A correção da tabela do Imposto de Renda voltou a ser assunto depois que o presidente Jair Bolsonaro informou ter pedido um estudo sobre o assunto para o ministro da Economia, Paulo Guedes. A intenção do presidente era que a correção do IR 2020 fosse feita pela inflação, que, segundo o boletim Focus, que reúne projeções de analistas do mercado financeiro, deve fechar 2019 em torno de 4%.
A última correção na tabela do IR foi feita em abril de 2015, pela qual os rendimentos de até R$ 1.903,98 se tornaram isentos da cobrança de arrecadação. Caso a tabela seja corrigida com base na inflação de 2019, a faixa de isenção se tornará mais abrangente, atingindo contribuintes com renda em torno de R$ 1.980.
- Foto: Eliane Neves/FotoArena/Estadão ConteúdoReceita Federal
A correção também deve provocar uma movimentação entre as faixa que, no total, podem significar que os cofres públicos deixarão de arrecadar de R$ 6 bilhões a R$ 8 bilhões, segundo cálculos do governo, em um momento em que o País enfrenta uma crise fiscal.
Em maio de 2019, a defasagem média acumulada na tabela do IR era de 99,71%, segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco). Isso significa que, caso as faixas fossem corrigidas pela inflação acumulada, seriam isentos do IR contribuintes com renda de até R$ 3.802,43.
Para Luiz Antônio Benedito, diretor de estudos técnicos do Sindifisco, a questão não é de perda de arrecadação, mas sim de tributação indevida. “Quando as faixas não recebem correção, se passa a arrecadar mais por conta de um processo inflacionário, sem discussão com a sociedade ou com o Congresso. E a não correção acaba prejudicando as classes mais baixas, que deveriam estar pagando ao fisco um valor menor do que pagam hoje”, explica.
Gustavo Brigagão, presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF), vai além. Ele acredita que a atualização pretendida pelo presidente da República ainda não reflete uma correção significativa. “Se for para corrigir de fato a tabela, é preciso fazer uma correção muito maior. O reajuste pelo IPCA de 2019 não cobre a defasagem que existe desde 1996. Os reajustes concretizados desde então, somados, representam um terço da variação da inflação para período. Mas, claro, um reajuste é melhor que nenhum”, conta.
Por outro lado, ele reconhece que há um grande impasse para a concretização da política em 2020. “A equipe econômica do governo já declarou que não seria viável uma correção desse porte, devido à crise fiscal. É preciso pensar se as contas públicas vão aguentar as correções ou não”, declara.
Interlocutores da equipe econômica já afirmaram que não há espaço fiscal para uma mudança desse porte em 2020, já que o País acumula contas no vermelho nos últimos anos.
O Planalto reconhece que vem estudando corrigir essa defasagem dentro de uma reforma tributária. Mas com a indefinição sobra a reforma da Previdência, a tramitação de uma PEC para mudar o sistema de tributação brasileiro não tem data para ser implementada.
Em audiência no Congresso Nacional para discussão da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020, o ministro Paulo Guedes declarou que não há sentido em corrigir a tabela do Imposto de Renda enquanto o governo tenta aprovar a reforma da Previdência para cortar gastos.
Deduções de gastos do IR
O ministro da Economia afirmou que estuda acabar com o sistema de dedução de gastos do Imposto de Renda para saúde e educação, que, segundo ele, é desigual e mais benéfico à classe média. De acordo com o Demonstrativo de Gastos Tributários para 2019, só este ano o fisco deixará de arrecadar R$ 20,098 bilhões com as deduções.
Brigagão questiona esse número. “As deduções existem para diminuir todas as despesas que você tem com seu próprio sustento e o de sua família. Comparado com o rendimento, o que sobra é o acréscimo patrimonial, que é tributado. Na medida em que essas coisas não são deduzidas do imposto, o que está sendo tributado são despesas, não a renda”, afirma.
Estudo do Sindifisco considera que os descontos estão subavaliados e que seus valores não correspondem à realidade dos gastos necessários.
“Se alguém paga por educação durante o ano todo e tem um gasto de R$ 10 mil, por que essa pessoa é limitada a deduzir apenas um terço desse valor?”, questiona Valquíria Pinheiro, professora de Contabilidade da Universidade São Judas Tadeu. “Uma vez que se corrija a tabela, os descontos precisam acompanhar. Mas, para isso, é preciso que haja alteração no regulamento do Imposto de Renda. Seria necessário mudar a legislação.”
O documento do Sindifisco também questiona a não dedução de gastos essenciais na área da saúde, como a compra de medicamentos, e de habitação.
Eduardo Maneira, presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB Federal, avalia que o corte das deduções do imposto de renda seria inconstitucional. “Essas despesas devem ser abatidas porque se trata de garantir o mínimo existencial que preserve a dignidade da pessoa humana. Saúde e educação são direitos fundamentais e que não podem ser desconsiderados do Imposto de Renda. A existência de um teto para o abatimento já pressupõe uma inconstitucionalidade. Toda e qualquer despesa envolvendo essas áreas deve ser abatida”, afirma.
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