advogados, partiu do próprio hospital a iniciativa de comunicar a FMS que os descontos relativos aos empréstimos não estavam sendo feitos regularmente.
“A postura proativa do Hospital São Marcos evidencia sua boa-fé e seu compromisso em resolver o impasse de forma amigável. A comunicação clara e objetiva reforçou a importância do cumprimento da obrigação da FMS, como gestora plena do SUS em Teresina, de realizar os descontos devidos”, consta no ofício.
Por conseguinte, o hospital negou não ter se manifestado após notificação da FMS. Os advogados frisaram que o caso somente deve ser resolvido na esfera criminal quando não houver acordo na área cível.
“A inadequação da via criminal é ainda mais evidente porque a própria FMS reconhece que a questão se resume a alegada irregularidade, por ela própria perpetrada, no procedimento de desconto das parcelas dos empréstimos consignados. Trata-se, portanto, de típica discussão sobre o cumprimento de obrigações contratuais, que deve ser resolvida pelos meios próprios do Direito Civil e Administrativo”, diz outro trecho do ofício.
Diante disso, os representantes jurídicos do Hospital São Marcos pediram o arquivamento do inquérito policial, alegando “absoluta ausência de justa causa para seu prosseguimento”.
Relatório da FMS
O GP1 obteve acesso, com exclusividade, a um relatório da Fundação Municipal de Saúde (FMS) de Teresina, que revela uma dívida de mais de R$ 56 milhões da Associação Piauiense de Combate ao Câncer – Hospital São Marcos com o Município. O débito é decorrente inúmeros empréstimos celebrados pelo hospital tendo como garantia os repasses do Fundo Nacional de Saúde (FNS).
O relatório foi emitido em abril do ano passado e encaminhado ao Ministério Público do Estado do Piauí em 23 de maio do mesmo ano, por meio de ofício assinado pelo então presidente da FMS, Ítalo Costa Sales.
A dívida do Hospital São Marcos foi identificada durante auditoria interna, a fim de detectar eventuais reduções indevidas nos repasses para média e alta complexidade. O órgão municipal constatou que a redução dos valores era decorrente de empréstimos celebrados por estabelecimentos da rede de atendimento à saúde pública contratualizada com o Município.
Segundo a Fundação Municipal de Saúde, entre 2016 e 2024, o Hospital São Marcos contratou diversos empréstimos consignados, utilizando como garantia os repasses do Fundo Nacional de Saúde (FNS) ao Fundo Municipal de Saúde, que, por meio da FMS, direciona os recursos aos estabelecimentos.
As operações de crédito foram contratadas junto à Caixa Econômica Federal e ao banco Bradesco, e somam R$ 123.028.571,00 (cento e vinte e três milhões, vinte e oito mil, quinhentos e setenta e um mil reais).
Na auditoria, foi verificado que, o Fundo Nacional de Saúde descontou regularmente as parcelas dos empréstimos do hospital nos repasses que fazia ao Fundo Municipal de Saúde, contudo, a FMS deixou de fazer muitos desses descontos mensais.
O Fundo Nacional de Saúde descontou um total de R$ 64.461.830,26 (sessenta e quatro milhões, quatrocentos e sessenta e um mil, oitocentos e trinta reais e vinte e seis centavos) dos repasses ao Fundo Municipal, sendo que a FMS deduziu, dos recursos destinados ao São Marcos, apenas R$ 19.361.009,72 (dezenove milhões, trezentos e sessenta e um mil, nove reais e setenta e dois centavos. Portanto, um déficit de R$ 45.100.820,54 (quarenta e cinco milhões, cem mil reais, oitocentos e vinte reais e cinquenta e quatro centavos).
Abertura de inquérito
O inquérito foi instaurado em 29 de outubro do ano passado pelo delegado Francisco Dennis Lustosa Sampaio, do Departamento de Combate à Corrupção (DECCOR), após solicitação do Ministério Público do Estado do Piauí, que havia recebido a denúncia da FMS. O ofício solicitando a abertura de investigação policial foi assinado pelo promotor José Eduardo Carvalho Araújo, da 53ª Promotoria de Justiça de Teresina.
Pagamentos ao hospital continuaram
O professor Charles Silveira deixou o comando da Fundação Municipal de Saúde (FMS) nessa quarta-feira (19), menos de dois meses após assumir o cargo. Em sua breve gestão, a FMS manteve repasses milionários ao Hospital São Marcos, ignorando o fato de que a unidade de saúde acumula uma dívida de R$ 56 milhões com o Município.
O GP1 apurou que, entre janeiro e fevereiro deste ano, a gestão de Charles Silveira autorizou oito repasses ao Hospital São Marcos, totalizando R$ 5.706.025,31 (cinco milhões, setecentos e seis mil, vinte e cinco reais e trinta e um centavos), mesmo diante da grave investigação em curso.
Na terça-feira (17), às vésperas da exoneração de Charles, foram feitos três repasses cujos valores somam mais de R$ 2,8 milhões.
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