O aceno positivo do presidente Jair Bolsonaro à concessão de reajustes para policiais do Distrito Federal, cujos salários são bancados com dinheiro da União, abriu a porteira para outras categorias do funcionalismo federal elevarem a pressão por aumentos na sua remuneração. Sindicatos e associações de classes como policiais federais articulam uma grande mobilização a partir de março contra o congelamento de salários.
A equipe econômica não vê espaço no Orçamento para ampliar as remunerações, mas admite nos bastidores que a pressão virá e será necessário mostrar à ala política do governo que não há folga fiscal para negociação.
No Orçamento de 2020, apenas os militares das Forças Armadas foram contemplados com reajustes salariais e criação de novas vantagens, a um custo de R$ 4,7 bilhões adicionais neste ano. Os aumentos foram negociados no mesmo projeto que alterou as regras de aposentadoria das tropas federais.
No fim do ano passado, porém, Bolsonaro cedeu aos pedidos do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, para incluir no Orçamento reajustes que vão de 8% a 25% às forças de segurança do DF. O custo de R$ 505 milhões sairá do Fundo Constitucional do DF, ou seja, não representa gasto adicional para a União, mas implicará em redução de outras despesas com segurança.
Com os acenos a categorias que compõem a base de Bolsonaro – que é capitão reformado do Exército e se elegeu defendendo as forças de segurança –, outras classes vão pleitear o mesmo tratamento.
Os últimos reajustes foram aprovados pelo Congresso Nacional entre 2016 e 2017. As carreiras com menores salários negociaram aumentos por dois anos, sendo que a última parcela entrou em vigor no início de 2017. Já as carreiras de estado, com maiores salários e consideradas a elite do serviço público, como auditores da Receita e servidores do Banco Central, garantiram reajustes por quatro anos, concedidos paulatinamente até 2019.
“Ele (Bolsonaro) teve apoio muito grande das forças policiais (na eleição). Naturalmente a cobrança sobre ele é muito forte. A expectativa é que ele atenda nosso pleito”, diz o presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Luís Antônio Boudens. Segundo ele, a pressão por reajustes virá “naturalmente”, não só por conta do aceno aos policiais do Distrito Federal, mas também porque em março entrarão em vigor as novas contribuições previdenciárias dos servidores. Hoje em 11%, elas poderão chegar a 22% para quem ganha acima de R$ 39 mil mensais.
“O salário líquido vai cair, e o tensionamento vai aumentar”, diz Boudens. “O aceno às polícias do Distrito Federal serviu para ver que no governo há um olhar para a segurança e há margem para negociação.
O presidente do Fórum Nacional Permanente das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques, reconhece que para avanços nas negociações salariais daqui para frente será preciso vencer o obstáculo do teto de gasto, regra prevista na Constituição que impede o crescimento das despesas acima da inflação. “O teto vai ter que mudar”, prevê. Ele destaca que o crescimento vegetativo da folha é em torno de 3% ao ano, o que restringe o espaço do teto.
Ele destaca que 80% das categorias dos servidores optaram, no passado, por um reajuste de dois anos e, agora, estão há quatro anos sem nenhum reajuste. Esse grupo, prevê ele, vai intensificar a pressão por reajuste ao longo de 2020, sobretudo, a partir de março.
Segundo Marques, os servidores também vão se articular para derrubar a proposta do governo de corte de até 25% da jornada de trabalho e dos salários nessa proporção. A medida consta no conjunto de reformas fiscais enviada ao Congresso no final do ano passado. Ele avalia que a medida não é factível porque há no serviço público federal 120 mil servidores que poderiam ser aposentar e recebem um incentivo – o abono de permanência - para permanecer no cargo. Se o corte da jornada de trabalho for aprovado, o incentivo deixaria de ser vantajoso, provocando a aposentadoria desses servidores.
Por enquanto, a estratégia de mobilização está sendo mantida em sigilo. “O que posso dizer é que jamais vi os Auditores Fiscais tão desanimados, se sentindo tão desprestigiados como agora. A Receita Federal está em depressão profunda”, diz Kleber Cabral, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), um dos mais poderosos do País.
“A nossa mobilização nunca se encerrou, já que o governo não cumpriu o acordo”, avalia Cabral numa referência à regulamentação do bônus de eficiência (incentivo financeiro dado ao cumprimento de metas de arrecadação), impasse que ainda não foi resolvido.
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