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TST mantém decisão da Justiça do Trabalho do Piauí contra empreiteiro

A decisão rejeitou recurso dos investigados, que apontaram incompetência da Vara do Trabalho de 1º grau.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve condenação de empreiteiro envolvido no arregimento e transporte de um trabalhador rural natural de Valença do Piauí, submetido a trabalho análogo a escravidão nos estados de Minas Gerais e São Paulo. A decisão da Sexta Turma, do dia 06 de março, rejeitou recurso interposto por uma fazenda e três pessoas envolvidas noc aso, que foram condenadas ao pagamento de verbas trabalhistas devidas e indenização por dano moral de R$ 10 mil.

No recurso, o transportador defendeu que não deveria fazer parte da ação por não realizar a contratação dos trabalhadores, tendo apenas vendido as passagens. O subempreiteiro alegou o mesmo, ao mesmo tempo em que questionou a competência da Vara do Trabalho de Valença do Piauí para julgar o caso, baseado no artigo 651 da CLT que define a competência pelo local onde o empregado prestar serviços.


Foto: Divulgação/TSTSede do Tribunal Superior do Trabalho
Sede do Tribunal Superior do Trabalho

Em depoimento, ele afirmou que realizava o transporte dos trabalhadores para as cidades de Delta, em Minas Gerais, e Ituverava, em São Paulo, em ônibus da sua propriedade.

Diante do caso, a Vara Tribunal de Valença do Piauí reconheceu a situação como trabalho escravo contemporâneo, visto que os trabalhadores piauienses, em sua maioria analfabetos ou sem educação formal e por sua condição social, se tornaram mais vulneráveis para aliciamento e acreditar em falsas promessas do recrutador sobre um pagamento digno em outros estados, e ao chegarem no local de trabalho se deparavam com condições degradantes de sobrevivência, além de serem vítimas de servidão por dívidas.

Recurso no TRT

Com a decisão de 1º grau, os réus ingressaram com recurso no Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região, no Piauí, alegando a incompetência do juízo na cidade onde o trabalhador reside, visto que ele prestou serviço em outros estados. O acórdão regional então reconheceu que a atuação da vítima na atividade da lavoura de cana-de-açúcar se deu em dois estados, distante mais de 2.200 km do local de arregimentação, o que configura que o empregador não atuava em local específico.

Foto: Marcelo Cardoso/GP1Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região
Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região

Além disso, é destacado a característica hipossuficiente da vítima, que também foi reiterado pela Sexta Turma do TST em que “impor a um trabalhador desempregado e hipossuficiente, como declarado de próprio punho pelo obreiro, percorrer tão longa distância para postular em juízo configura, de modo patente, violação à garantia de amplo acesso à Justiça e ao princípio da proteção ao hipossuficiente, dada a impossibilidade de arcar com as despesas da viagem, alimentação e estada”. Nesse sentido, a necessidade de locomoção para o lugar em que ele trabalhou, inviabilizaria o processamento da reclamação trabalhista.

Conformidade com o TST

O relator do processo no TST, ministro Augusto César, também ressaltou que nessa situação, o TRT considera válido a protocolar ação trabalhista no lugar de domicílio do trabalhador, excepcionalmente nos casos em que a empresa presta serviços em âmbito nacional e que a arregimentação tenha ocorrido na cidade de domicílio. Nessa situação, foram consideradas essas duas premissas, vista que a atuação em dois estados demonstra a atuação nacional do contratante, assim como a vítima ter sido aliciada em Valença do Piauí.

Ademais, a caracterização reconhecida do trabalho em condições análogas à escravidão também demonstrou a vulnerabilidade do empregado, e que submetê-lo a ajuizar ação no local em que foi explorado não são compatíveis ao dispositivo da CLT e nem com as Convenções 29 e 105 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que tratam do trabalho forçado e de sua abolição e de questões relacionadas aos direitos humanos e à dignidade do trabalhador.

Ação dos aliciadores

Conforme o depoimento da vítima, ele tomou conhecimento que o dono de uma agência de viagens de sua cidade estaria contratando para trabalhar no corte e plantio de cana-de-açúcar na cidade de Delta, em Minas Gerais. As passagens seriam pagas por um empreiteiro local, e em seguida seriam descontadas do pagamento que lhe foi prometido, de aproximadamente R$ 2 mil, com carteira assinada, alojamento, alimentação, e transporte para o local de trabalho sem custo.

Em março de 2020, 35 trabalhadores viajaram rumo à cidade de Delta, e ao chegarem no local de alojamento, forma divididos em três grupos para ficaram em três casas em estado insalubre. Segundo o depoimento da vítima, as casas eram sujas, sem camas, colchões, armadores de rede, e eles tinham que dormir em papelões. Assim que chegaram, também foram informados que teriam que arcar com aluguel, comida, material de trabalho e até mesmo equipamentos de proteção individual (EPI), que seriam descontados do pagamento.

Da cidade, eles percorriam diariamente uma viagem rumo à “Fazenda Brasileira”, um percurso de aproximadamente três horas. No ambiente laboral, eles não tinham acesso à água, nem local para realizar as refeições. Os trabalhadores foram resgatados após os familiares fretarem um ônibus para trazê-los de volta.

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