Após "perder" a meta de inflação para 2021, o Banco Central já começa a ver as projeções do mercado financeiro para o IPCA - o índice oficial de preços - se distanciarem também do alvo para 2022. Em meio aos choques mais recentes de preços, o índice calculado pelos economistas de bancos e corretoras para o próximo ano já está em 3,90%, acima dos 3,50% do centro da meta do BC. Foi a quarta semana consecutiva em que as projeções do mercado aumentaram.
Os índices constam do Relatório Focus, divulgado nesta segunda-feira, 16. O documento é uma compilação das projeções do mercado para os principais indicadores da economia brasileira.
Apesar de os economistas já calcularem uma inflação de 3,90% para o próximo ano, o BC manteve, na semana passada, a projeção de que o IPCA será de apenas 3,50% - exatamente o centro da meta a ser atingida pela instituição.
Este aparente descompasso entre as projeções do BC e do mercado financeiro surge na esteira de erros recorrentes da própria autarquia ao projetar a inflação de curto prazo no Brasil nos últimos meses. Como mostrou o Estadão/Broadcast na semana passada, desde o início do segundo semestre de 2020, quando a alta das commodities no mercado internacional passou a impulsionar os preços de alimentos no Brasil, o BC vem errando seguidamente, para baixo, suas projeções de inflação de curto prazo.
De julho de 2020 a julho de 2021, o BC subestimou a inflação em suas projeções em 9 dos 13 meses considerados. No episódio mais recente, calculou uma inflação de apenas 0,39% em julho, enquanto o IBGE revelou uma taxa de 0,96% - mais que o dobro - na semana passada.
Em eventos públicos também na semana passada, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, e o diretor de Política Monetária, Bruno Serra, reconheceram que a instituição se surpreendeu com a inflação de curto prazo mais recentemente. De acordo com Campos Neto, existe hoje um processo de revisão de expectativas de curto prazo que começou a contaminar o longo prazo.
Na terça-feira, 10, Serra defendeu que o BC e o mercado estão fazendo projeções “razoavelmente” parecidas e que elas não têm necessariamente que convergir. “Fomos reavaliando (a inflação), assim como o mercado, porque os choques foram mais persistentes que imaginávamos. O movimento do BC foi alinhado com as expectativas do mercado. Está todo mundo vendo a mesma coisa”, disse.
Os dados desta segunda-feira do Focus, porém, mostram que o mercado já vê uma inflação se descolando novamente da meta, desta vez no ano de 2022. Para 2021, tanto o mercado quanto o BC já estimam um descumprimento da meta. Enquanto a projeção do BC é de inflação de 6,5% para este ano - número reafirmado na semana passada -, o mercado financeiro projeta inflação de 7,02%. Este porcentual é quase o dobro da meta perseguida pelo BC para este ano, de 3,75%, com margem de tolerância de 1,5 ponto porcentual para cima ou para baixo.
As pressões sobre a inflação no Brasil se intensificaram a partir do segundo semestre do ano passado, com a alta de produtos como soja e milho no mercado internacional, na esteira da pandemia de covid-19. Além do avanço nos preços de alimentos, os brasileiros passaram a enfrentar ainda em 2020 reajustes nos combustíveis, com impactos crescentes sobre o IPCA. Mais recentemente, a alta nos preços de energia, as geadas em várias regiões do País e o reaquecimento do setor de serviços após o período mais crítico da pandemia passaram a dar força à inflação.
Se por um lado a inflação pressiona o orçamento das famílias, por outro a recuperação de longo prazo do Produto Interno Bruto (PIB) ainda é contida. Após despencar 4,1% em 2020, na esteira da pandemia, o PIB deve crescer 5,28% em 2021, pelas projeções do mercado financeiro. Para 2022, o mercado projeta uma alta do PIB de apenas 2,04%.
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