Após ensaiar uma aliança com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda no primeiro turno e tentar marcar posição com uma candidatura própria no centro político – com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e depois com o ex-governador Eduardo Leite (PSDB-RS) –, Gilberto Kassab, presidente do PSD, se rendeu à polarização nacional. O ex-ministro de Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) é reconhecido pelo pragmatismo oportuno.
Mesmo sem conseguir o espaço que queria como aliado preferencial de Lula, intensificou recentemente conversas com o petista e já sinalizou apoio no segundo turno. Porém, antes pretende liberar a legenda – que tem a quinta maior bancada da Câmara, com 47 deputados federais – na disputa nacional. Na prática, a posição representa aval a Jair Bolsonaro (PL) na maioria dos diretórios estaduais, onde correligionários vão abrir palanque para o presidente.
Sem amarras no plano nacional, Kassab preferiu manter distância de todos os movimentos que tentaram criar uma frente de centro para ocupar o espaço da chamada terceira via, enquanto percorria o Brasil montando candidaturas regionais ecumênicas. O ex-prefeito de São Paulo, que mantém relação próxima com Lula, gravou até um vídeo para o ato de 42 anos do PT, ao mesmo tempo que não desestimulou ou mesmo ainda trabalha por alianças estaduais com políticos bolsonaristas.
Questionado sobre as contradições regionais, Kassab disse que o PSD caminha para a neutralidade. “É natural em um partido de centro que alguns fiquem mais à esquerda e outros à direita”, afirmou o ex-ministro ao Estadão. Já em relação às conversas com Lula, Kassab despista: “Falo sempre com Lula, há 30 anos”.
Levantamento feito pelo Estadão ilustra o atual quadro do PSD. Hoje, a legenda está abertamente no campo bolsonarista em oito estados e no Distrito Federal, ante sete na raia lulista. O exemplo mais emblemático é o Paraná, onde Ratinho Jr. é o aliado mais fiel de Bolsonaro. Para o presidente da Assembleia Legislativa, Ademar Traiano (PSD), apoiar o atual chefe do Executivo federal é uma “tendência natural” em razão do histórico “conservador” do Paraná.
“O governador (Ratinho Jr.) tem sido claro em relação ao apoio a Bolsonaro. No caso da maioria dos parlamentares, a tendência é exatamente essa”, disse Troiano. “Até porque somos um Estado altamente produtivo, do agronegócio”, afirmou. Além de comandar o governo e a presidência da Assembleia, o PSD também filiou o prefeito da capital, Rafael Greca, no final de junho.
Governismo
O PSD é governista também em Mato Grosso, Amapá, Espírito Santo, Distrito Federal, Rio Grande do Norte, Rondônia e Roraima. Dono de um cofre de R$ 347,2 milhões do fundo eleitoral, Kassab articula em São Paulo, maior colégio eleitoral do Brasil, um acordo com o ex-ministro Tarcísio de Freitas (Republicanos), nome de Bolsonaro na disputa pelo Palácio dos Bandeirantes. O ex-prefeito de São José dos Campos Felicio Ramuth, atual pré-candidato do PSD, pode ser o vice.
Apesar de todos os sinais de que fechou com Tarcísio, Kassab ainda mantém uma ponte com o projeto eleitoral de Márcio França (PSB) – ameaçado pela aliança nacional com o PT. “Historicamente, Kassab sempre esteve próximo ao Lula. Gostaríamos que ele estivesse conosco em São Paulo, mas esse movimento com Tarcísio não fecha portas. Nunca nos distanciamos”, disse o advogado Marco Aurélio Carvalho, coordenador do grupo Prerrogativas e aliado do ex-presidente Lula.
A legenda de Kassab, por sua vez, aderiu ao petista em Pernambuco, Paraíba, Bahia, Amazonas e Minas Gerais. Em Sergipe e no Rio de Janeiro, os pré-candidatos do partido já indicaram que gostariam de ter Lula no palanque. Minas Gerais, por exemplo, se tornou Estado-chave na aliança entre PSD e PT, com o lançamento da pré-candidatura do ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD), ao lado do ex-presidente.
Para o deputado federal Leonardo Monteiro (PT-MG), a coligação vai contribuir com os dois partidos, inclusive nas candidaturas legislativas. “Kalil tem bastante aceitação popular na capital, e o Lula ganha folgadamente no Estado. É bom para o Lula e é ótimo para o Kalil”, afirmou.
Pelas articulações atuais, o eleitorado nos Estados em que o PSD quer fazer palanque com Lula é mais do que o dobro do total daqueles em que está próximo a Bolsonaro. Se Kassab fechar em São Paulo com Tarcísio, a lógica se inverte, com um contingente de cerca de 61 milhões de eleitores nas unidades da Federação em que a legenda apoiaria o candidato ligado ao presidente, ante 55 milhões nos quais a aliança negociada é com o PT.
Lógica
Na avaliação do cientista político Carlos Melo, professor do Insper, a divisão do PSD segue uma lógica regional, com apoios mais alinhados aos líderes nas pesquisas à Presidência em cada Estado, e tem como principal objetivo aumentar a bancada da legenda no Congresso. “Na lógica dos Estados o que conta é a popularidade de cada um dos candidatos. O projeto é fazer bancada, quem fizer bancada terá influência sobre o próximo governo”, afirmou.
Tanto que, nos bastidores do PT, o presidente do PSD é visto como um importante aliado no segundo turno e em um eventual novo governo Lula, quando seria determinante para a governabilidade. Para Melo, existe maior probabilidade de Kassab apoiar Lula caso ele volte ao Palácio do Planalto.
“Não faz muito sentido em um projeto de longo prazo Kassab simplesmente aderir ao bolsonarismo na lógica nacional”, disse. “Ele não quer que o PSD seja confundido com o centro fisiológico, quer que seja reconhecido como centro democrático”, afirmou Melo.
Kassab iniciou a carreira política como vereador de São Paulo, em 1992, pelo extinto PL, atual Republicanos. De 1997 a 1998, comandou a Secretaria de Planejamento da Prefeitura de São Paulo na gestão Celso Pitta. Em 1998, foi eleito deputado federal, sendo reeleito para novo mandato na Câmara, em 2002.
Graduado em Engenharia Civil e Economia pela Universidade de São Paulo (USP), Kassab foi eleito vice-prefeito de São Paulo, em 2004. Quando José Serra (PSDB) deixou o cargo em 2006 para disputar o governo paulista, ele assumiu o Executivo local e foi reeleito em 2008. Em 2011, quando criou o PSD, abriu caminho para a oposição se juntar à base do governo Dilma.
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