O governo já começa a discutir internamente um “plano B” para a fatura bilionária de precatórios (valores devidos pelo poder público após sentença definitiva na Justiça) em 2022, calculada em R$ 89,1 bilhões.
Embora o ministro da Economia, Paulo Guedes, insista na necessidade de parcelar as dívidas de valor mais elevado, ministros envolvidos nas negociações reconhecem que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) enviada pelo governo enfrenta resistências e é vista com desconfiança pelos parlamentares e no mercado financeiro. Sondagens feitas no Congresso apontam que o texto da PEC não será aprovado. Por isso, essa ala quer abrir o diálogo – inclusive com governadores que são credores de R$ 16,6 bilhões em precatórios em 2022 – e chegar a um desfecho mais “palatável”.
Entre as soluções consideradas possíveis, está a de retirar do alcance do teto de gastos (a regra que limita o avanço das despesas à inflação e é hoje a âncora do governo para indicar sustentabilidade das contas) apenas o “excesso” de crescimento das dívidas judiciais, isto é, cerca de R$ 30 bilhões de aumento acima do previsto para 2022, mantendo uma regra semelhante para anos seguintes. Outra opção é retirar a despesa com precatórios do teto e recalcular o limite desde a sua origem, em 2016.
As alternativas ainda estão em discussão dentro do governo e também com o Congresso Nacional e, por isso, não há definição sobre qual caminho a ser tomado. O diagnóstico, porém, é de que há problemas de comunicação que precisam ser endereçados e necessidade de “ajustar a narrativa” e dar maior transparência à solução que for escolhida. Um dos problemas foi associar a aprovação da PEC a um aumento do valor do benefício médio do novo Bolsa Família para R$ 400, o que fontes consultadas pela reportagem apontam que não foi e nem está em consideração.
Nessa ala do governo, a avaliação é de que o problema dos precatórios foi tratado de forma “nebulosa”, o que contribuiu para os ruídos e as incertezas, que nas últimas semanas jogaram combustível na alta do dólar e dos juros no mercado financeiro. Segundo um integrante do governo, independentemente da saída escolhida, é preciso ter clareza em torno dessas informações para que qualquer um possa “fazer a conta” de qual será o espaço para novas despesas no teto de gastos em 2022.
O governo contava com um espaço adicional de cerca de R$ 30 bilhões no teto de gastos no ano que vem para ampliar o Bolsa Família, rebatizado de Auxílio Brasil. Às vésperas do envio da proposta ao Congresso, surgiu a fatura dos precatórios – chamada de “meteoro” por Guedes – em valor acima dos R$ 57 bilhões programados pela equipe econômica. O gasto com demandas judiciais ocupou a folga que seria do programa social, o que levou o governo a propor o parcelamento.
No mercado financeiro, há o temor de que o governo use a PEC para manobrar o Orçamento e criar espaço adicional para gastos em 2022, de olho na reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Cálculos iniciais do governo apontavam um “extra” de R$ 7,8 bilhões no ano que vem com a medida. A equipe econômica revisou os cálculos e agora diz que não haverá essa sobra.
Um integrante do governo ouvido pelo Estadão garante que, mesmo com as novas soluções para as dívidas judiciais, não se buscam artifícios para criar espaço adicional dentro do teto e poder gastar mais em ano eleitoral, mas sim equacionar o problema dos precatórios sem maiores turbulências.
Para essa ala, um dos problemas de comunicação é a associação entre a PEC e o lançamento do Auxílio Brasil com valor turbinado. Embora alguns tenham visto nessa vinculação chance de “incentivar” o Congresso a aprovar o parcelamento das dívidas judiciais, há integrantes do governo que argumentam que o crescimento dos precatórios não compromete só o programa social, mas também outras despesas do Orçamento.
Ver todos os comentários | 0 |