Uma menina de 10 anos engravidou após ter sido estuprada em São Mateus, município no norte do Espírito Santo. Nesta quinta-feira, 13, a Polícia Civil fez buscas no Estado e também na Bahia onde o tio da criança, de 33 anos, suspeito pelo crime, tem familiares. Ele não foi localizado e é considerado foragido.
Segundo o delegado Leonardo Malacarne, responsável pelo caso, o tio fugiu após a divulgação do caso e de sua foto nas redes sociais.
O caso se tornou público depois que a menina deu entrada no Hospital Roberto Silvares, em São Mateus, se sentindo mal. Enfermeiros perceberam que a garota estava com a barriga estufada, pediram exames e detectaram que ela está grávida de cerca de 3 meses.
Em conversa com médicos e com a tia que a acompanhava, a criança relatou que o tio a estuprava desde os 6 anos. Ela disse que não havia contado aos familiares porque tinha medo, pois ele a ameaçava.
"Contamos com o apoio de todos os policiais, bem como a presteza do Conselho Tutelar do município e das assistentes sociais, o que possibilitou que todas as fases do procedimento fossem céleres. Foram feitas oitivas de todos os familiares e profissionais envolvidos no caso e a vítima também passou por avaliação do médico perito da Polícia Civil", disse Malacarne.
A investigação foi conduzida pela Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) em razão de a lei de violência doméstica agilizar o trâmite na proteção de mulheres vulneráveis.
A menina está em um abrigo, acompanhada de uma assistente social do município. Em nota, a prefeitura de São Mateus informou que o Ministério Público, através da promotoria de Infância e Juventude, entrou com uma ação impedindo a divulgação de qualquer informação sobre o caso, para proteger a integridade da família e da criança.
O Estadão procurou o Ministério Público do Espírito Santo, que explicou que fez a notificação para que seja cumprido o sigilo previsto no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA). O MP também informou que as informações deste caso devem ser fornecidas apenas para integrantes da rede de atendimento à infância e juventude local ou para órgãos acionados por essa rede por motivos técnicos. A recomendação é destinada também a conselheiros tutelares e servidores da rede de assistência à infância e juventude local.
O tio da menina, suspeito do crime, já teve passagens pelo sistema prisional capixaba. Em nota, a Secretaria Estadual de Justiça (Sejus) informou que ele ficou detido por quase sete anos, entre maio de 2011 e março de 2018, por tráfico de drogas.
Interrupção da gravidez
O presidente da Comissão de Proteção à Criança e ao Adolescente da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, deputado Delegado Lorenzo Pazolini (Republicanos), esteve em São Mateus para averiguar o caso. O parlamentar convidou representantes do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, que vieram de Brasília, para acompanhar as investigações. A ministra Damares Alves participou da reunião de forma remota.
"Nossa intenção é unir todas as forças possíveis para a prisão do suspeito e também garantir todos os direitos de desenvolvimento da criança. Os danos ocasionados por essa violência refletem como trauma por toda a vida das vítimas, física e mentalmente", afirmou o deputado.
O caso é considerado estupro de vulnerável, que consiste em ato libidinoso ou relação sexual com menor de 14 anos ou contra pessoa que por deficiência física ou mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que, por qualquer outro motivo, não pode oferecer resistência, conforme o artigo 217-A do Código Penal.
Por conta da ocorrência, a hashtag "#gravidezaos10mata" ficou nos assuntos mais comentados do Twitter Brasil nesta quinta-feira. Usuários da rede social iniciaram campanha para que a menina tenha interrupção da gravidez garantida. A legislação brasileira permite o aborto para vítimas de estupro - e também em casos de risco de morte para mãe e feto anencéfalo.
Para a advogada criminal Luiza Nagib Eluf, embora haja permissão legal, a burocracia pode vir a impedir a interrupção da gestação em tempo hábil. “É preciso que a Justiça funcione com rapidez num caso desse e autorize imediatamente a realização do aborto”, afirma. “Não podemos penalizar duplamente uma criança que já foi vítima de abuso e ainda está gestando, sem capacidade para ser mãe.”
O advogado Ariel de Castro Alves explica que o caso se encaixaria em duas permissões legais para interrupção da gravidez. “Além do estupro, pode existir o risco à vida da gestante”.
Membro do Departamento de Ginecologia da Sociedade de Pediatria de São Paulo, o médico Théo Lerner aponta os altos riscos que a gestação aos 10 anos de idade traz. “Fatores endócrinos e nutricionais aumentam a chance de abortamento espontâneo, déficit de crescimento fetal e de parto prematuro, sem falar nas consequências para a saúde mental da menina.”
Castro acrescenta que pela portaria nº1.508 de 2005 do Ministério da Saúde, bastaria o cumprimento de protocolos na área de saúde para que o procedimento fosse avaliado e realizado. “Porém, essa portaria, em geral, não é respeitada. Principalmente se as vítimas são crianças e adolescentes”, afirma o advogado.
Ele diz que casos envolvendo menores costumam ser avaliados nas Varas da Infância e da Juventude. Os representantes legais da criança são ouvidos pelos serviços que atendem vítimas de violência. Os tutores ou conselho tutelar podem encaminhar o pedido de autorização para a vara.
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