Depois de pedir a um apoiador para esquecer o PSL e dar sinais de que pretende mudar de partido, o presidente Jair Bolsonaro amenizou o tom e recuou uma casa no jogo político.
Mesmo assim, ele tenta encontrar uma saída para deixar o PSL sem que parlamentares de seu grupo percam mandato por infidelidade partidária, mas, ciente de que essa solução pode demorar, decidiu adotar outra estratégia.
Confrontado pelo presidente do PSL, deputado Luciano Bivar (PE), que praticamente o desafiou a deixar a legenda, Bolsonaro disse que só tem feito reclamações “do bem”, para corrigir os rumos do partido.
“Não tem crise nenhuma. Briga de marido e mulher às vezes acontece”, afirmou o presidente ontem, após uma série de reuniões, no Palácio do Planalto, com deputados do PSL e com advogados. “O problema não é meu. O pessoal quer um partido atuante, diferente. O PSL está estagnado.”
‘Bolsonaristas” x ‘bivaristas’
Embora o dia tenha sido de reuniões de emergência entre “bolsonaristas” de um lado e “bivaristas” de outro, o impasse continua. Reunida na Câmara, a bancada do PSL divulgou uma carta em desagravo a Bolsonaro, pregando um canal de diálogo.
Assinado por 19 dos 53 deputados da sigla, o documento diz que “para que o partido contribua para o estabelecimento de uma nova política é preciso que a atual direção adote novas práticas, com a instauração de mecanismos que garantam absoluta transparência na utilização de recursos públicos e democracia nas decisões”.
Além do controle do PSL, a disputa entre Bolsonaro e seus aliados e o grupo do Bivar também envolve dinheiro. O partido foi o mais votado nas eleições de 2018, e por isso terá, na próxima campanha, a maior fatia dos fundos públicos usados para financiar candidaturas – estimada em R$ 400 milhões.
Advogados do presidente procuram agora construir uma fórmula jurídica para que recursos do fundo partidário migrem para a nova sigla de Bolsonaro, caso ele decida mesmo se desfiliar do PSL. Por enquanto, o objetivo é ganhar tempo.
Novo partido vira opção: Conservadores
Uma das ideias é que o presidente se filie ao Patriota ou a um novo partido, que se chamaria Conservadores. A sigla está em construção e deve nascer sob o guarda-chuva da antiga União Democrática Nacional (UDN), extinta após o golpe militar de 1964. Desde o início de sua carreira política, Bolsonaro já passou por oito legendas.
O conflito entre o presidente e a cúpula do PSL foi escancarado quando Bolsonaro disse que Bivar estava “queimado para caramba”. Ao ser abordado na entrada do Palácio da Alvorada por um militante, que afirmou ser pré-candidato do PSL no Recife (PE), o presidente lhe disse: “Esquece o PSL, tá OK?”. Mesmo assim, o jovem gravou um vídeo ao lado de Bolsonaro e citou Bivar, que é de Pernambuco. O presidente reagiu. “Oh, cara, não divulga isso não, pô. O cara tá queimado pra caramba lá. Vai queimar o meu filme também. Esquece esse cara, esquece o partido.”
Bivar afirmou ao Estado que Bolsonaro já decidiu pela saída do PSL. “Quando ele diz a um estranho para esquecer o PSL, mostra que ele mesmo já esqueceu, que não tem mais nenhuma relação com o PSL”, observou o deputado, que é fundador da legenda.
Para Bivar, a intenção do presidente é dizer que não tem envolvimento com denúncias de irregularidades envolvendo candidaturas de mulheres que teriam sido usadas como “laranjas” para obter recursos públicos nas eleições passadas. Na semana passada, o Ministério Público de Minas Gerais denunciou o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, por irregularidades nas eleições de 2018. Antônio presidia o PSL mineiro à época.
Na avaliação de Bivar, Bolsonaro está fazendo um “cálculo político” para garantir o seu projeto de reeleição, em 2022. “Ninguém é eleito presidente sem ter acertos. Como ele vem em um processo de reeleição, talvez ele saiba qual é o melhor caminho a ser seguido. Espero que ele tenha sucesso”, disse.
Em reunião com deputados e advogados, Bolsonaro afirmou que não quer ser dono do PSL. “Mas não podemos estar dentro de um partido que, de repente, resolve apresentar um estatuto novo, sem consultar os seus deputados”, afirmou o presidente, a portas fechadas, de acordo com relatos de participantes da reunião.
Um deles disse que Bolsonaro e seus filhos estão buscando uma solução “dentro e fora” do PSL, já que, pela lei atual, quem sair do partido corre o risco de perder o mandato. O deputado Eduardo Bolsonaro, é presidente do PSL de São Paulo e comanda a Comissão de Relações Exteriores da Câmara. Caso deixe o partido, pode perder também a comissão, considerada essencial para alavancar sua “candidatura” de embaixador do Brasil nos Estados Unidos.
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