A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado adiou nessa quarta-feira (4) a análise e a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permite a transferência de propriedade de terrenos de marinha para estados, municípios e entes privados. A chamada PEC das Praias propõe transferir a propriedade dos chamados terrenos de marinha, que são áreas do litoral brasileiro sob o domínio da União, garantindo livre acesso a qualquer pessoa para frequentá-las.

Defensores das causas sociais e ambientais afirmam que essa ação teria como consequência uma grande perda para a biodiversidade das praias, pois indústrias responsáveis por explorar os recursos naturais de forma desequilibrada, como o turismo e a pecuária, passariam a ter acesso a áreas antes protegidas pelo Estado, podendo causar danos socioambientais irreversíveis em plena crise climática.

Por outro lado, os defensores da PEC argumentam que a medida reduziria as taxas pagas à União por quem ocupar esses locais, além de regularizar terrenos conquistados de "boa-fé" por particulares e dar maior autonomia aos Estados e municípios para regularizar o uso desses espaços.

O relator do projeto, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), alega que o texto sofreu alterações para amenizar as preocupações de que a PEC privatizaria as praias brasileiras: "A forma como se encontram hoje as praias, o seu regime jurídico, o seu tratamento para a Constituição e para a legislação não mudarão", disse.

Flávio também citou o artigo que trata sobre o acesso às praias, que diz: “As praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica, não sendo permitida qualquer forma de utilização do solo que impeça ou dificulte o acesso da população às praias, nos termos do plano diretor dos respectivos municípios.”

O senador Rogério Carvalho (PT-SE), no entanto, contra-argumentou que a Constituição, como está hoje, não impõe nenhum critério para a população ter acesso à praia e que, na PEC, Flávio condiciona esse acesso ao Plano Diretor dos municípios, “o que pode ou não pode ser acesso livre. Portanto, ele piora o projeto de lei dele”.

Carvalho também questionou a isenção da taxa do laudêmio, que é o imposto pago após a comercialização de imóveis em áreas que são da União, pago principalmente por empresários que possuem extensas áreas no litoral brasileiro.

“Os ricos, que mais têm terrenos de marinha fazendo especulação imobiliária, ficam livres de pagar o laudêmio. Aqueles que têm um imóvel e moram em cidades costeiras, somos favoráveis a que sejam isentos e recebam este imóvel. Agora, o setor empresarial, que tem milhares de metros quadrados à beira-mar, não [deve ser isento]”, pontuou.

Os terrenos de marinha representam, atualmente, aqueles situados na faixa de 33 metros a partir da linha média da maré alta, demarcada em 1831, ano correspondente ao registro oficial dos foros e os laudêmios, que entraram no Orçamento.

A votação da PEC ainda deve ser remarcada. Depois de passar pela CCJ, o texto precisa ser analisado no plenário. A proposta, de autoria do ex-deputado federal Arnaldo Jordy (Cidadania-PA), foi aprovada pela Câmara dos Deputados em 2022.

Preservação das praias

Como forma de compensar os possíveis efeitos da PEC no meio ambiente, o relator sugeriu a criação de um fundo monetário com parte do dinheiro arrecadado pela venda de algumas das terras, que seria “destinado a fundo nacional para investimentos em serviços de distribuição de água potável e saneamento básico nas regiões de praias, marítimas ou fluviais no território nacional", nas palavras de Flávio Bolsonaro. Porém, o senador Rogério Carvalho reafirmou os perigos que essa PEC pode acarretar diante da atual crise climática:

“Sem considerar o momento que nós vivemos do ponto de vista climático, ampliando a possibilidade de ocupação das áreas costeiras sem nenhum tipo de estudo. O Brasil tem oito mil quilômetros de área costeira. O Ministério de Gestão e Inovação está fazendo um estudo para poder apresentar e dar consistência a qualquer definição responsável sobre este tema e não para atender a interesses específicos”, afirmou o senador.