Para que marcas de moda se mantenham no pódio do desejado e concorrido mercado de alto luxo, e para que as grifes sobrevivam além de seus criadores, é comum que estilistas trabalhem para manter códigos, valorizar heranças e relembrar tradições. Esse conjunto forma o que se chama o DNA de uma marca e se tornou um caminho conhecido por novos diretores criativos que assumem as posições de comando dessas verdadeiras fábricas de sonhos.
Entre os exemplos de sucesso dessa estratégia está a Chanel, que foi fundada em 1910 por Coco Chanel. A estilista morreu em 1971; no entanto, sua marca segue como uma das mais valorizadas do mercado até os dias atuais. Seu logo com dois Cs interligados seguem em destaque e a bolsa 2.55 tornou-se um símbolo social cujo valor de mercado segue em uma constante crescente.
Mas em uma época cheia de novas estratégias de comunicação via mídias sociais digitais surgem exemplos de diretores criativos que têm seguido um caminho oposto. Com isso, subvertem a estética das marcas em que trabalham e atingem de forma contraintuitiva novos fãs e um público que, apesar de desconhecer o tão protegido “heritage” da marca – essa herança que sustenta os códigos criados por seu fundador –, se torna fiel a uma nova voz e estética propostas.
Um exemplo dessa forma de reconstruir o desejo de jovens por uma marca tradicional é o polêmico Demna Gvasalia e seu trabalho à frente da Balenciaga, marca nascida na clássica Espanha de 1919 que trazia “arquitetura e design para as roupas”, como dizia seu fundador Cristóbal Balenciaga.
HISTÓRIA PESSOAL Em 2022, pelas mãos de Demna, de 41 anos – que nasceu na Geórgia, país que até 1991 fazia parte da União Soviética –, a marca traz para a mesa sua história pessoal como um sobrevivente que viveu sua infância e adolescência fugindo da guerra separatista. Na passarela vemos provocações ácidas, ironias ferrenhas e grandes exageros.
Sua polêmica mais recente? Bolsas que reproduzem grandes sacos de lixo com extrema precisão de detalhes e texturas e que viralizaram pelas redes sociais. As peças foram desfiladas em Paris durante a última temporada de outono-inverno 2022, na qual modelos em looks totalmente pretos caminhavam com dificuldade em uma tempestade de neve e carregavam consigo esses sacos lotados e pesados.
O desfile nasceu como uma alusão à fuga apressada de refugiados que carregam o que podem em sacos de lixo? Demma não explica, mas não nega e deixa aberta à imaginação de quem assiste ao espetáculo.
Nas cores preta, branca, azul e vermelha, as bolsas/sacos custam US$ 1.790, cerca de R$ 9.000,00 na cotação atual. Seu lançamento no mercado causou revoltas e dividiu opiniões, como acontece no tão necessário quanto perigoso mundo virtual.
NOVO TEMPO De um lado estão clientes antigos que enxergam a criação como absurda e de mau gosto, uma afronta à origem da sofisticada Balenciaga. De outro, uma nova e fiel legião de fãs e seguidores de Demna que tem a Balenciaga e seu trabalho irônico como representante de um novo tempo.
A verdade é que o trabalho de Demna exibe em sua moda temas atuais, imagens extremas e invariavelmente subverte a herança da marca construindo uma narrativa atual para um público ávido por novos códigos de estilo.
Os “sacos de luxo”, no entanto, não são os primeiros itens polêmicos lançados pela Balenciaga de Demna – e dificilmente serão os últimos. No início do ano, a marca ganhou as manchetes ao dizer que venderia, em edição limitada, pares de tênis completamente destruídos.
Em 2017, foi hit absoluto com as bolsas de US$ 2 mil que imitavam com exatidão as sacolas azuis da Ikea, multinacional sueca que vende móveis e peças para a casa a preços acessíveis. Na época, as próprias sacolas da Ikea se tornaram item fashionista, justamente por se parecerem com as bolsas Balenciaga. Uma estratégia arriscada e arrojada que se provou um verdadeiro golpe de mestre.
Ver todos os comentários | 0 |