O Ministério Público do Estado do Piauí, através do promotor Marcelo de Jesus Monteiro Araújo, ofereceu no dia 15 de outubro deste ano denúncia contra Wallace Fernandes Moreira Silva, Bruno Manoel Gomes Arcanjo, Pedro Gabriel de Carvalho Sena, Gabriel Seabra Araújo, Carlos André Araújo Santos, Thalysson Santiago Campelo e Hélcio Laércio da Costa Martins, acusados de fraudes contra o Departamento Estadual de Trânsito do Piauí (DETRAN-PI).
Wallace Fernandes, Bruno Arcanjo, Thallyson Santiago, Gabriel Seabra, Carlos André e Hélio Laércio foram denunciados pelos crimes de integrar organização criminosa, estelionato e lavagem de dinheiro. Já Pedro Gabriel ainda foi denunciado por falsificação de documento particular.
Entenda como funcionava o esquema criminoso
O Departamento de Combate à Corrupção, da Polícia Civil do Piauí, deflagrou no dia 3 de setembro deste ano a Operação Turismo Criminoso, segunda fase da Operação Hidra de Lerna, para combater fraudes contra o Departamento Estadual de Trânsito do Piauí (DETRAN-PI).
A investigação visou aprofundar o outro braço da organização criminosa que operou e lucrou com as condutas criminosas envolvendo emplacamentos de veículos inexistentes (fakes), transferências ilegais da propriedade de automóveis, financiamentos bancários de carros (alguns deles fictícios), entre outras atividades delitivas cometidas a partir do ano de 2019 contra o DETRAN-PI.
O grupo atuava em inúmeras frentes: desde o emplacamento até a futura comercialização dos veículos, possuindo vários colaboradores. Alguns membros, segundo a investigação, possuíam uma participação acessória/menor, ao passo que outros eram os “cabeças” e mentores do grupo.
Os alvos dessa investigação atuavam no uso de notas fiscais falsas, no emplacamento dos carros inexistentes, e posterior financiamento de tais veículos em bancos e financeiras.
Participação de primos
Conforme a investigação, Wallace Fernandes Moreira Silva e Bruno Manoel Gomes Arcanjo são primos e foram apontados por Maria Ovete e seu filho Osmar Neto, alvos da primeira operação, como sendo as pessoas que deram início às criminosas atividades de primeiro emplacamento de alguns desses carros inexistentes, sempre a partir de notas fiscais falsas e com uso de pessoas interpostas (laranjas). Eles também são acusados de alterar a propriedade de alguns veículos sem o consentimento de seus verdadeiros proprietários.
Wallace e Bruno saíram de Maceió para o Piauí a fim de promover tais condutas, cooptando os servidores e despachantes do DETRAN-PI. Segundo o apurado, os dois contaram também com ajuda de alguns piauienses.
Maria Ovete contou que Wallace lhe procurou depois de informações repassadas por “Gil Baiano”, pessoa que, segundo ela, era também de fora, esteve no Piauí e para quem trabalhou fazendo a transferência de alguns carros da empresa Localiza em meados de 2019.
Depois que o DETRAN-PI descobriu as fraudes praticadas por Maria Ovete, ela foi punida e afastada do órgão e a Policia Civil iniciou, ainda em 2021, os trabalhos da investigação. Os criminosos, contudo continuaram operando.
Wallace contratou Maria Ovete
Em seu primeiro interrogatório prestado à Polícia Civil em maio de 2021, Maria Ovete contou que foi contactada por um indivíduo de nome Wallace que pediu seus serviços para o primeiro emplacamento de 02 veículos e que após o processo de registro dos automóveis, os documentos foram entregues aproximadamente 5 dias depois.
Segundo Ovete, ela recebeu a quantia de R$ 150,00, em espécie, por cada um dos automóveis emplacados e que soube através do próprio DETRAN-PI das inconsistências relativas aos veículos e que por conta de tais fatos foi suspensa por 90 dias. Ela alegou que tentou manter contato com Wallace, entretanto, depois de tais indagações, não mais se falaram.
Proximidade entre Ovete e Wallace
A polícia constatou, ao analisar conversas entre Ovete e Wallace, um grau de proximidade entre eles. No dia 12 de outubro de 2020, ao contar para Wallace que havia sido parada pela PRF de Parnaíba, teve seu carro retido por conta de débito de multas, IPVA e demais taxas, ele se propôs a pagar tudo para resolver o problema. Ele chegou até a dizer que se soubesse, teria pagado essas multas antes da viagem dela ao litoral.
No dia seguinte, 13 de outubro, os dois voltaram a conversar. Na ocasião, Wallace disse que estava providenciando pagar tudo, e logo em seguida enviou para ela os comprovantes do que pagou. “Como se percebe, este usou conta de pessoas interpostas (de laranjas)6 para fazer tais pagamentos (conduta que se amolda ao tipo penal do art. 1° da Lei 9613/98 – crime lavagem de capitais)”, diz trecho da investigação.
Os comprovantes, conforme a investigação, estão em nome de Lucilene Lira Andrade (esposa de Hélcio Laércio da Costa Martins), piauiense que participa desses crimes, segundo a polícia.
Participação de Hélcio Laércio e Thalysson Santiago
Durante a investigação, os policiais descobriram que Lucilene Lira é sogra de Thalysson Santiago, vulgo “JAPA”, e casada com Hélcio Laércio. Eles foram apontados como trabalhadores do ramo de comércio de compra e venda de veículos e com ligações com os outros investigados, em especial os primos Wallace e Bruno.
“Com tais atividades, Thallyson e Hélcio também movimentaram enormes quantias em dinheiro a partir das contas bancárias de terceiros, valendo-se, ainda, às vezes, de contas de pessoas jurídicas de fachada/inexistentes criadas por eles próprios com o deliberado propósito de camuflar seus envolvimentos com tais práticas delitivas”, diz trecho da investigação.
Relatórios e diligências provaram que Thallyson e o companheiro da sua sogra Hélcio Laércio deliberadamente ajudaram Wallace e Bruno com o emplacamento de carros fictícios e suas posteriores negociações no Piauí.
Como provado nos autos, eles fizeram deliberados pagamentos e transações para o grupo, sempre se valendo de contas de pessoas interpostas (laranjas).
Movimentação de R$ 2 milhões
A investigação apontou ainda uma movimentação suspeita no valor de R$ 2 milhões por Thallyson Santiago em um período de 6 meses, recursos incompatíveis com o patrimônio, a atividade econômica ou a ocupação profissional e a sua capacidade financeira.
Lucilene Lira negou as acusações
Em depoimento à polícia, Lucilene negou veementemente ter participado dessas fraudes, atribuindo tudo isso ao seu marido Hélcio Laércio, que era quem usava suas contas. Ainda conforme Lucilene, seu marido está internado compulsoriamente em uma clínica de reabilitação, motivo pelo qual não foi solicitada qualquer medida cautelar contra Hélcio, apenas contra Thallison.
Chefes dos esquemas
Consta ainda que Bruno e Wallace eram os “cabeças” do esquema que usavam dados de pessoas interpostas (laranjas) para emplacar veículos com notas fiscais falsas no DETRAN-PI, e também abrir contas bancárias para fazer movimentações com o objetivo de ocultar seus ganhos criminosos.
“Também, ficou provado que eles se valiam de pessoas de baixa qualificação e renda para permitir que quantias em dinheiro fossem depositadas nas contas delas, seja diretamente, seja através de financiamentos bancários”, apontou a investigação.
Envolvimento de Pedro Sena
Outro piauiense que ajudou a operar essas fraudes, está envolvido diretamente com elas e gozou de forte protagonismo nessas empreitadas criminosas, conforme a investigação, trata-se de Pedro Gabriel de Carvalho Sena.
Consta nos autos, a conta pessoa física e jurídica de Daniela Francisca de Lima que era usada deliberadamente por Pedro Sena para pagar algumas despesas, boletos e taxas para a atuação do grupo criminoso. Pedro se valia das contas dela para ocultar suas movimentações bancárias.
'Turismo criminoso'
“Pedro Sena foi um dos grandes responsáveis pelo, registre-se, “turismo criminoso” em Teresina, evento que culminou com o emplacamento criminoso de vários carros fraudados no DETRAN-PI”, destacou a polícia na investigação.
Ficou provado ainda que Pedro Sena capitaneou e trouxe pessoas de fora para Teresina, hospedando-as em uma casa alugada através de uma imobiliária, tendo sido usada para hospedar o grupo criminoso por somente um mês, tendo logo em seguida sido abandonada, com débitos deixados pelos criminosos.
“Por tais evidências, claro está que o propósito deles era justamente somente fazer as fraudes contra o DETRAN-PI. Vieram ao nosso estado apenas servir-se do famigerado ‘turismo criminoso’”, enfatizou a investigação.
Relação entre Pedro Sena e os primos Wallace e Bruno
Wallace e Bruno chegaram a se hospedarem no Teresina Hotel, administrado e gerido por Pedro Sena, entre agosto de 2020 e outubro de 2021, período em que as maiores fraudes foram cometidas contra o DETRAN-PI na companhia de outros suspeitos.
Participação de Gabriel Seabra Araújo
Conforme a polícia, Gabriel era parceiro de Thallyson, Pedro Sena e dos primos Bruno Arcanjo e Wallace e, deliberadamente, também recrutava pessoas para que carros fossem emplacados em nomes delas, para posteriormente serem financiados através de operações bancárias.
Depoimentos, operações bancárias e documentos apreendidos apontaram que Gabriel Seabra possuía o controle desse pessoal, gerindo ações no DETRAN-PI desde o emplacamento ao financiamento desses carros.
Filho de funcionário do DETRAN-PI
Gabriel Seabra é filho do funcionário do DETRAN-PI de nome Denisar, o que facilitava o acesso aos setores do órgão. Ele, inclusive, era bem recepcionado e tinha total liberdade com o chefe do setor de vistoria, Francisco Carlos Nunes Teixeira (conhecido por CHICÃO). Dada essa ligação, recebia total apoio e facilitação.
Morte do policial Marcelo Soares
Durante a Operação Turismo Criminoso, um dos alvos, Bruno Arcanjo, marcou o policial do DRACO, Marcelo Soares, que estava com a equipe cumprindo os mandados. Bruno já é réu acusado do homicídio do agente.
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